Juremir Machado da Silva

Ítala, a amante de Proust e o golpe

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Ítala, a amante de Proust e o golpe

Ri muito nos últimos dias em companhia da Cláudia, da minha mais nova mosca volante, que é de esquerda, a julgar pelo meu olho que ocupa e da sua agitação diante da imagem do Bolsonaro, e de muitas pessoas interessantes, inclusive a atriz caxiense Ítala Nandi, que se apresentou no Theatro São Pedro e esteve na inauguração do novo espaço da Casa da Memória, centro cultural da Unimed Federação-RS, que completou três anos e estreou a exposição “Diagnosis, reflexões sobre arte, medicina e saúde”.

Baita exposição.

Aliás, fazia tempo que eu não eu usava terno, o Theatro São Pedro, sob direção do meu amigo Antônio Hohlfeldt, vai passar por uma reforma supimpa, sem contar que o Multipalco está, enfim, avançando mesmo.

Mas por que eu ri tanto apesar de ter uma mosca no olho? Por me deparar com gente inteligente e sacadas deliciosas. Participei de uma conversa com o escritor Gilberto Schwartsmann sobre o seu livro “A amante de Proust”. Gilberto criou uma personagem voraz. Ela passa o rodo em toda a intelectualidade francesa. Chega a confundir os André: Gide ou Malraux. Artistas célebres de outras nacionalidades também não escapam.

Até Pablo Picasso não resistiu. Ele não resistia. Quando a moça bate à porta do seu ateliê, Picasso já a recebe com pinceladas fortes.

– A senhora deve ficar muito mais linda completamente nua.

Ela se pelou. Que mulher insaciável! Que tempos! Gilberto está no seu melhor momento como escritor: livre, leve, solto e cheio de bom humor.

Na festa da Casa da Memória, que está maravilhosa com o seu novo espaço multifuncional, na rua Santa Terezinha, à sombra de uma bela árvore, cujo nome ainda não descobri, e sua exposição com obras de 11 artistas provocativos, entre os quais Bebeto Alves, Paulo Favalli e Ricardo Giuliani, ouvi sacadas divertidas. O escritor e médico Nilson May, grande leitor de Franz Kafka e anfitrião do evento, cujo humor se expressa em suaves e precisas estocadas, elogiou no seu discurso o fato de que a brava Ítala Nandi não esconde os seus 80 anos vividos intensamente.

– Isso é por que ela está bem – disse.

Verdade. Como não rir de uma tirada dessas? Ítala está em forma. Rapidíssima na réplica. Perde o conhecido, mas não perde a piada nem a alegria de uma boa resposta. Eu me arrisco indo pelo mesmo caminho sem a mesma verve e com muito menos capital simbólico acumulado para gastar, além de não ter convicção de chegar aos oitenta. Fecho agora por 79 e seis meses. Gostei da Ítala. Já me sentia velho amigo dela depois de meio minuto. Um advogado muito gentil fez-lhe esta curiosa observação:

– Na época da “revolução” censuravam os textos de vocês.

– Que revolução, caralho. Aquilo foi um golpe, cacete.

Comprei mais um estoque de máscaras. Quero estar por toda parte, especialmente em lugares onde possa cruzar com a amante do Proust.

Opa! A Cláudia está sempre comigo.

A nova mosca volante também. Ela está comigo na foto de abertura desta crônica, em que apareço junto com Nilson May e esposa e a octogenária Ítala Nandi. A casa da Memória tem tudo para ser o mais ativo espaço cultural de Porto Alegre.

*

Luciano Alabarse está a toda:

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