Ensaio

Caneladas, jornais negros e gauchadas

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Caneladas, jornais negros e gauchadas
Até recentemente o futebol era reconhecido como o “ópio do povo” ou como uma expressão social de menor valor, mas o fato é que está profundamente enraizado em nossa história. O que nos dá condições para refletirmos sobre diversos aspectos de como, por meio do futebol, foram construídas relações étnico-raciais, políticas e econômicas diferenciadas em solo gaúcho. É um pouco disso que vamos tratar no texto que segue, dando caneladas em alguns e apresentando o futebol e a imprensa negra aos demais. Falar da participação da população negra na história do futebol brasileiro muitas vezes nos leva a tratar dos pioneiros e das dificuldades que clubes e jogadores negros tiveram para se inserir nas ligas e associações das elites. Ressaltamos figuras como a de Jorge Araújo Miguel do Carmo (1885-1932), considerado o “primeiro jogador negro num clube”, a Ponte Preta, de Campinas que, em 1900, aos 15 anos, ajudou a fundar. Assim como o conhecido, Francisco Carregal (1884-1949), no Bangu, em 1905, tido como o “primeiro jogador negro a atuar em um clube no Rio de Janeiro”, onde morava e trabalhava na fábrica de tecidos do subúrbio. Muito pouco é divulgado sobre as trajetórias educacionais destes personagens e menos ainda parece interessar as redes profissionais e familiares que contribuíram para que deixassem marcas indeléveis na história. Miguel do Carmo, p. ex., foi fiscal de linha de trem da Companhia Paulista de Estradas de Ferro por quase toda a vida, e, Carregal, chegou a mestre geral, um dos mais altos cargos da Companhia Progresso Industrial do Brasil, onde iniciou aos dez anos como aprendiz de teares. Ambos, foram filhos, pais e maridos, estudaram e deixaram registros de diversos outros vínculos sociais. Ou seja, o que foi recortado de suas histórias foram os aspectos mais pitorescos ligados ao mundo do futebol, não aqueles que ocuparam a maior parte do tempo e da dedicação de suas vidas. Ainda que hoje seja relevante destacar os pioneiros, naquela época em que o futebol começava a se espraiar entre as classes trabalhadoras, os jogadores negros não obtiveram o reconhecimento e a ascensão social desejadas apenas por meio do futebol. Foi a disciplina e a dedicação ao trabalho, principalmente, assim como a construção de redes de sociabilidades entre os seus pares que deram condições de se tornarem esportistas. O que nos leva a refletir sobre a necessidade que temos, não apenas os historiadores, mas toda sociedade, de encontrar um “mito de origem” para todas as expressões de nossa brasilidade.  Os ecos da “democracia racial”, que negam o racismo e criam uma nação onde vicejaria a igualdade e o respeito, reverberaram também na história do futebol. Foi desenvolvida a tese, que confirmaria a origem da capacidade para o drible e o improviso do jogador brasileiro, sobre os ombros dos tipos físicos e da cultura atlética que chegaram com os escravizados e seus descendentes. Os negros passaram a ter lugar nesta história, destacados pela força e pela habilidade física no jogo de bola, mantendo óbices do reconhecimento da inteligência […]

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