A extinção da Fundação Cultural de Canela, com 30 anos de atividades
Tentei argumentar que, puxa, era só ver os editais abertos do Governo do Estado – um deles o maior da história do RS, chamado “Diversidade das Culturas”.
– A Fundação precisa incluir, se abrir, ser plural. Temos tanta gente que poderia estar aqui, contribuindo.
Mas não, negaram a proposta de criação do Departamento de Ações Afirmativas.
– NA FUNDAÇÃO NÃO TEM RACISMO, NÃO TEM PRECONCEITO.
E com essa afirmação, típica, lamentavelmente o fim se aproximava.
A dívida gigantesca, por falha na prestação de contas em evento de 2011, veio a se tornar o motivo principal do fechamento da entidade. Mas é sabido que o mau espírito em âmbito federal, que na preconceituosa serra gaúcha foi acachapante, havia chegado e contaminado.
– Que cacique, o quê, índio é tudo vagabundo.
Com estas palavras de pessoas da Direção – ligadas à Prefeitura –, é certo que não havia volta.
O desmonte estava feito.
Teatro fechado. Centro cultural Casa de Pedra interditado. Fundação Cultural extinta. Esvaziamento do Conselho. Sem fundo, sem editais (nem emergenciais durante a pandemia), sem Feira do Livro. Zero política pública.
É um projeto.
Testemunhei de dentro a deterioração de uma instituição que serviu por 3 décadas a nossa comunidade e encheu os olhos de visitantes com a beleza transformadora da arte.
O projeto de destruição da cultura tem que acabar.
E essa gente ainda tem a coragem de dizer que o problema é o ideário de esquerda que atrapalha uma área tão humana como a nossa.
Mas a hora deles vai chegar.
Seguimos.
Depoimento de empresária do setor turístico, apoiadora e frequentadora dos projetos e eventos culturais:
Fico triste com a extinção da Fundação Cultural de Canela, porque via nela uma entidade de referência em muitos aspectos. Sou empresária do ramo de turismo e sempre apoiamos eventos culturais através dessa entidade, desde festivais de teatro de bonecos até feiras do livro, entre outros.
A memória cultural da cidade tem sempre algum vínculo com a Fundação e hoje me pergunto para onde vou olhar, quando buscar o resgate dessa história. Vejo o acervo reunido durante os últimos 30 anos disperso na casa de pessoas que não querem vê-lo desaparecer, porém seria muito importante tê-lo num local adequado, todo reunido, como testemunho de uma história que deve ser preservada.
A memória do nosso querido escritor Josué Guimarães e de D. Nydia, que deu nome ao espaço onde tantas vezes nos reunimos para assistir a peças, filmes, debates, está intimamente ligada à força criativa dessa cidade cheia de talentos artísticos. Josué dá nome à biblioteca municipal, e D. Nydia é sempre citada como a articuladora de movimentos culturais que aconteceram em Canela, com seu grande número de amigos e admiradores do campo das artes. Isso tudo é história, é admiração, orgulho, afeto. Está ligado à identidade de Canela tanto quanto a cascata do Caracol ou a Catedral de Pedra, é nosso patrimônio.
Não podemos jogá-lo fora, porque é ele que nos distingue e nos torna únicos. Uma cidade responsável tem de ser sustentável, preservando não só seu meio ambiente, mas suas raízes, sua história, valorizando-a e cuidando de incorporá-la à vida dos seus visitantes e das novas gerações.
Fernando Gomes – Produtor cultural