Juremir Machado da Silva

Anoitecer de carnaval

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Anoitecer de carnaval Foto: Freepik

Vai, Juremir, vai agora,
Vai cuidar da tua vida enquanto é hora,
Hora de pêssegos maduros e liturgias.
Não leva tão a sério esses óculos claros,
Que te protegem da chuva e da lua,
Por certo já cuidaste das contas,
Exceto provavelmente das de vidro,
Que carregas nos bolsos da alma.

Cuidado com esse ritmo triste,
Que as palavras tomam por conta,
Quando se libertam de tua mente.
Deixa correr a alegria que se esconde
Quando gritas gols de antigamente.

Quantas vezes te embriagaste de sono
Esperando a noite te tirar para dançar,
Até o sol aparecer como um menino
Brincando de cabra cega com a manhã?

Alguém já te viu pulando sapata
Com teus pés brancos descalços
Na grama rala daquela praça,
Onde esperavas Ana passar!

Na tua rica biblioteca de impressos,
Entre clássicos de tantas línguas
Guardas lindas bolinhas de gude
Que não sabes como traduzir.

Vai, Juremir, vai tomar algum rumo,
Tu que quando ainda eras aluno,
Sempre marchavas de passo errado,
Seguindo as batidas do coração.

Faz as contas das tormentas,
Esquece aquele cálculo renal,
Olha a beleza azul da enseada,
A vida te chama para o carnaval.

Não será preciso te lembrares
Que também nas marchinhas,
Pulavas de passo errado,
Guri atrapalhado, coração alado.

Houve o tempo de arrombar portas,
Longos verões de muitos arroubos,
Depois veio a época das frestas,
Brisa de primavera meses a fio.

Então a vida deu o grande salto,
O tempo passou, a arte sorriu,
Surgiu aquela dor no joelho,
Um homem estranho no espelho,
A máquina comeu o imaginário.

Nem tudo, porém, esmoreceu,
Não, nada de folhas amareladas,
Nem de moedas pelo chão,
O ouro dos tolos feneceu,
Restou a palavra parida.

Ah, essas tardes de verão
Esses dias queimando a pele,
A gente pensa que nasceu de novo.
Vai ao bar e pede uma bem gelada.

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