Gabinete de curiosidades brilha no Theatro São Pedro
A estreia de Gilberto Schwartsmann no teatro é uma grande declaração de amor à arte, a Shakespeare, a Ibsen, essa galera toda, se posso usar essa expressão da gurizada para falar de monstros sagrados da cultura. Uniram-se vários talentos para produzir um êxito: Schwartsmann, Alabarse, Arlete, Zé Adão, Zugno. Cada entrou com uma porção de sensibilidade. O texto mostra a enorme cultura de Gilberto, seu senso de humor e sua pegada crítica em relação a governantes que preferem o obscurantismo à luz da cultura. Sem que nomes sejam citados, cada sabe de quem se está falando. A sutiliza predomina.
Depois de uma das apresentações da peça houve uma rápida mesa com a participação do psicanalista Claudio Eizirik, que fez uma análise elegante e inspirada do que vimos. Uma obra sobre solidão, etarismo, descompasso entre realidade e desejos, paixão por livros, autores, ideias, belas sacadas e tudo o que represente o espírito. Em tempos de cultura das armas, as armas da cultura continuam sendo a inteligência, a ironia, o sublime e o profundo respeito pelo patrimônio acumulado ao longo de séculos de devoção ao belo, sabendo-se, obviamente, que belo pode ser aquilo que localiza e revela o mais feio da humanidade, sempre capaz de produzir o melhor e o pior.
Livre, leve e solto, Gilberto Schwartsmann explora vários aspectos da sempre complexa relação entre indivíduo e sociedade, dessa vontade de compartilhamento de emoções aos desvãos da alma onde se escondem os nossos fantasmas mais resilientes, que também a eles pode ser aplicada essa palavra da moda ESG. Como escreveu Luciano Alabarse, “teatro é, ao mesmo tempo, um exercício de humildade e ousadia”. No caso, a humildade diante das riquezas acumuladas pela cultura mundial; e a ousadia de brincar com elas como quem joga para iludir o tempo. Na saída do São Pedro, na noite fria de julho, pessoas comentavam:
– Que maravilha. Como é bom sair de casa para ver algum inteligente!
Síntese perfeita.
Continua...