Juremir Machado da Silva

Dia das cartas pela democracia

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Dia das cartas pela democracia Foto: Maria Fernanda Pissioli/Unsplash

Pobre do Brasil, precisa dar passos atrás para se manter capaz de ir em frente. Nesta quinta-feira serão lidas duas cartas em defesa da democracia. É sinal de que não estamos bem. No Largo do São Francisco, no centro da capital paulista, será lida a carta organizada pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo contra os ataques feitos por Jair Bolsonaro às urnas eletrônicas. A leitura repete a que foi feita em 1977 pelo professor Goffredo Telles Júnior contra a ditadura militar implantada em 1964 pelos que se juntaram aos EUA numa pretensa defesa nacionalista dos interesses americanos.

As cartas de agora são um grito, uma delas com mais de 800 mil assinaturas, contra o golpismo anunciado em prosa e verso, mais prosa do que verso, pelo capitão que dá plantão, vez ou outra, em Brasília como presidente da República. Tantas fez o velho que deu nisso que ele chama de “cartinha”. Nem o general João Figueiredo, aquele que preferia cheiro de cavalo ao de gente, o último ditador do ciclo, era tão tosco quanto o seu discípulo levado à presidência pelo voto.

Também será lida a carta da Fiesp, a poderosa Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. É dia do advogado, data em que foram criadas as duas primeiras faculdades de direito do Brasil. Trocando em miúdos, ouvindo Chico Buarque, é dia do Estado de Direito. Até parte do empresariado mais pragmático, que é como alguns chamam a ideologia do dinheirismo a qualquer preço, já se deram conta da fria em que se meteram com o capitão de malícias e outras patacoadas. Como se estivéssemos em 1964, às vésperas do golpe que afundou o país em mais de 20 anos de violência e arbítrio, a sociedade manifesta-se tentando salvar a democracia. Aquilo que nem deveria ser necessário, vira ato de coragem, de ousadia, de clarividência e de patriotismo. Sim, o maior gesto de patriotismo é aquele que defende a democracia. O resto é interesse de poucos contra as necessidades de muitos.

Tudo aquilo que parecia puro folclore nos mais rasteiros programas de rádio de alguns anos atrás, como as acusações às urnas eletrônicas, tornou-se realidade. A turma de 1964 deu um golpe midiático-civil-militar. Bolsonaro é resultado do golpismo midiático. Ele tenta arrastar para o abismo, ao seu lado, as Forças Armadas. Alguns militares, especialmente os de pijama, caem no conto e espalham fake news como bons tios de WhatsApp. É incrível como pantufas estimulam um belicismo perigoso e pronto para fazer estragos reais.

As cartas pela democracia podem ser resumidas assim: ou o Brasil para Jair Bolsonaro ou o capitão para o Brasil. É bom já ir escolhendo o que cada um prefere. Houve uma época em que havia quem opusesse desenvolvimento econômico e democracia. A entrega foi o contrário desses dois eixos. Se deixar rolar, acontece tudo de novo sem os tanques nas ruas. Ou, se duvidar, com eles também, à moda antiga. Durante muito tempo, quando falavam de coisas assim, eu ria. Achava que era piada, nostalgia deslocada, velharia. Hoje, fico apavorado.  

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