Entrevista

Sergio Bampi: A inovação é um processo social que requer visão estratégica e política de Estado

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Sergio Bampi: A inovação é um processo social que requer visão estratégica e política de Estado Sergio Bampi (Foto: Arquivo pessoal)

A gente conversa com Sergio Bampi e o assunto voa longe: ele passa da estrutura dos chips para números de orçamento federal e daí migra para a dimensão social do conhecimento e da tecnologia, sem jamais perder o foco e a energia crítica. Trata-se de uma figura de enorme importância, não apenas na universidade, mas na política pública para a produção de chips. Esteve no centro de uma experiência que tinha muitas chances de ser bem sucedida mas que pelo caminho foi enfrentando limites e boicotes, até chegar ao estado atual, que é, para dizer o mínimo, lamentável.  

“Não se pode pensar em uma sociedade inovadora com o ensino básico depauperado’, diz Bampi, com a mesma clareza com que relata a invenção e o processo de instalação da CEITEC, a fábrica de chips localizada aqui na Lomba do Pinheiro, que com outra orientação estatal poderia colocar o Brasil, agora, numa posição de grande competitividade.

A trajetória profissional do professor Sergio Bampi – dedicada ao estudo, ensino e pesquisa nas áreas de microeletrônica aplicada à produção de bens de Tecnologia de Informação e Computação (TIC) – é repleta de “circuitos integrados”, resolvidos em sólida formação e atuação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mas, quando o assunto deriva para os esforços de completar os elos necessários à produção desses hardwares no Brasil, a conversa revelou que há conexões ainda faltantes para o país superar suas lacunas estruturais, que bloqueiam seu desenvolvimento científico e tecnológico. 

A entrevista foi feita por Álvaro Magalhães e Luís Augusto Fischer, via Zoom, em junho de 2022.


Parêntese – Tu és de Porto Alegre ou vieste fazer a faculdade aqui? Como foi tua formação?

Bampi – Sou de família de origem italiana da serra gaúcha que havia migrado de Caxias a Santa Catarina já na primeira metade do século XX. Nasci em Lages, SC, e por coincidência todos os sete irmãos homens cursaram Engenharia, no meu caso eletrônica. Passei a residir em Porto Alegre a partir de 1975, exceto nos seis anos em que passei no Vale do Silício, no meu doutorado. Decidi pesquisar microeletrônica, a partir da leitura de documentos estatais, dos anos 1977-79, que apontavam a estratégia do necessário investimento em computação e telecomunicações. O próprio II PND do governo Geisel continha a visão de fazer investimentos em hardware, desde o computador até o chip. Este Plano nacional visava a uma certa autonomia e diversificação industrial nesta área no Brasil. O setor de telecomunicações, então estatal, já percebia a conexão dos chips com os avanços tecnológicos das telecomunicações e da informática.

A UFRGS queria em 1979 criar um grupo de estudo, pesquisa e desenvolvimento na área. Como aluno laureado na graduação em Física e em Engenharia da universidade, fui estimulado pelo Programa de Mestrado em Computação da UFRGS a especializar-me no exterior. Para seguir essa trilha, inclusive abri mão de assumir cargo concursado na Petrobrás em prol da trajetória de pesquisa em que estou desde então. Aceito para mestrado e doutorado na Universidade de Stanford, com bolsa do CNPq. A UFRGS e o CNPq apoiaram-me em direção àquela universidade de ponta, com gestão privada e de interesse público. 

Hoje é moda falar no Vale do Silício, coração da indústria de computação mundial e de um excepcional ambiente de inovação, fruto da visão de desenvolvimento da microeletrônica à época. O meu objetivo era ter formação em um ambiente em que a pesquisa básica está ligada à aplicação, ou seja, ao desenvolvimento tecnológico e de produção de hardware microeletrônico, atividades que demandam altos investimentos em capital (ao contrário da área de desenvolvimento de software). O barateamento dos computadores, como dos celulares ou os smartphones e seus poderosos softwares, mudou nossa vida. Incluindo as atividades jornalísticas ou de difusão de informações, por exemplo. Já se sabia há 50 anos que a microeletrônica era uma área estratégica e continua sendo.

P – Foi um momento em que pessoas também saíram para estudar em áreas como Física Nuclear, por exemplo, com bastante apoio federal.

