Juremir Machado da Silva

Babel na Academia Brasileira de Letras

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Babel na Academia Brasileira de Letras Gilberto Schwartsmann e esposa com Celso Lafer na ABL | Foto: Luis Gomes

Como não admirar aqueles que amam a cultura: quadros, músicas, peças de teatro, livros, arquivos? No Rio Grande do Sul, três médicos escritores fazem dessa paixão um compromisso cotidiano com a arte: Nilson May, Gilberto Schwartsmann e Alcides Stumpf. May e Stumpf criaram a Casa da Memória Unimed Federação/RS (Santa Teresinha, 263), um espaço de exposição e de palestras moderno e pulsante, onde está disponível ao público o acervo de cartas de brasileiros comuns ou importantes trocadas com João Goulart, quando ele era presidente do Brasil, e guardadas por 50 anos por seu zeloso assistente de gabinete, o gaúcho Wamba Guimarães. Gilberto Schwartsmann preside atualmente a OSPA. Antes, presidiu a Associação dos Amigos do Theatro São Pedro e também da Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul (BPE-RS), esta última função agora a cargo de Alcides Stumpf.

Depois de ter festejado Dante em versos, de ter participado com obras da sua coleção particular em exposições na Casa da Memória sobre os cem anos da Semana de Arte Moderna e de ter instalado Marcel Proust na BPE-RS, Gilberto Schwartsmann levou para a Academia Nacional de Medicina, no Rio de Janeiro, 300 livros da sua extraordinária biblioteca pessoal, que é feita de edições raras de clássicos, o que vai de Cervantes a Machado de Assis e muitos outros não menos importantes. A exposição é tão fantástica que foi, a convite, transferida para a Academia Brasileira de Letras, onde foi inaugurada, neste 31 de outubro, com a casa cheia, em presença de vários imortais, inclusive o presidente da casa, Merval Pereira, e Fernanda Montenegro, Ruy Castro, Domício Proença Filho, Carlos Nejar…

Com o espírito leve, a gente se pergunta: que homens são esses? Vendo imagens da abertura de “Babel (in)finita”, a mostra do acervo de Gilberto Schwrtsmann na ABL, uma homenagem ao grande argentino Borges, autor do maravilhoso conto sobre a biblioteca de babel, é impossível não exclamar: que bela paixão! Uma vida colecionando obras de rara beleza. Gilberto conta que, numa das suas primeiras viagens à Europa, ainda jovem, recém-casado com Leonor, encantou-se com edições raras numa livraria e não hesitou: gastou o dinheiro da viagem na aquisição dos livros. Voltaram mais cedo para casa.

O casamento dura até hoje.

Gilberto tem publicado livros com traduções em espanhol e em francês. O mais recente, de contos, Dibuk (Sulina), retoma a tradição das histórias de família, com o indefectível humor judaico.

O Jornal Hoje, da Rede Globo, fez bela matéria sobre a exposição de Gilberto Schwartsmann na Academia Brasileira de Letras.

Dibuk (trecho)

“Quando avisaram que o rabino Aron tinha falecido subitamente, todos ficaram chocados, mas também surpresos. O rabino parecia esbanjar saúde e energia. Gritava com todos quando queria dar ênfase a seus ensinamentos e à sua indignação com as injustiças da vida. Como o seu corpo foi encontrado no apartamento que havia nos fundos da sinagoga, onde ele raramente dormia, as pessoas começaram a desconfiar. Houve até um comentário que soou como surpresa durante as rezas do Shabat. Um dos seus amigos havia levado pessoalmente o rabino Aron para realizar exames no hospital. E não fazia mais do que três semanas. Segundo o médico que o atendeu na consulta, os exames estavam todos perfeitos, o colesterol, a glicose e até os preventivos da próstata e do intestino. Fizeram eletrocardiograma e um exame de esforço e o rabino estava perfeito, “melhor do que eu”, teria lhe dito o médico, durante a consulta.

O seu corpo foi enterrado no domingo pela manhã. Uma senhora mais velha contou que o rabino e a mulher brigavam muito. Era por essa razão que eles quase não moravam no mesmo apartamento. Ela havia se mudado com os quatro filhos para a casa de uma senhora viúva, que era muito religiosa e seguia a dieta kosher com muito rigor. Disse outro senhor, muito discretamente, que o rabino exagerava no vinho, durante o jantar da sexta-feira, no Shabat. Ele mesmo já havia visto o rabino beber sozinho mais de uma garrafa de vinho tinto. “Mas daí a dizer que o rabino era viciado em álcool, era outra coisa!”, defendeu-o outro senhor, que frequentava sempre os serviços religiosos.”

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