Precisamos conversar sobre G.H. ou O dia em que a patroa teve que limpar a casa
Dez e meia da manhã e nada para fazer. Entediada, G.H. decide matar o tempo limpando a casa. Sem habilidade com o balde e a vassoura, a atividade doméstica se transforma num evento sem precedentes. E a socialite, dona de uma cobertura, estabelece um percurso para a limpeza. O trajeto começaria no quarto vago da empregada doméstica que se demitiu e terminaria no living. Ou seja, sairia do subalterno-cubículo-do-final-do-corredor e despontaria na ampla-sala-de-estar. Mas antes de iniciar a arrumação, G.H. vai até o parapeito da janela, para fumar um cigarro.
Dá a última tragada, atira a bagana com displicência e, com cautela, fica na torcida para que nenhum vizinho perceba que a ponta veio do décimo terceiro andar. Refeita, volta a se concentrar na arrumação e se dirige ao cômodo vazio, com uma ideia na cabeça: “o quarto da empregada devia estar imundo, na sua dupla função de dormida e depósito de trapos, malas velhas, jornais antigos, papéis de embrulho e barbantes inúteis. Eu o deixaria limpo e pronto para a nova empregada”. O imaginário da patroa está cristalizado em concepções racistas relacionadas à imagem que tem da ex-funcionária e do lugar que obriga ela habitar, como ficará mais claro adiante. A expectativa é quebrada e surge um sentimento de revolta. Como ela mesma diz:
[Continua...]