SB – Este ponto é fundamental: o momento histórico em que o Estado brasileiro passou a olhar o desenvolvimento científico e tecnológico como fundamental, como também ocorreu na área da Física Nuclear. No II PND desenhou-se o grande acordo nuclear Brasil-Alemanha. Que, lembremos, foi outro esforço estatal abalado por descontinuidades nos anos 1980. Com a Segunda Guerra Mundial, o complexo de defesa foi fortalecido a partir de resultados que tornaram os Estados Unidos da América uma nação vitoriosa e a noção de que ciência dá resultado. A partir dessa visão, foram criadas instituições como a National Science Foundation com os militares, aqui e nos EUA, conduzindo diretamente os esforços técnico-industriais mais estratégicos. No Brasil, nos governos Dutra e Vargas foram instituídos o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), criado por um Almirante (Álvaro Alberto), o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) do qual originou-se a tecnologia para criar a estatal Embraer em 1969, com investimentos contínuos do Estado. A CAPES também foi criada em 1951 para estimular a atividade de pesquisa dos docentes, fruto dessa visão liderada por Vargas de um projeto nacional de desenvolvimento com maior autonomia local. 

A criação da Petrobrás em 1953 também se insere nesse contexto francamente industrializante. Na época, as mesmas forças que hoje dominam a política econômica com Paulo Guedes lutavam contra, afirmando que não havia petróleo no Brasil e que uma empresa estatal seria desnecessária. Essa visão perdurou até o momento em que cursei a graduação e fui estimulado a dedicar minha vida profissional inserido em um projeto de desenvolvimento nacional e de uma indústria em particular, a de circuitos integrados.

P – Passado o período de formação no Vale do Silício, ao mesmo tempo que tu consolidas as atividades de professor e pesquisador na UFRGS, o Brasil sofreu mudanças muito fortes com o fim do regime militar, uma crise econômica severa (com restrições de toda ordem, inclusive fiscais) e a onda ideológica do neoliberalismo chegando com força. Há importação de soluções institucionais mais flexíveis – com menor intervenção direta do aparelho estatal e arranjos mais complexos – tais quais já se praticavam justamente no Vale do Silício e em outras regiões. De lá para cá houve também a introdução de métodos gerencialistas nas instituições de ensino e pesquisa. Que impactos dessas mudanças tu destacarias?

SB – Mesmo com as várias mudanças que você menciona, me parece claro que o Estado tem o papel fundamental na condução das políticas estratégicas que impactam o desenvolvimento tecnológico. Passadas décadas do processo de redemocratização eu vejo que os temas da inovação e das políticas de desenvolvimento científico e tecnológico continuam na ordem do dia. Interessante que esta visão estratégica da tecnologia como instrumento de Estado para fortalecer a economia como um todo foi dominante na política estatal e no complexo militar nos EUA. Políticas de Estado, como essa, têm continuidade nos países avançados. No Brasil, ao contrário, a descontinuidade é a praga permanente. Desde toda a inovação na eletrônica, nas comunicações, como os chips ou a própria rede global internet, tiveram a presença do Departamento de Defesa norte-americano, na direção estratégica e financiamento dos projetos, mesmo que estes sejam desenvolvidos por empresas privadas.

Uma das condições que foram criadas para o exercício da hegemonia dos Estados Unidos hoje é, por exemplo, a capacidade de participar de uma guerra como a da Ucrânia sem sequer serem notados, por meio de mísseis teleguiados, por exemplo. Não existe possibilidade de alguém movimentar antigos canhões ou um simples batalhão sem que o complexo militar americano não monitore. Com a deslocalização da informação e sensores satelitais, as potências tecnológicas podem participar sem estar presentes em uma guerra que, aparentemente, seria entre dois outros países. O monitoramento é possível pelo desenvolvimento da microeletrônica. Softwares e eletrônica avançada são tecnologias de base. Para a defesa do estado-nação, não apenas para as comunicações digitais dos cidadãos.

