Melo restringe acesso de parlamentares a escolas e oposição reage
Atos ficam condicionados a autorização da Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre. Oposição ingressa com ação na Câmara e diz que decreto fere autonomia da comunidade escolar
O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), decretou, na terça-feira (11), a restrição “de parlamentares, candidatos, movimentos de juventude ligados a partidos políticos e demais entidades nas dependências das escolas da rede municipal com a finalidade de ministrar aulas ou proferir palestras”. A participação fica condicionada a análise e autorização da Secretaria Municipal de Educação (Smed). No mesmo dia, vereadores da oposição já articularam uma ação para derrubar o decreto alegando que a medida fere a autonomia da comunidade escolar.
Na minuta, os parlamentares sustentam que a “restrição da presença da juventude de movimentos que discutem política (…) traduz violação ao direito assegurado aos estudantes de terem ferramentas necessárias à reflexão sobre a auto organização”. Em relação aos efeitos práticos, os vereadores temem que a interferência da Smed vá “estabelecer um filtro direcionador para que somente sejam realizadas ações educacionais com as quais o governo de turno concorde”.
“Esse decreto é uma demonstração do autoritarismo do governo, pois retira autonomia pedagógica das escolas e fere indiretamente o direito à filiação democrática em partidos políticos e movimentos sociais”, diz a vereadora Karen Santos (PSOL).
Na esteira do ataque fatal a uma creche em Santa Catarina e o pânico instaurado nas escolas, a Smed argumenta que o conjunto de medidas busca “fortalecer a segurança na rede municipal de ensino” e “estabelecer ainda mais controle no acesso de pessoas” que não integram a comunidade escolar. “Não há proibição e, sim, regra para que haja alinhamento das diretrizes pedagógicas e se restrinjam iniciativas ideológicas de qualquer natureza política. O objetivo é que as escolas sejam ambientes de respeito à pluralidade, à diversidade cultural e à liberdade de ideias”, diz a pasta, em nota enviada à redação.
Medida é insuficiente contra insegurança
A justificativa, para a vereadora, é insuficiente. De acordo com Karen Santos, os problemas de segurança e os atentados terroristas precisam ser enfrentados com mais preparo da comunidade escolar, como o trabalho de psicólogos e assistentes com alunos, ações que, segundo ela, não são cumpridas a contento pelo município.
Para o Sindicato dos Municipários (Simpa), a decisão condiz com outras medidas da prefeitura que a diretora-geral, Cindi Sandri, chama de “cerceamento do acesso a espaços públicos”. Ela pontua que não é possível manter as portas das escolas abertas para livre acesso, mas que tampouco restringir o acesso de movimentos da juventude irá colaborar para evitar eventos violentos como o massacre recente em Blumenau. “Ele acha que apertando um botão que vai constranger uma situação”, comenta, em referência à adoção do um “botão de pânico” nas escolas municipais. “A violência não é atual, é antiga. Mas agora tem um caráter diferente, que é a onda de violência por pessoas com as características que a gente conhece, com componentes racistas e fascistas nas suas ações”, completa.
Sandri acredita que o critério utilizado no decreto coloca em conflito a liberdade da condução do projeto político-pedagógico de cada instituição. “Não há reconhecimento da gestão democrática”, acrescenta.
Já a vereadora Mari Pimentel (Novo) concorda com a decisão. Segundo ela, o decreto não afeta a prerrogativa constitucional de livre acesso dos vereadores aos órgãos da administração direta e indireta do município, mesmo sem prévio aviso, apenas vincula o ingresso com finalidade de ministrar aulas ou preferir palestras à análise e autorização da Secretaria de Educação. “Acho positivo. Tem que ter um crivo antes”, afirma.
Pimentel é uma das autoras da ementa aprovada no PLL 495/2021, que criou o Selo de Educação Antirracista Professora Doutora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva. A distinção será concedida a escolas que contribuam com ações em defesa do antirracismo. O texto da ementa determinou que as atividades, “sobretudo o tema das palestras e a indicação dos palestrantes”, sejam aprovadas pela Smed.
Para Fabiane Pavani, ex-presidenta do Conselho Municipal de Educação, entretanto, o decreto é ilegal, pois cabe às escolas decidirem o que é trabalhado em sala de aula. “A escola não deve estar encastelada em si mesma, deve estar aberta para a comunidade: movimento negro, comunitário, antissexista, fórum de inclusão. Quem deve dizer o que a escola vai ensinar é a própria escola. É liberdade de cátedra, é gestão democrática”, defende.