Operação Belchior

Um rolê com Belchior

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Um rolê com Belchior Foi como se diz: um rolê aleatório.  Era inverno. Junho de 2015. Eu morava na rua André da Rocha, uma espécie de entrelugar do bairro, porque é, ainda hoje, uma rua que liga o Centro à Cidade Baixa, zona boêmia de Porto Alegre. Eu estava chegando em casa quando recebi no celular uma mensagem de uma amiga, Ediane, mais conhecida como Piqui (com quem na época eu dividia um apê): “Jef, tô aqui no Casarinho com o Belchior, vem pra cá!!!”  Olhei a mensagem. Depois li de novo e fiz as contas: é mais de meia-noite, é domingo, dia de Sarau, o dia em que o pessoal se enlouquece no Casarinho. Então deduzi que a Piqui poderia estar alcoolizada ou sob efeitos de psicotrópicos. Também então achei que o Belchior era o apelido de alguém. Respondi com um “hahaha” e entrei em casa. Frio de 10°, louco para me enfiar debaixo das cobertas e dormir. Foi que fiz.  No entanto, perto das 2h o celular tocou. Era a Piqui com a voz alegre e levemente arrastada. “Jef, o Belchior tá aqui, já falamos de ti pra ele, do teu livro, vem pra cá”. Fiquei em silêncio entre o sono e força para entender o que estava acontecendo. A Piqui repetiu: “Jef, é o Belchior”. Ao fundo, na ligação dela, dava para ouvir um vozerio, dedilhar de violão e risadas. Então me recostei na cama e disse: “Piqui, tu tá falando sério? É o Belchior mesmo? Aquele das Paralelas, Divina Comédia Humana e A Palo seco? Não é brincadeira isso aí? Já tá tarde, tá frio pra caralho e amanhã eu dou aula”.  A ligação estava baixa, mas ela entendeu o que eu disse: “Porra, Jef, é claro que eu tô falando sério. Ele tá aqui. Ele e a companheira dele, vem logo”. Levantei a contragosto. Vesti a roupa fria, o casaco frio e fui. No caminho, fiquei pensando que podia ser uma brincadeira, mas também podia ser verdade. De repente me vi cantarolando baixinho a música Na hora do almoço.  Ao chegar no Casarinho (ah, esqueci de dizer o que era o Casarinho. Vou explicar: O Casarinho ficava na rua Fernando Machado, no Centro Histórico de Porto Alegre. Era um sobradinho. Frequentado por estudantes descolados de arquitetura, história, letras e teatro. Às vezes tinha um perdido da engenharia ou da computação, mas era caso raro. Uma vez por mês acontecia um sarau que era uma mistura de música artesanal com cerveja artesanal, poesia artesanal, bolo artesanal e se duvidar era capaz de sair de lá sendo uma pessoa artesanal também) toquei a campainha. A luz da rua acendeu, em seguida uma moça loira de dreads veio abrir a porta. Ela perguntou meu nome. Eu disse. Me deixou entrar. Antes de fechar a porta ela deu uma olhadinha na rua como quem confere se não tinha mais ninguém por ali. Ao subir a escada, ouvi uma cantoria.  Conforme ia ganhando os degraus percebia que estavam cantando a música Apenas um rapaz […]

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Foi como se diz: um rolê aleatório.  Era inverno. Junho de 2015. Eu morava na rua André da Rocha, uma espécie de entrelugar do bairro, porque é, ainda hoje, uma rua que liga o Centro à Cidade Baixa, zona boêmia de Porto Alegre. Eu estava chegando em casa quando recebi no celular uma mensagem de uma amiga, Ediane, mais conhecida como Piqui (com quem na época eu dividia um apê): “Jef, tô aqui no Casarinho com o Belchior, vem pra cá!!!”  Olhei a mensagem. Depois li de novo e fiz as contas: é mais de meia-noite, é domingo, dia de Sarau, o dia em que o pessoal se enlouquece no Casarinho. Então deduzi que a Piqui poderia estar alcoolizada ou sob efeitos de psicotrópicos. Também então achei que o Belchior era o apelido de alguém. Respondi com um “hahaha” e entrei em casa. Frio de 10°, louco para me enfiar debaixo das cobertas e dormir. Foi que fiz.  No entanto, perto das 2h o celular tocou. Era a Piqui com a voz alegre e levemente arrastada. “Jef, o Belchior tá aqui, já falamos de ti pra ele, do teu livro, vem pra cá”. Fiquei em silêncio entre o sono e força para entender o que estava acontecendo. A Piqui repetiu: “Jef, é o Belchior”. Ao fundo, na ligação dela, dava para ouvir um vozerio, dedilhar de violão e risadas. Então me recostei na cama e disse: “Piqui, tu tá falando sério? É o Belchior mesmo? Aquele das Paralelas, Divina Comédia Humana e A Palo seco? Não é brincadeira isso aí? Já tá tarde, tá frio pra caralho e amanhã eu dou aula”.  A ligação estava baixa, mas ela entendeu o que eu disse: “Porra, Jef, é claro que eu tô falando sério. Ele tá aqui. Ele e a companheira dele, vem logo”. Levantei a contragosto. Vesti a roupa fria, o casaco frio e fui. No caminho, fiquei pensando que podia ser uma brincadeira, mas também podia ser verdade. De repente me vi cantarolando baixinho a música Na hora do almoço.  Ao chegar no Casarinho (ah, esqueci de dizer o que era o Casarinho. Vou explicar: O Casarinho ficava na rua Fernando Machado, no Centro Histórico de Porto Alegre. Era um sobradinho. Frequentado por estudantes descolados de arquitetura, história, letras e teatro. Às vezes tinha um perdido da engenharia ou da computação, mas era caso raro. Uma vez por mês acontecia um sarau que era uma mistura de música artesanal com cerveja artesanal, poesia artesanal, bolo artesanal e se duvidar era capaz de sair de lá sendo uma pessoa artesanal também) toquei a campainha. A luz da rua acendeu, em seguida uma moça loira de dreads veio abrir a porta. Ela perguntou meu nome. Eu disse. Me deixou entrar. Antes de fechar a porta ela deu uma olhadinha na rua como quem confere se não tinha mais ninguém por ali. Ao subir a escada, ouvi uma cantoria.  Conforme ia ganhando os degraus percebia que estavam cantando a música Apenas um rapaz […]

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