O Brasil perdeu o rumo de poder desenvolver políticas nessas áreas por uma visão absolutamente neoliberal, uma visão muito primária de que o Estado tem de ficar fora disso. Essa visão dominou nos governos dos dois presidentes Fernandos [Collor e Henrique].  A partir dos anos 1990 foi introduzida a ideia dos ecossistemas de inovação. Só que no Brasil isso foi entendido como processos meramente econômicos (de mercado), como uma famosa frase de que “a inovação acontece é na empresa”. Reduzir a inovação aos diferenciais de produtos ou serviços “no mercado” sem perceber que há interações sociais (com a Educação e com políticas de Estado) necessárias é um equívoco conceitual grave.

O cientista não somente quer desenvolver projetos ou empresas inovadoras (startups). Ele tem de ter segurança de uma inserção social mais ampla. Por exemplo, é necessário ter pessoas qualificadas a partir de um sistema educacional que motive os jovens e funcione bem. A inovação é um processo social que requer visão estratégica e política de Estado, mas não foi esse o sentido pelo qual foi incorporado à Constituição Federal em 2015. O que vejo no Brasil é que houve incentivo e financiamento à inovação (privada, individual), sem as devidas interações com o sistema educacional, por exemplo. Não se pode pensar em uma sociedade inovadora com o ensino básico depauperado. 

P – Voltando ainda para a o ambiente da UFRGS dos anos 1970/80: havia um computador central que todos os estudantes usavam, não é? Como era esse ambiente na computação da UFRGS?

SB – Na segunda metade dos anos 1970, quando fui estudante de graduação, a UFRGS tinha seu Centro de Processamento de Dados (CPD) que era pioneiro no sul do país, iniciado pela Reitoria em 1968. E, alguns anos depois, a UFRGS criou sua Divisão Acadêmica do CPD que foi onde nasceu, no final de 1972, a Pós-Graduação em Computação, com a visão de desenvolvimento local de software e de hardware. Naquela época tínhamos de criar programas e digitar em cartões perfurados (que podem ser vistos no pequeno Museu no Instituto de Informática) que iam para o CPD serem processados por um dos computadores fabricados pela IBM ou pela Burroughs.

Quando cheguei nos Estados Unidos em 1980 para cursar o Doutorado, já havia uma transição para computação de menor porte, tal qual é hoje, em que programamos diretamente na tela. Lembro do lançamento do primeiro IBM PC em 1981, que custava dois mil e oitocentos dólares, fruto do avanço da microeletrônica, em especial dos chips. Da computação pessoal em mesa houve a migração para computação móvel, largamente utilizada hoje em dia, nos smartphones. Nos anos 1980 já havia rede de e-mails entre as universidades americanas, tudo financiado pelo governo dos EUA, que se transformou na internet nos anos 1990. O GPS também foi desenvolvido com esse formato institucional de estímulo a partir de projetos estratégicos do Departamento de Defesa. Todo pessoal que vislumbra a possibilidade de desenvolver softwares por meio de uma startup e, se possível, até ficar rico – todo esse ecossistema só é possível porque houve desenvolvimento de hardwares que tornam acessíveis computadores portáteis, como nos aparelhos celulares. Incorporaram bilhões de usuários à rede – e daí são infinitas as possibilidades.

Por exemplo, no aparelho que tenho na mão tem oito chips de rádio frequência (o GPS é um deles), que recebem sinais de satélites e de estações próximas (os roteadores), que por sua vez foram projeto militar norte-americano. O meu grupo acadêmico projeta esse tipo de chip. Desde os anos 1960 havia a visão de que esses serviços básicos estariam à disposição para uso comercial empresarial, o que revolucionou o mundo, assim como a decisão tomada a partir de uma comunidade global de cientistas, de tornar a internet aberta ao uso privado e individual.

Com o barateamento dos aparelhos eletrônicos, os gaps de acesso às novas tecnologias pela nossa universidade diminuíram. Quando usamos um desses aparelhos para nos comunicarmos à distância nem fazemos ideia do número de computadores e sistemas automaticamente envolvidos. Por exemplo, toda essa tecnologia de câmeras em PCs ou telefones tem microeletrônica e chips dentro. E nenhum país que pretenda ter alguma importância no comércio desses setores pode abrir mão disso.

Já a UFRGS é líder no Brasil na área de projetos de chips, com o melhor Doutorado em Microeletrônica do país, graças a uma visão estratégica formulada bem antes, nos anos 1970. E por isso fui me envolver em tentativas de políticas industriais no Brasil visando a fabricação de hardware de computação no país. Infelizmente, ainda hoje no território ao sul do Rio Grande (divisa entre México e EUA) não existe uma unidade produtora de chips instalada, só temos fábricas que encapsulam os chips importados. E compramos do exterior os chips prontos, com sua complexa tecnologia embarcada.

