Juremir Machado da Silva

Que tal um pouco de Chico Buarque?

Change Size Text
Que tal um pouco de Chico Buarque?

Como dizem as fãs, Chico é Chico! O cantor e compositor, dividindo palco com Mônica Salmaso, arrasou em Porto Alegre, no Araújo Vianna. Na sexta-feira à noite, quando fomos vê-lo, o público estava excitado. Casa cheia. Parecia a Esquina Democrática. Um entra e sai sem parar. Essa movimentação, para um show que teve momentos intimistas, atrapalhou um pouco o clima. Mas, depois da vitória de Lula sobre Jair Bolsonaro, quem poderia pedir que as pessoas ficassem nos seus lugares e contivessem a alegria?

Chico colocou na cabeça boné vermelho atirado no palco. Terminou a noite segurando, junto com Mônica, toalha com o rosto de Lula. Aí foi a apoteose. Não deixou de citar o mais ilustre dos presentes, o cronista Luis Fernando Verissimo. Nem de fazer uma referência elogiosa a Yamandu Costa. Deu o recado de alívio pela vitória de Lula em muitas das canções que escolheu para cantar, mas também em fala sobre as eleições. Foi de lavar a alma. Segundo ele, se Bolsonaro tivesse vencido nem haveria razão de estar ali, de fazer o show. Mais do que consagrado, Chico Buarque não precisa pedir favor a quem quer que seja, nem esconder o que sente, pensa ou defende. Quando Lula estava preso, ele foi visitá-lo. É nessas ocasiões que se sabe com quem se pode contar. Nenhuma razão comercial o silencia.

Um dos momentos mais intensos da noite foi quando Chico e Mônica cantaram juntos “Maninha”, que tem estes versos pra lá de famosos:

Se lembra do jardim?
Oh maninha, coberto de flor
Pois hoje só dá erva daninha
No chão que ele pisou.

Parecia um chute na canela do capitão. A erva daninha, contudo, já foi podada. As eleições venceram o medo e a última estrofe dessa linda música diz o que todo mundo interpretou como uma maravilhosa ironia:

Mas não me deixe assim
Tão sozinha a me torturar
Que um dia ele vai embora
Maninha, pra nunca mais voltar

Nestes tempos bicudos, em que sertanejos estão por toda parte, especialmente na televisão e na política, ouvir Chico Buarque ao vivo é como tomar uma injeção de esperança, sofisticação e poesia. Ao final, ao longo da Osvaldo Aranha, só se ouvia uma expressão, acompanhada ou não de suspiros:

­– Chico é Chico!

Mais do que nunca.

*

Observação rabugenta: a concessionária do Araújo Vianna, em contrapartida pelo uso de um equipamento poderoso e lucrativo em cima da Redenção, poderia oferecer poltronas decentes. Aquelas cadeirinhas duras rente ao chão são um insulto ao corpo de qualquer um, especialmente dos sexagenários como eu. Penso nisso cada vez que vejo um show no Araújo. Talvez seja por isso que as pessoas não ficam muito tempo sentadas.

RELACIONADAS

Esqueceu sua senha?

ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.
ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.