Livre adaptação de Clarice Lispector (1920 – 1977), o filme O Livro dos Prazeres (2020) entra em cartaz nesta quinta-feira (22/9). Coprodução entre Brasil e Argentina, o sensível drama intimista dirigido por Marcela Lordy traz Simone Spoladore e Javier Drolas nos papéis principais conquistou prêmio de melhor atriz e menção honrosa em longa-metragem no 22º Bafici, na Argentina.
Quando resolveu adaptar o romance Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, a roteirista e diretora Lordy estava diante do enorme desafio de transpor a prosa da escritora para a tela. “O livro mostra que ainda é preciso criar espaços de poder para as mulheres e que esse espaço começa dentro da gente. Além disso, ele nos convida a repensar a forma como descartamos nossas relações afetivas”, explica a realizadora do documentário Ouvir o Rio (2013), sobre a obra do artista visual Cildo Meireles.
Simone Spoladore – que já havia trabalhado com Marcela Lordy no telefilme A Musa Impassível (2011) – interpreta Lóri, uma professora de ensino fundamental interiorana recém chegada ao Rio de Janeiro com dificuldade em relacionar-se afetivamente. Ocupando o apartamento em frente ao mar da mãe morta há pouco, a protagonista divide-se entre o trabalho na escola, as angústias existenciais e eventuais encontros sexuais furtivos à noite – até conhecer Ulisses (Javier Drolas, do filme Medianeras: Buenos Aires da Era do Amor Virtual), um professor de filosofia argentino com quem viverá um relacionamento intenso.
Lordy destaca a atualidade do romance de Lispector, publicado há mais de 50 anos: “A Clarice coloca a mulher no centro da narrativa, algo raro no país tanto na literatura quanto no cinema da época. O lugar secundário destinado às mulheres já não nos serve mais, estamos ganhando força graças a autoras que contaram com a Clarice abrindo portas. Ela é uma referência fundamental na nossa formação”.
Algumas adaptações foram necessárias a fim de trazer a trama de O Livro dos Prazeres para o presente, sem perder o espírito da obra original. “As questões abordadas por ela sobre a posição feminina dentro e fora da gente numa sociedade patriarcal seguem mais fortes do que nunca. Nesse aspecto, a condição da mulher pouco mudou. No entanto, foi preciso amenizar o lado careta do Ulisses e a submissão excessiva da Lóri, que não cabiam mais nos dias de hoje. Deixamos os dois personagens mais livres em relação ao corpo e à própria sexualidade”, esclarece a diretora.
Lordy – que assina o roteiro de O Livro dos Prazeres com Josefina Trotta – explica que, para adaptar a narrativa introspectiva da autora de Perto do Coração Selvagem e A Hora da Estrela foi preciso criar novas ações e situações: “Nos inspiramos na obra dela como um todo e na nossa própria história. Fugimos da voz em off, que seria o caminho mais óbvio, para irmos em direção à ação e a exploração dos sentidos, na construção minuciosa de uma dramaturgia cinematográfica singular. O texto foi outro ponto crucial. Atualizamos tudo, do vocabulário ao conteúdo, sem nos afastarmos da essência do livro”.
O próximo longa da realizadora Marcela Lordy, O Silêncio de Aline, vai contar a história de uma cientista surda, comunicativa e barulhenta, vizinha recente de uma musicista que precisa de silêncio para criar. O personagem que dá nome ao filme será interpretado por Leandra Leal – atriz que faz uma participação em O Livro dos Prazeres.
O Livro dos Prazeres: * * * *
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