Folhetim

Uma questão de prioridades – Capítulo 2

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Uma questão de prioridades – Capítulo 2
– Que história é esta que tu nunca mais quer ver a minha cara?!  Era a Sônia… tentando retomar um contato. Contato.  Aquelas expressões que caracterizam finais de diálogos de algo que acabará não acontecendo, como por exemplo, “a gente vai se falando”, “vamo se falá”, “liga pra mim”, “manda um whats”, “eu entro em contato”… O único contato que o Nelson esperava era um contato imediato do terceiro grau e que um alienígena o salvasse dos seus tormentos. Sempre, sempre… alguma icônica referência aos anos 1970 ou virada pros 1980, quando era jovem-jovem-demais. – Sônia! Tudo bem?! Não acredita no que andam dizendo por aí. Só ando um pouco assoberbado de trabalho. Certo?! E pra completar, o Nelson lascou:  – Tô um pouco ocupado, agora… A gente vai se falando, tá bom?! Vamo se falá, com certeza.  E ficou em silêncio esperando a resposta. Ela aderiu. Ela acreditou. Ela ficou calma. Os dois desligaram o telefone praticamente juntos e cada um foi seguir sua vida. Sônia indo para o pilates. Nelson prosseguindo sua caminhada pela avenida Osvaldo Aranha. Tentar ser adulto tinha disso, pensou Nelson, entender como as pessoas vivem, como as pessoas tentam tocar suas vidas, refletir sobre essas coisas e respeitar alguns limites do que pode ou não pode ser dito. Enfim…  Quase atravessando o viaduto da Silva Só, a pernada estava rendendo bem, Nelson lembrou de um amigo falecido durante a pandemia que, justamente, tinha perdido há pouco tempo sua esposa. Grande Paulo Renato! Camarada do tempo do ensino médio no colégio Piratini. Ele tinha ido ao velório da esposa do Nelson… tinha falecido vitimada por um câncer. A relação de proximidade com colegas de colégio, seja no ensino fundamental ou médio, sempre se dava por alguma identificação que transcendia as escolhas clubísticas, fulano é do Grêmio, beltrano é do Inter. Nelson tinha amigos que torciam para clubes de outros rincões, como o Caco, que era “xavante”, torcedor do Brasil de Pelotas, e o Fabrício, que era torcedor do clube da estrela solitária, o Botafogo do Rio de Janeiro – ele era fã do Mané Garrincha e do Marinho Chagas.  Provavelmente o gosto pela música em geral, qualquer tipo de música, gerava uma facilidade de iniciar alguma conversa: tu viu o show do Simon & Garfunkel no Central Park?! Tu sabe o que é new wave?! Gosta de Premeditando o Breque e Grupo Rumo?! Vamos começar umas aulas de violão?!  O Paulo então, era o tipo de colega que gostava de música, desses tipos de assuntos, e tinha senso de humor. A risada fácil, larga!  Sabe quando a gente lembra alguém que partiu e a recordação é muito boa?  A gente dá um sorriso olhando pro nada. Se emociona. Faz uma espécie de prece profana em silêncio, a base deste sorriso com a boca fechada, um sutil movimento dos lábios. Era assim que o Nelson estava se sentindo ao lembrar de um amigo recém falecido com o sol da avenida Protásio Alves batendo na lata.  Nelson […]

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