Dois monumentos literários: o livro de Vargas Llosa sobre Borges (Parte 1)
Alguns monumentos estão caindo, até onde alcança minha compreensão de não especialista, por motivos justificáveis. Disputas pela memória são parte da história, cada presente tem o direito de rever suas homenagens e, mais importante, rever se lhe interessa um tipo de monumentalização que heroiciza enquanto achata, esconde os conflitos. Obviamente, há forças em tensão em cada presente, diferentes setores da sociedade civil organizada podem ter visões antagônicas sobre o que é monumentalizável, e o poder e prestígio desigual entre esses setores se manifesta na esfera pública.
Grupos historicamente poderosos e prestigiados podem naturalizar a permanência de certas homenagens, minimizando a violência incrustrada nelas, sob a alegação de manter vivo o passado. Versões menos arrogantes, embora também conformistas, podem defender a manutenção reconhecendo a violência, mas justificando-a como procedimento de época, como se cada época tivesse apenas um procedimento. Walter Benjamin em 1940 já alertava que a variante histórica que triunfou não era a única possível[1].
Grupos historicamente alijados dos espaços de poder e prestígio podem recorrer a métodos pretensamente radicais para se fazerem ouvir, ou porque se cansaram dos métodos instituídos, ou porque não os reconhecem como seus. Sujeitos mais cordiais podem tentar disputar o método por dentro das instituições e pacientemente trabalhar por alguma transformação. E como a história tem muito mais de dois lados, essas tensões podem se manifestar nos cruzamentos mais diversos, principalmente porque nossa relação com monumentos está também no plano do sensível, dos afetos, de nossa experiência com a cidade.
[Continua...]