P – Vamos falar do CEITEC (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada). Em que condições surgiu esse projeto?

SB – Várias pessoas sugerem que eu deveria escrever um livro sobre como esse investimento acabou sendo realizado em Porto Alegre. É bom ter em mente que o setor de microeletrônica apresenta ciclos, como o pico de demanda recente que levou a questão dos chips ao noticiário, pelas dificuldades de fabricar (i.e. montar) alguns bens, como os carros.

Nos anos 1990, fortemente neoliberais, houve uma guinada em termos de visão de política industrial, em que se afirmava uma visão de que “a melhor política industrial é não ter política industrial”, hegemônica no período dos governos FHC. O Estado deveria estar fora, mas a inovação era genericamente considerada crucial. Criaram-se políticas de estímulo à inovação importantes (recentemente destruídas, de 2016 em diante). 

Nos anos de 1999 e 2000 estava-se em momento de pico de demanda por chips, e uma empresa produtora, a Motorola, por meio de representantes (inclusive um técnico brasileiro), entrou em contato primeiramente com a Universidade de São Paulo para fazer um centro de produção eletrônica lá, até porque a USP já havia feito a primeira “sala limpa” para pesquisa em chips no final dos anos 1960. Explicando: “sala limpa” é um local com rigorosos controles da qualidade do ar, da temperatura, das vibrações e outros elementos, o que demanda um sofisticado e caro sistema de circulação de ar e uma construção ultra-especial. Bem: o projeto tratado com a Motorola em 1999 era para que fosse feita uma nova sala limpa na USP, desta vez para produzir chips mais modernos. Porém, essa estrutura é muito cara para ser absorvida por uma universidade, e o projeto foi levado à Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), que decidiu não apoiar o projeto da USP. 

Como eu conhecia os colegas envolvidos no projeto, entrei em conversa com colegas aqui da UFRGS e da PUC, e houve a iniciativa da Motorola e da PUC para conversar com o governo estadual para abrir possibilidades para o projeto da sala limpa. Certo dia de abril de 2000, fui chamado para essa conversa com representantes do governo Olívio Dutra, à frente do governo estadual, que receberam bem a ideia e pediram um desenho de anteprojeto de uma mini-fábrica. Desde o primeiro momento, alertamos que o projeto demandava recursos expressivos para instalação e manutenção, maiores que a capacidade do nosso Tesouro Estadual.

Escrevi um documento pequeno, encaminhado ao então Secretário de Ciência e Tecnologia, Adão Villaverde. Ali já estava posto que a ideia era estratégica mas que requeria uma escala e o engajamento federal para a garantia dos recursos necessários, e que deveria a instituição responsável por gerir esse complexo ser do tipo entidade do terceiro setor (a tal hélice tríplice ou quádrupla), tal qual funciona em vários lugares do mundo, inclusive em Stanford, no Imec da Bélgica, no ETRI da Coreia do Sul, e em tantos outros países.

P – É uma situação semelhante ao que veio a ser o Fórum Social Mundial, criado pela ABONG (Associação Brasileira de ONGs), que tem sede em São Paulo, e que foi trazida para o governo estadual, que abrigou a ideia até pelos vínculos com as experiências participativas gaúchas.

SB – Exato. No documento inicial do projeto da CEITEC apresentado, havia a proposta de um conjunto de etapas e atores como um centro multiusuários, o que leva a um formato institucional bem mais ágil e flexível do que temos nas universidades brasileiras e que necessitaria financiamento assegurado e contínuo para, por exemplo, construir e fazer a manutenção de uma sala limpa, e gerir os projetos inovadores que ela encetaria. Sem a garantia de financiamento, há o risco do investimento e patrimônio se deteriorarem, como foi o caso recente do Museu Nacional, abrigado na UFRJ. 

