Reportagem

Água da chuva represada em vala coloca recicladores sob risco de contaminação

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Água da chuva represada em vala coloca recicladores sob risco de contaminação Fórum de Catadores/as de Unidades de Triagem de Porto Alegre define a situação como de “convívio insalubre”. Foto: Josué Moreira/Arquivo pessoal

Água ficou retida em vala por causa das obras de ampliação da avenida Severo Dullius, em Porto Alegre. Situação levou ao alagamento do galpão de unidade de triagem e torna local insalubre

As chuvas fizeram recicladores da zona norte de Porto Alegre perderem o material que coletaram e ainda os deixou sob risco de contaminação. O problema mais grave ocorre no galpão gerido pela Cooperativa Mãos Unidas, construído onde anteriormente havia um lixão. As obras de elevação e ampliação da Avenida Severo Dullius, no local, deram origem a uma vala na lateral da pista que alagou por causa da cheia. Como o lixão não foi devidamente descontaminado, os resíduos agora subiram à superfície da vala.

“Estou me mobilizando para alugar uma bomba e começar a remover essa água. Neste caos, não conseguimos salvar nada dos resíduos. O que está espalhado na água é a produção de uma semana de trabalho. Do nada, o local começou a encher, espalhou-se tudo”, relatou o coordenador da unidade de tratamento, Josué da Roza Moreira.

Na noite de terça-feira (26), o Fórum de Catadores de Unidades de Triagem de Porto Alegre enviou um ofício ao Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) solicitando providências. O documento define a situação como “convívio insalubre” e aponta a responsabilidade ao Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), à Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura (SMOI) e à Divisão de Conservação de Vias Urbanas. Também solicitam uma máquina para bombear a água poluída pelo chorume – a cooperativa diz não ter recursos para o aluguel de um equipamento para este serviço. “Beira aí o cúmulo do descaso da gestão municipal, em situação não gerada ou provocada pela UT”, diz o documento.

“A gente não consegue juntar o lixo com as mãos. Estou pedindo ajuda para o bombeamento e para a limpeza. O mínimo que esperávamos era um auxílio do DMLU, alguma ação, mas nada, até agora. A gente entende que a cidade está caótica. A avenida Sertório estava alagada ontem, mas hoje não está mais. Aqui, por outro lado, vai continuar debaixo d’água porque não tem para onde escoar”, disse o coordenador da unidade à Matinal. Moreira afirma que, quando o pavimento das avenidas foi feito, foi colocada uma argila que não permite a infiltração e vazão das chuvas.

Por causa do problema, os 15 trabalhadores não conseguem voltar ao trabalho. “Já estamos no segundo dia sem receber cargas, o caminhão não entra aqui para comercializar o material, resultando em perda da renda para além dos riscos à saúde que esta água traz”, relatou, nesta quarta-feira (27). 

Para a secretária do Fórum, Simone Pinheiro, os espaços de tratamento de resíduos recicláveis em Porto Alegre não tiveram manutenção de infraestrutura desde que foram construídos. Com as chuvas das últimas semanas, várias unidades tiveram problemas com alagamentos que inviabilizaram o trabalho. A pior situação, hoje, seria do Aterro Zona Norte, onde se formou a vala. Mesmo antes da ampliação da avenida Severo Dullius, a região já era alagadiça – “um banhado”, conforme definiu Simone.

Até os anos 1980 havia um lixão no local, onde eram depositados os resíduos recolhidos no norte da capital, no qual centenas de pessoas buscavam sustento. O depósito começou a ser extinto em 1990, com encerramento total em 1998. “Ao longo desses 25 anos, nada foi feito para a reestruturação do espaço”, argumenta Simone. O galpão que armazenava ferramentas, equipamentos e máquinas do antigo é utilizado atualmente como unidade de triagem. 

“Há muita contaminação nesse terreno. Com a chuva, não é só água que se acumula. Sobe o chorume e se torna um ambiente totalmente insalubre. As pessoas não podem trabalhar ali. Para drenar, o custo é elevado, e o poder público não atende aos pedidos”, diz Simone. 

O coordenador da unidade afirma que o DMLU já havia definido um local para a realocação do local de trabalho, mas o plano não sai do papel. Com a obra das avenidas, a mudança se tornou ainda mais urgente – o local seria do outro lado da avenida Sérgio Dietrich, onde hoje fica o galpão. “A gente precisa dessa remoção. Hoje, não podemos contar com investimentos de parcerias privadas, pois o nosso termo de cessão de uso é precário. Precisamos, no mínimo, de um contrato de dez anos, e o departamento não faz, pois o terreno é privado, cedido para o uso do DMLU”, argumenta. 

A Matinal entrou em contato com o DMLU nesta quarta-feira. O departamento informou tratar-se de uma competência da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social. A pasta, por sua vez, diz que acompanha a situação da unidade de triagem da zona norte, e trabalha em parceria com outras secretarias para visitar o local, identificar o problema mais imediato e resolvê-lo. Mas não deu uma data em que ocorreria esta visita e/ou as providências. Em paralelo, informou que vai propor, via decreto, a reforma dos espaços prejudicados pela chuva na cidade. 


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