Revista Parêntese

Parêntese #92: O específico contra Platão

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Parêntese #92: O específico contra Platão

Sabedoria do Jorge Luis Borges – umas delas, porque este velho reacionário era flor de sábio: “A arte não é platônica”. Nem a arte, nem o melhor texto, generalizo eu. O melhor texto, em reportagem, ensaio ou narrativa ficcional (e acho que também em poesia), repele as ideias gerais e arde pelo específico. 

Pode ser que nas ciências humanas e na filosofia a coisa seja diversa. Nelas, o texto lida com generalidades e generalizações, tipos ideais e ideias abstratas. O leitor desses textos vive bem nessa toada platônica, movida a ideias gerais. Pode ser.

Mas o bom texto não fala de 600 mil mortos numa pandemia, porque sabe que nenhuma pessoa saudável consegue sentir intimamente a dor de 600 mil. Fala de uma morte destacada, de uma dor particular, de alguma experiência humana singular e intransferível, que de fato oferece ao leitor a chave da porta de entrada no mistério da imaginação. 

Um caso concreto: leia a entrevista dessa grande figura que é Charles Martin. Jornalista, depois professor de literatura, fotógrafo e cidadão do mundo, o estadunidense Martin é um dos mais antigos leitores de Úrsula, o enigmático e desafiador romance da maranhense Maria Firmina dos Reis. 

Publicado em 1859, quando Machado de Assis era ainda um guri de vinte anos e não sabia para que lado se virava, Firmina ofereceu ao mundo uma narrativa que em seus mais significativos momentos busca o específico – o leitor encontra ali, por exemplo, a memória de uma escravizada sobre o mundo africano originário, sobre o navio tumbeiro em que atravessou o oceano, sobre a dor da perda da autonomia.  

Nosso entrevistado estudou o português e conheceu este momento único na paisagem literária brasileira ainda nos anos 1980. Sua trajetória pessoal também se organiza pela busca do específico – o da cor da pele, o da trajetória social, o da história pessoal. Suas respostas ajudam a pensar muitos dos mistérios de nosso tempo.

O ensaio de fotos também é de Charles Martin. São imagens sacadas em Paris e não correspondem a nenhum clichê, nem se rendem ao traço documental elementar. A apresentação do Ângelo Chemello Pereira ajuda a penetrar nesse mistério, também ele aberto ao singular e único.

Começamos neste número a publicar uma série concebida por Edgar Vasques e este escriba, unindo traço e texto para celebrar “Os Locais” de Porto Alegre. Pessoas locais e lugares daqui – marcas desta cidade que se encaminha para celebrar seus 250 anos de vida organizada como cidade ocidental.

Arnoldo Doberstein avança para outra fase da capital gaúcha, com os solares. Arthur de Faria por sua parte avança na história dos conjuntos melódicos nascidos aqui, agora com Breno Sauer. 

Na nova rodada de passeios pelos nomes de prédios da cidade, Fernando Seffner examina agora aqueles com nomes ligados ao passado farroupilha, com suas áreas anexas. Jandiro Koch habilmente passeia pelos preconceitos de leitura, em surpreendente resenha de um best-seller. Na coleção de depoimentos de tradutores, é a vez de Julia da Rosa Simões contar de sua visão da profissão. E Lelei Teixeira nos conta de um livro novo, obra de Enéas de Sousa, um crítico de cinema que vê filmes e pensa sobre eles desde os remotos anos 1960.

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