Revista Parêntese

Parêntese 47: Olha o chão em que pisas

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Parêntese 47: Olha o chão em que pisas

Mais de um bom leitor e bom ouvinte considera que “Chão de estrelas” é um dos grandes momentos da canção brasileira. A letra é de Orestes Barbosa, a música Sílvio Caldas. A canção tem um quê de torta, em letra e em melodia, mas não vem ao caso isso, agora. Torta e paradoxal: estrelas no chão.

Um dos meus ídolos pessoais, o debochado nihilista Ivan lessa, considerava um de seus versos preferidos o seguinte. Lá do miolo de “Chão de estrelas”: “Tu pisavas nos astros, distraída”. Uma beleza estranha emana dele, nesse duplo twist carpado dos dois “str”, no reiterado paradoxo entre chão e céu. 

Pois é assim, distraído, que a gente passa, em geral, pelas calçadas da rua da Praia. Mas não o Marcello Campos, que olha pro chão e enxerga o que vai no ensaio de fotos desta edição: uma beleza meio torta, meio triste, que a gente pisa sem atenção. 

Distraídos vamos indo para o fim, em regra. A não ser que a gente tenha a graça de conhecer, em pessoa ou em texto, um dos grandes de nosso tempo, essa figura raríssima chamada Paulo Neves, tradutor, poeta e olhador dos chãos por onde passamos, nosso entrevistado de hoje. 

Não precisa acreditar em mim: vai com teus próprios pés ali na poesia do Paulo, na seção Relampo – ou em seus livros, o novo rio linguagem ou o anterior viagem, espera, à venda na Bamboletras e noutras boas casas do ramo. A obra dele é daqueles quase segredos valiosos, que mais adensa seu valor – e o nosso valor também, como cultura.

Arthur de Faria agora começa a contar a história de outro caso notável, Chiquinho do Acordeom, que nem era Francisco e era genial. Cláudia Laitano nos conta dos garantistas. José Falero viaja em duas linhas da Carris. Júlia Dantas entra cada vez mais nos mistérios do menino Lúpino, que não sei o leitor, mas a mim já me arrastou para dentro de seu mundo. E a Maria Avelina Gastal nos leva a passear por uma memória que seguramente é compartilhada por muitos, num dos mais charmosos cinemas de calçada que Porto Alegre já teve.

Roberto Jardim apresenta hoje o quinto e derradeiro capítulo da série sobre o outro futebol possível. Por cinco semanas viajamos por casos, gentes, cenas, clubes, que agigantam o esporte mais popular do mundo para apreciadores da democracia.

Tiago Schiffner retoma o clássico romance A paixão segundo GH e o revira do avesso: a pergunta nova se dirige agora não à protagonista, essa senhora GH que tanta força tem, mas à invisível Janair, a empregada, aquela em cujo quarto acontece a cena decisiva do romance. (Entre Janair e GH, quem será a mulher representada na arte da Grazi?) Janair é, aliás, a protagonista de uma peça de Tamyres Batista, que Ângelo Chemello Pereira nos apresenta. 

Agora olha pro chão, ali onde o pé cai ao acaso. Ali pode estar, distraída, uma barata ou uma beleza da vida.

Luís Augusto Fischer

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