Juremir Machado da Silva

O imbrochável

Change Size Text
O imbrochável Foto: Isac Nóbrega / PR

Este é um texto técnico. Não se usará qualquer termo vulgar. Trata-se de uma narrativa distanciada, na terceira pessoa do singular. Conta a história de um homem que se apresentava como “imbrochável”, tendo confirmação dessa sua qualidade pela jovem esposa. O “imbrochável” estaria sempre pronto, de membro ereto, rígido, para ferrar a população contrária aos seus desejos e instintos. Se alguém quiser usar a palavra “foder” no lugar de ferrar que o faça. Cada um é responsável pelo que decide ser e pelas palavras que escolhe.

O imbrochável ferrou meio mundo em quatro anos, salvo os fardados, o seu principal fetiche. Deve-se entender imbrochável como um conceito. Melhor dizendo, como um imaginário, uma ficção compartilhada socialmente. Por meio dessa categoria o autodenominado vê-se como símbolo de constância, virilidade, presteza, contundência e determinação. Nessa perspectiva, seria o maior autoelogio possível. O imbrochável enxerga-se como alguém que não verga, não cede, não amolece, não se intimida, não falta, não se dobra e não cansa.

Entende-se que a principal característica do autoelogio é a superestimação. Se aquele que se autoelogia tiver tendência ao negacionismo, como existem casos concretos que poderiam ser dados como exemplo, tenderá a não admitir suas hesitações e descontinuidades. Sim, o imbrochável chama a sua brochada de descontinuidade. Assim:

– Vamos estar descontinuando a nossa relação por algum tempo.

 O imbrochável garante que não usa incentivos farmacêuticos para realizar as suas performances. No caso em tela – assim se fala em redações técnicas –, cabe reconhecer que o imbrochável corresponde à visão que tem de si. Basta examinar as suas reformas para compreender que ele não se poupou um só dia. Foi ferro na maioria. Pau puro. Dureza. Note-se que essas últimas expressões metafóricas são usadas com frequência em análises políticas sem redução ao sexual. Feito o balanço, nas quatro linhas da atuação do indigitado, constata-se que o imbrochável jamais perdeu oportunidade de ser penetrante e matador.

 Não se quer aqui cometer a baixaria de explorar sentidos duplos ou duplos sentidos. Relevante é verificar se há consistência na tese da imbrochabilidade defendida pelo locutor (aquele que vocaliza a mensagem). Nesse tipo de imaginário costuma-se usar o verbo acabar. O locutor tem acabado com o que pôde acabar, especialmente na cultura. Sempre que ouve a palavra cultura ele saca o seu instrumento em ponto de bala. É fundamental que especialistas indiquem uma forma de fazer esse homem brochar. Em contrário, ele vai acabar com tudo. Dito isso, sabe-se que, no campo onde atua, a brochabilidade é medida de quatro em quatro anos. Só o próximo pleito poderá fazê-lo brochar de vez.

O pleito é o leito das grandes ilusões. Nele se acabam as maiores pretensões. De repente, tudo que parecia sólido se desmancha na urna. Nas ruas, os ferrados gritam: “Acabou”, “se acabou”. Não há mal que dure sempre. O imbrochável, contudo, não pode ser subestimado. Afinal, de tanto falar do seu desempenho ele acaba por nele crer.

RELACIONADAS

Esqueceu sua senha?

ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.
ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.