Juremir Machado da Silva

Feira do Livro de Porto Alegre ontem e hoje

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Feira do Livro de Porto Alegre ontem e hoje Com Michel Houellebecq, Claudia, uma amiga e o poeta Luiz de Miranda na Feira

Dizer que estive na Feira do Livro de Porto Alegre um dia, quando havia um grande bar improvisado no meio da praça, com Edgar Morin, Jean Baudrillard e Michel Maffesoli. Jean pedia uma caipirinha atrás da outra. Michel, ostentando sua indefectível gravata borboleta, não deixava por menos. Havia gente por todo lado. E houve a Feira do Livro com Michel Houellebecq. Nas minhas lembranças da Feira do Livro há sempre tanta gente quanto livros. Falava-se de pós-modernidade, de Borges e de Proust. Digeria-se lentamente um churrasco interminável. A vida era pura fruição.

Papo sério com MH

Dizer que um dia encontrei na Feira do Livro de Porto Alegre, já com andar lento, o “cavaleiro da esperança”, Luís Carlos Prestes. Havia polêmica no ar: proibir ou não a venda dos livros de S.E. Castan, que negavam o holocausto. Para minha surpresa de jovem repórter, o velho comunista disse que só a crítica constante surtiria efeito. Era um dia de semana, fazia calor, eu trabalhava na Zero Hora, estava encantado em ver Prestes, só faltava tocar nele para ter certeza de que era de carne e osso. Não era, porém, a primeira vez que o via. Anos antes, na Famecos, ainda estudante, havia entrevistado o homem da coluna que atravessou o Brasil em 1924, ao lado de alguns colegas, entre os quais Rosane Marchetti, que seria depois um dos grandes nomes da televisão no Rio Grande do Sul.

Dizer que já estive na Feira do Livro de Porto Alegre quando era jovem, em dias de temporal, em tardes de primavera, em escaldantes verões antecipados, ao lado de escritores iniciantes, de monstros consagrados e de talentos nunca reconhecidos. Vi o passar das ilusões, o surgimento de promessas, o desfile dos ressentidos, a alegria dos primeiros autógrafos, a tristeza do que ficou sozinho no lançamento da sua obra-prima, as filas espiralando-se entre as barracas, a noite caindo sobre a cidade dos livros, a vida passando.

Dizer que estive na praça com meu primeiro livro, certo de que ganharia o Nobel. Voltei, depois, com tantos que perdi a conta, ora convencido do meu sucesso, ora combalido pelos combates perdidos, sempre movido pela mesma força: a impossibilidade de não escrever. Os anos me deixam a cada livro um pouco menos ingênuo, renovadamente o mesmo, perpassado por ilusões que nunca se perdem, aplaudido por leitores ideais que me sussurram generosos: continua, continua… Às vezes, um deles, por distração, ainda repete um estímulo controverso:

– Agora, sim…

Dizer que me assustei com o tamanho da Feira, que temi nunca ser aceito por ela, que me envergonhei diante dos primeiros grandes que encontrei, que tremi quando estendi a mão para Mario Quintana, que a apertou molemente. Eu vi Ronaldinho Gaúcho sonhar em ser jogador, Felipão chegar ao Grêmio como treinador, Paulo Coelho começar a sua vertiginosa carreira de sucesso, o caixão de Airton Senna sair do necrotério em Bolonha, a Feira do Livro de Porto Alegre resistir ao tempo, às mutações tecnológicas, aos novos suportes, formatos, dispositivos e mentes. Eu estive lá. Ainda estou na Feira.


Imagens da 69ª Feira do Livro de Porto Alegre: Gilberto Schwartsmann, a imortal Ana Maria Machado e a editora Paula Taitelbaum. Gilberto afirmou se há brasileiro que merece o Nobel da literatura, essa pessoa é Ana Maria Machado. Ela gostou da ideia e considerou que o médico e escritor seria um excelente jurado.

Gilberto Schwartsmann, Ana Maria Machado e Paula Taitelbaum/fotos de Ana Rodrigues

Eduardo Bueno, o famoso Peninha, assumiu o lugar no palco quando Gilberto Schwartsmann precisou correu para o aeroporto. Durante a palestra, Ana Maria Machado falou dos anos 1970, quando ela e o marido foram vivem em Paris, escapando da ditadura brasileira, e ela passou a ser orientada no doutorado sobre Guimarães Rosa pelo grande Roland Barthes, no auge da fama, que, tempos depois, arranjou-lhe um estágio com o não menos grandioso Umberto Eco, na Itália.

A colega do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUCRS, Beatriz Dornelles, eu, a pós-doutoranda Larissa Fraga e a doutoranda em história Pâmela Chiorotti autografamos “Cem anos da revolução de 1923, história, mídia e cultura” (Sulina), organizado por mim e Alvaro Laranjeira. Ao nosso lado, a deputada Fernanda Melchionna (PSOL) recebeu uma fila quilométrica. O namorado dela, deputado Orlando Silva, passou também pela nossa fila e pelas nossas lentas.

Beatriz Dornelles, Juremir, Larissa e Pâmela

     

A chuva não conseguiu estragar a festa dos livros.

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