Reportagem

Sob críticas, Prefeitura admite rever termos de concessão da Redenção

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Sob críticas, Prefeitura admite rever termos de concessão da Redenção Foto: Jefferson Bernardes / PMPA

Apesar de Executivo garantir “diálogo”, urbanistas reclamam de formato da consulta pública

A Prefeitura de Porto Alegre admite rever os termos do projeto de concessão do Parque Farroupilha (Redenção) para a iniciativa privada a partir de sugestões recebidas em consulta pública, que está aberta até o dia 24 de novembro. O projeto ainda será discutido na Câmara Municipal em duas audiências públicas, marcadas para 17 e 18 de novembro. Além da Redenção, a proposta também prevê conceder o Parque Marinha do Brasil, o trecho 3 da orla do Guaíba e o Calçadão do Lami.

Em entrevista para o Matinal nesta quarta-feira, a secretária Municipal de Parcerias, Ana Pellini, reconheceu que um laudo pericial apontou dificuldades para a construção de um estacionamento subterrâneo de 577 vagas abaixo da pista atlética do estádio Ramiro Souto, área considerada alagadiça: “O estacionamento é um projeto antigo, mas apenas referencial. Colocamos como ponto obrigatório, mas estamos recebendo muitas sugestões para que tornemos opcional. Vamos estudar, porque as sugestões são boas. Temos que ouvir”, disse a secretária.

O núcleo gaúcho do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RS) entende que o projeto é caro e anacrônico, pois incentivaria o uso de automóveis em uma área central verde e de lazer: “A proposta é ultrapassada e vai na contramão da sustentabilidade urbana. A documentação menciona estacionamentos, no plural, sem dar delimitações nem proporções de área máxima. Já os bicicletários aparecem como opcionais, passíveis de escolha pela concessionária”, observou Nathália Danezi, vice-presidente do IAB-RS. Pellini negou a ideia de centralidade dos automóveis na proposta e preferiu destacar a integração dos meios de transporte. 

O IAB-RS promoveu no último sábado uma roda de conversa sobre o projeto. A entidade alerta que a proposta coloca como opcionais a execução de novos sanitários públicos, a ampliação do parque de diversões, a instalação de piso emborrachado nos playgrounds e a restauração dos recantos do parque.

“Não muda nada”, defende secretária

Apontando o Parque Harmonia e o trecho 1 da orla como experiências bem sucedidas e que não comprometeram o caráter público do espaço, a secretária municipal de Parcerias, Ana Pellini, afirmou que a concessão nada muda para o usuário: “Não faz diferença, o que importa é que o acesso seja livre, que não tenha cercamento, que não se cerceiem manifestações políticas”, explicou. “Vamos supor que o concessionário seja ruim – o poder público multa, dispensa e contrata outro. Não é venda, entrega ou privatização. O concessionário é apenas contratado pelo poder público para administrar, como um prédio que contrata um síndico”, acrescentou.

Mas um dos pontos que causa estranheza aos urbanistas é justamente que um parque como a Redenção já seja intensamente frequentado: “A primeira questão é que a Redenção é um espaço simbólico, tombado como patrimônio histórico, natural e paisagístico. Não é abandonado – é vivo, tem perfis diversos de usuários e atividades”, lembrou Nathália Danezi, vice-presidente do IAB-RS.

Para ela, a linguagem do projeto deixa brechas para um processo de gentrificação dos parques: “O documento prevê explicitamente que os parques devem ter acesso 24h e sem cercamento. Acontece que a minuta do contrato, embora proíba cobranças de ingressos, traz várias exceções para serviços e atividades previstas, como em casos de eventos esportivos e atividades que concorram diretamente com as atividades propostas pela concessionária, sem que saibamos quais áreas poderão ser cobradas e fechadas”, observou Danezi. 

De acordo com a secretária de Parcerias, o edital emprega uma linguagem “genérica” em um chamamento a sugestões da população: “Começou a crescer uma preocupação de que manifestações políticas não poderiam acontecer. Uma sugestão para isso é de obrigar a concessionária a não impedir manifestações democráticas, desde que não danifiquem o patrimônio. Fizemos um esqueleto bem genérico exatamente para acolher sugestões. Isso é ótimo porque dá uma sensação de pertencimento, todos se sentem donos do projeto”.

Para a vice-presidente do IAB-RS, porém, a consulta pública parece o “avesso da participação popular”: “Eles chegam com uma documentação pronta e induzem perguntas. O coletivo (Preserva Redenção) está com dificuldade de preencher documentos da consulta, pois não há espaço para dizermos que está tudo errado. A consulta abre margem para discussão em pontos específicos”.

Reação hostil à concessão pode prejudicar futuras parcerias

Em artigo no site Caos Planejado, assinado por André Sette e Guilherme Pereira, levantou a questão e exemplificou outros modelos de concessões de parques que deram certo. O texto cita que o modelo de concessão proposto garante o respaldo jurídico para não cercar o parque.

No entanto, coloca o risco ao comércio popular na Redenção e mesmo do excesso de vigilância. “Embora as regras da concessão prevejam um tratamento antidiscriminatório, não está claro como os vigilantes serão treinados nem os limites de sua atuação.”

Ao frisar que a Redenção não está à venda, o artigo destaca a responsabilidade que a Prefeitura precisa ter com a concessão: “Se a população se sentir prejudicada, pode haver uma reação hostil, o que tornaria difícil para a prefeitura realizar outras parcerias público-privadas no futuro”.

Abaixo-assinado contra o projeto soma mais de 16 mil assinaturas

Lançado há duas semanas, o abaixo-assinado do Coletivo Preserva Redenção já conta com mais de 16 mil assinaturas contra a concessão e reivindicando que o parque “continue sendo um espaço público de acesso universal”. Por sua vez, a Prefeitura assegurou que, durante os 20 a 30 anos de concessão, “seguirá fiscalizando a manutenção dos espaços e seguindo com as obrigações” e que “os parques Farroupilha e Marinha do Brasil nunca deixarão de ser públicos, abertos 24 horas e gratuitos. A Redenção é tombada e não pode ser vendida ou privatizada”.

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