Capítulo 4: Saber nadar

Sem saber como nadar no novo oceano, meu bote salva-vidas foi o verso de uma canção, um som solto na memória, tão avulso quanto providencial. Pelo cantar de Gilberto Gil, também navegante dos mares da insuficiência renal, a transmissão vinda de algum lugar do futuro ou do inconsciente havia me encorajado “Os pés, de manhã, pisar o chão”.
A bordo de uma cadeira de rodas pilotada em alta velocidade através dos corredores, elevadores e pátios, eu me esforçava para não cair do assento nem deixar a pasta lotada de prescrições médicas escorregar do meu colo. Quanto mais as rodas riscavam o piso, mais eu me distanciava do Hospital Dom Vicente Scherer e atravessava os portais do Santa Clara, partindo para uma realidade até então ignorada por mim.
A enfermeira empurrou a cadeira para dentro de uma sala, me informando que seria ali minha primeira sessão de hemodiálise.
[Continua...]