Juremir Machado da Silva

Brasil não é mais presidencialista?

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Brasil não é mais presidencialista? "O parlamento cada vez manda mais em matéria de orçamento" | Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Sou a favor, obviamente, do maior equilíbrio possível entre os poderes da república. Um fiscaliza o outro e todos trabalham pelo bem da nação. Na Constituição Federal de 1988 o Brasil é presidencialista. O plebiscito realizado em 1993 confirmou a opção dos brasileiros pelo presidencialismo. No entanto, lendo os jornais, tenho a impressão de que a Constituição foi alterada e o Brasil passou a ser outra coisa, possivelmente algo que possa ser chamado de semipresidencialismo.

O parlamento cada vez manda mais em matéria de orçamento. Cria despesas e dá destino a elas independentemente do executivo. Houve um tempo em que as chamadas emendas parlamentares, pelas quais eleitos para o legislativo destinam verbas às suas bases, eram contestadas e pareciam prestes a ser extintas. O contrário é que aconteceu. Elas cresceram, tornaram-se impositivas, adotaram novas formas. Tem emenda de bancada, do relator do orçamento, individual. Na prática, o parlamento distribui dinheiro conforme os seus interesses. A época em que o governo usava a liberação das emendas para obter votos passou. Ou adotou nova cara. Na crise atual entre executivo e legislativo, a turma de Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, engordou as emendas em 6 bilhões. Lula vetou. O veto certamente será derrubado.

Tem o parlamento direito de aumentar o seu quinhão de verbas para pacotes de bondades dessa maneira? Nem o chamado “orçamento secreto”, aquele em que a emenda é distribuída sem a revelação do nome do benfeitor para não o comprometer, desapareceu completamente. Sofreu uma mutação. Um executivo sem controle vira ditadura. Um executivo totalmente dominado pelo parlamento vira parlamentarismo. Ou semipresidencialismo, que é um parlamentarismo envergonhado, dissimulado, disfarçado, na corda bomba, sendo e não sendo, ora!

Este texto está com ares de editorial, que é aquela parte do jornal que ninguém lê. É o editorial do colunista estupefato. O artigo 165 da Constituição Federal diz: “Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão: I – o plano plurianual; II – as diretrizes orçamentárias; III – os orçamentos anuais”. Como dizem que Tom Jobim dizia e eu vivo repetindo, o Brasil não é para amadores. Vai ver que a Constituição foi mudada e nem ficamos sabendo. Talvez tenha acontecido durante o recesso, nalguma sessão virtual, tão virtual a ponto de nem ter sido realizada. De repente, não mais do que de repente, o orçamento é determinado pela Câmara dos Deputados no interesse dos deputados. Se o governo, que propôs a desoneração da folha de pagamento, decide que essa ideia já caducou, o parlamento faz o contrário. Imaginava-se que o legislativo pudesse aprovar ou não propostas desse tipo, ou emendá-las. Fica-se sabendo outra coisa.

O parlamento pode impor ao governo o que ele não propôs na matéria. É melhor para o Brasil que o parlamento tenha mais poder? Como não somos para amadores, a questão não se resolve pelo raciocínio abstrato e universal, mas pelo casuístico e particular: é melhor ser governado por Lula ou por Lira, por todos ou pelo Centrão? Resposta nos próximos meses. O pau vai comer para saber quem canta de galo.

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