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Beth Adams: A Decisão

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Beth Adams: A Decisão A convocação para a guerra, literalmente, caiu como uma bomba sobre a cabeça de Edward. A voz do comandante continuava ressoando em seus ouvidos.  Estava servindo na marinha há quase 20 anos, e não conseguia acreditar no que estava acontecendo. “Pura ingenuidade minha; todas as pessoas que fazem parte das Forças Armadas correm o risco de um dia ter que participar de alguma guerra. Mas não! Isto não está acontecendo comigo”, dizia para si mesmo.  A rotina da tripulação mudou completamente. Tudo começou a girar em torno da guerra e das possíveis consequências que ela traria. Muitos ficaram empolgados com a oportunidade que teriam para colocar em prática teorias aprendidas ao longo do tempo. Alguns não tinham opinião formada a respeito; para outros, simplesmente, tanto fazia lutar ou não lutar. Para uma minoria, e nela Edward estava incluído, a guerra era inútil. Só servia para destruir e não construía nada. O exemplo da Primeira Guerra Mundial ainda estava muito presente. Parecia que os povos não haviam aprendido a lição.  “O que levava os homens a matar uns aos outros? Poder? Ignorância? Dinheiro? Nada, mas nada mesmo justificava uma guerra”. E foi com estes pensamentos que Edward passou o restante do dia.    O mar estava calmo. Uma bela lua cheia iluminava a superfície da água formando um caminho prateado que ligava o navio ao horizonte. A calmaria do mar e da noite contrastava com a ebulição interna de Edward. Sentado no chão num canto do convés fumava um cigarro atrás do outro. Sua vida estava tranquila até então. Gostava do que fazia; não tinha queixas de seus superiores e sentia prazer em ensinar seus subordinados. Gostava de ouvir seus discos na eletrola em sua cabine, ler no convés nas manhãs de outono, fumar olhando as primeiras estrelas da noite.  As reflexões de Edward foram interrompidas pelo som de passos lentos que se aproximavam. Não estava com vontade de conversar. Torceu que os passos tomassem outro rumo; mas não; pararam em sua frente. Albert abaixou-se dobrando os joelhos devagar e perguntou: ‒ Tem um cigarro?  Sem dizer nada, Edward tirou a carteira do bolso e estendeu o braço para alcançá-la. Albert pegou um cigarro, agradeceu com um gesto e sentou no chão ao lado do amigo. A noite estava quieta, sem vento algum. Edward acendeu outro cigarro, tragou e ficou observando a fumaça subir lentamente formando desenhos no ar. Depois de um longo silêncio murmurou: ‒ O que vamos fazer de nossas vidas? Estou muito angustiado. Não consigo ver nenhum sentido no rumo que as coisas estão tomando. Sei que é preciso fazer algo. Mas o quê? Albert ouvia calado. Seu semblante sempre alegre estava carregado, com evidente preocupação. Ao contrário de Edward, Albert vivia dizendo em tom de brincadeira que não via a hora de ir para uma frente de batalha. Queria ouvir o barulho das armas, sentir o calor do fogo, ouvir as granadas explodindo. Mas agora que estava praticamente de cara com a guerra, sentia medo. Medo do futuro, […]

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A convocação para a guerra, literalmente, caiu como uma bomba sobre a cabeça de Edward. A voz do comandante continuava ressoando em seus ouvidos.  Estava servindo na marinha há quase 20 anos, e não conseguia acreditar no que estava acontecendo. “Pura ingenuidade minha; todas as pessoas que fazem parte das Forças Armadas correm o risco de um dia ter que participar de alguma guerra. Mas não! Isto não está acontecendo comigo”, dizia para si mesmo.  A rotina da tripulação mudou completamente. Tudo começou a girar em torno da guerra e das possíveis consequências que ela traria. Muitos ficaram empolgados com a oportunidade que teriam para colocar em prática teorias aprendidas ao longo do tempo. Alguns não tinham opinião formada a respeito; para outros, simplesmente, tanto fazia lutar ou não lutar. Para uma minoria, e nela Edward estava incluído, a guerra era inútil. Só servia para destruir e não construía nada. O exemplo da Primeira Guerra Mundial ainda estava muito presente. Parecia que os povos não haviam aprendido a lição.  “O que levava os homens a matar uns aos outros? Poder? Ignorância? Dinheiro? Nada, mas nada mesmo justificava uma guerra”. E foi com estes pensamentos que Edward passou o restante do dia.    O mar estava calmo. Uma bela lua cheia iluminava a superfície da água formando um caminho prateado que ligava o navio ao horizonte. A calmaria do mar e da noite contrastava com a ebulição interna de Edward. Sentado no chão num canto do convés fumava um cigarro atrás do outro. Sua vida estava tranquila até então. Gostava do que fazia; não tinha queixas de seus superiores e sentia prazer em ensinar seus subordinados. Gostava de ouvir seus discos na eletrola em sua cabine, ler no convés nas manhãs de outono, fumar olhando as primeiras estrelas da noite.  As reflexões de Edward foram interrompidas pelo som de passos lentos que se aproximavam. Não estava com vontade de conversar. Torceu que os passos tomassem outro rumo; mas não; pararam em sua frente. Albert abaixou-se dobrando os joelhos devagar e perguntou: ‒ Tem um cigarro?  Sem dizer nada, Edward tirou a carteira do bolso e estendeu o braço para alcançá-la. Albert pegou um cigarro, agradeceu com um gesto e sentou no chão ao lado do amigo. A noite estava quieta, sem vento algum. Edward acendeu outro cigarro, tragou e ficou observando a fumaça subir lentamente formando desenhos no ar. Depois de um longo silêncio murmurou: ‒ O que vamos fazer de nossas vidas? Estou muito angustiado. Não consigo ver nenhum sentido no rumo que as coisas estão tomando. Sei que é preciso fazer algo. Mas o quê? Albert ouvia calado. Seu semblante sempre alegre estava carregado, com evidente preocupação. Ao contrário de Edward, Albert vivia dizendo em tom de brincadeira que não via a hora de ir para uma frente de batalha. Queria ouvir o barulho das armas, sentir o calor do fogo, ouvir as granadas explodindo. Mas agora que estava praticamente de cara com a guerra, sentia medo. Medo do futuro, […]

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