A pedido do governo estadual, articulamos uma espécie de “Pacto Alegre” em torno do projeto da CEITEC, que acabaria sendo levado à consideração do governo federal, já em 2001 e 2002. O acolhimento federal foi melhor após 2003. Houve uma dificuldade dos parceiros de outras universidades em reconhecer na UFRGS um ator diferenciado pela capacidade dos seus quadros para, por exemplo, produzir pesquisas inovadoras e formar os engenheiros e cientistas para a CEITEC. O que, de fato, a UFRGS fez.

P – Quando o projeto foi levado ao governo federal, havia um conjunto de unidades de pesquisa vinculados ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI) que eram (e são até hoje) Organizações Sociais. Porém, a CEITEC acabaria sendo criada com natureza jurídica de empresa estatal.

SB – Este ponto chama a atenção de todos os envolvidos na criação da CEITEC. Como dito acima, o projeto propôs uma entidade do terceiro setor para gerir o Centro (CEITEC, como centro de inovação tripla-hélice), e a vinculação ao atual MCTI era a recomendada. Nessa Instituição atuariam diversos atores necessários, tais como as universidades e representações corporativas, de empresas e entidades externas. A Lei que criou o modelo das Organizações Sociais (OS) em 1998 foi por iniciativa do Ministro Bresser Pereira, intelectual brilhante e independente. A CEITEC virou estatal após ter o formato de OS aprovado pelos Ministros do MCTI e do Planejamento em 2006. Já tínhamos uma associação sem fins lucrativos formada, ou seja, as condições institucionais para a criação da CEITEC como OS. Porém, no trâmite final no âmbito da Presidência da República, em especial da sua Casa Civil, houve uma mudança de entendimento do núcleo do governo e foi proposto pela Casa Civil o PL para a criação de uma empresa estatal. 

Naquela altura em que o PL tramitou no Congresso (de 2007 a 2008) o prédio da CEITEC já estava sendo construído, na Lomba do Pinheiro, decisão para a qual o anterior Ministro Eduardo Campos foi decisivo. A Prefeitura de Porto Alegre na época defendia a localização no 4º distrito. Porém essa região da cidade não era a mais adequada, principalmente pela baixa qualidade do solo e pela pressão de movimentos de veículos a trepidar a sala limpa. Não participei mais da implantação da instituição a partir do momento da aprovação da Lei que criou a empresa estatal Ceitec S.A. de capital fechado.

Infelizmente, a CEITEC vem sendo maltratada no debate público, aparecendo como um desperdício dos recursos públicos. O investimento em capital fixo foi relativamente baixo, se comparado aos investimentos necessários nos diversos países em que há fabricação de chips. Hoje temos uma carência enorme dessa produção de circuitos integrados no nível internacional e poderíamos já ter essa produção no país, em Porto Alegre. Atualmente há um veto do governo federal – especialmente do Ministério da Economia – à CEITEC, que se encontra em processo de liquidação.

Frequentemente é apresentada a ideia de que haveria alto investimento para produzir apenas chips para rastrear o gado bovino, como forma de desqualificar essa estrutura, que produziu circuitos integrados para dezenas de outras empresas e tipos de aplicação. O governo precisa entender que unidades de pesquisas, como é a empresa federal EMBRAPA, por exemplo, geram valor na medida em que as inovações são agregadas aos processos produtivos de forma sistêmica e por outros atores do ecossistema de inovação.

Com a crise de suprimentos de chips, o governo federal teve de dar uma resposta e em maio de 2022 anunciou que haveria um Plano Nacional de Semicondutores. E infelizmente a CEITEC não está sendo considerada como elemento importante nesse Plano, do qual nada se conhece publicamente até junho de 2022. E nem mesmo os atores locais estão se posicionando contra a extinção dela. É um equívoco muito grande. Estamos perdendo os profissionais aqui formados para outras empresas, dada a decisão atabalhoada do Ministério da Economia de extinção da CEITEC. É lamentável.

P – Mesmo com essa derrota política, que balanço geral tu fazes da tua carreira profissional?

SB – Esse episódio da CEITEC desperta muito interesse público, mas a minha atuação dentro da UFRGS é plena. Aqui criamos um ambiente voltado para a formação de profissionais especializados na educação e pesquisa aplicada em micro e nanoeletrônica. Conduzi grandes projetos de inovação e, no grupo de Microeletrônica da UFRGS, formamos muita gente qualificada até hoje, o que é motivo de orgulho e diferencia nosso estado no contexto nacional e internacional.

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