Operação Sérgio da Costa Franco

Memória

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Memória

Acumulei papelada e lembranças, velhos jornais, cartas de amigos e irmãos distantes. Guardei dentro de livros recortes de artigos ou poemas que me apeteceram. Conservei antigos mapas que o tempo desatualizou e as mudanças dilaceraram. Arquivei a produção jornalística de muitos anos.

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Descansando durante caminhada diária no Parque Marinha do Brasil (Acervo pessoal)

Acumulei papelada e lembranças, velhos jornais, cartas de amigos e irmãos distantes. Guardei dentro de livros recortes de artigos ou poemas que me apeteceram. Conservei antigos mapas que o tempo desatualizou e as mudanças dilaceraram. Arquivei a produção jornalística de muitos anos.

Quando me sucede reabrir esse museu de antiguidades domésticas a consciência do tempo limpa o para-brisa da rotina e me impele para um estranho estado de levitação. 

O tempo, que estamos sempre marcando nos relógios e nos calendários, só nos mostra sua real dimensão quando nos revemos numa encardida fotografia, numa remota notícia de festa escolar, ou quando apalpamos de qualquer modo a materialização de ontem. É então que a vida nos aparece como um rio que correu ora manso, ora ríspido, tomando rumos imprevistos e sofrendo desvios indesejados. Mas olhando assim, do alto e de longe, o curso da corrente parece fatal e inevitável. Tudo sucedeu conforme as circunstâncias ordenaram. É inútil e até cruel o que podia ter sido e que não foi, tentar voltar atrás sobre antigas opções ou desfazer caminhos. 

Parece inevitável, entretanto, quando se reveem passados episódios, rostos desaparecidos, amarelentos papéis, esse reexame das escolhas pretéritas. Como também parece inafastável um certo balanço moral da própria conduta e do comportamento dos que nos cercaram ao longo da vida. As lembranças nos devolvem as imagens de alguns caracteres exemplares, de exemplos magníficos de lisura, coragem, altruísmo e honradez. Ao mesmo tempo, percebemos quanta cafajestice, quanta pequenez, quanta falta de escrúpulos andou rondando nossos caminhos. 

Mas os julgamentos são sempre difíceis. Mesmo os piores calhordas têm suas motivações atenuantes. E alguns que nos parecem tipos sem mancha apenas não tiveram circunstâncias que lhes liberassem as tendências canalhas. 

O balanço da vida pode nos levar a uma grande indiferença em relação até mesmo a insultos e aleivosias que nos diriam. Numa troteada comprida, já se sabe que é do rancho mais relaxado que surge a cachorrada mais barulhenta e agressiva. E já o velho Ovídio escreveu algo que pode ser traduzido assim: “A consciência do homem reto ri das mentiras da difamação”. 

É ridículo andar de “curriculum vitae” no bolso, para mostrá-lo como cartela de propaganda. Mas há um certo prazer em guardá-lo nas gavetas, livre de manchas e de traças, para que o vejam filhos e netos, que nos continuam. 


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