Firenze

Essa cidade era um sonho antigo. O objetivo era pisar no mesmo chão que Leonardo da Vinci. Sim, havia outros interesses, mas o principal era esse. E depois que descobri que o Davi de Michelangelo não tava na França, e sim aqui, só vim. Coloquei a visita ao Davi em primeiro lugar, numa espécie de autotortura, de seguir fazendo mistério pra mim mesma até encontrar o Leonardo; então, no dia que cheguei, corri pra galeria onde Davi mora. Primeira coisa fascinante do homem: ele é fácil. Porque pra achar a Monalisa no Louvre é um parto, pra chegar na Capela Sistina no museu do Vaticano é outro, aliás, enquanto eu procurava a Sistina fiquei pensando, imagina num dia que o Michelangelo chegou borracho, como que ele conseguiu chegar até aquele ponto? É um labirinto, um mistério. Eu não teria sucesso, ficaria ali pela Stanza de Giotto e era isso. Amanhã nós vê. Bem, mas o Davi, tu entra na galeria, quebra pra direita e pronto. Já tá lá aquele homão da porra todo desnudo pra quem quiser ver.
Quando bati o olho, um mundo romântico se desfez dentro de mim. Porque eu achava que ia chorar de emoção diante de uma obra-prima, mas eis que senti foi um baita tesão. Antes que vocês me julguem por ter tesão numa estátua, peçam pra eu contar sobre os carne e osso pelos quais já me atraí. Tem uns de doer. Aí vocês me compreenderiam. Sabe o que eu queria naquele momento? Ter TODO O DINHEIRO DO MUNDO pra comprar aquela escultura e fazer valer a melhor cantada de pedreiro que existe: Ô, lá em casa! Mas não pensem que eu ia deixar o Davi feito uma estátua, um troféu na minha sala. Não mesmo! Eu ia colocar umas rodinhas nele e levar para onde quer que eu fosse dentro do meu apartamento. Davi, vamos almoçar, Davi, vamos dormir, e arrastava a estátua pelas rodinhas com todo amor e carinho. É responsabilidade afetiva que chama, eu não quero um troféu apenas.
[Continua...]