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“O Menino e a Garça” é o canto do cisne de Miyazaki

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“O Menino e a Garça” é o canto do cisne de Miyazaki Sato Company/Divulgação

Talvez o mais cultuado e premiado animador vivo, o japonês Hayao Miyazaki anuncia sua despedida do cinema com uma nova obra-prima. Indicado ao Oscar de Melhor Longa em Animação deste ano, O Menino e a Garça (2023) inspira-se na própria biografia do diretor e roteirista de 83 anos para contar alegoricamente a história da reconstrução familiar de um garoto depois da morte da mãe.

Em O Menino e a Garça, Mahito perde a mãe em um bombardeio a um hospital durante a II Guerra. O pai do garoto casa-se então com a irmã mais nova da falecida esposa, mudando-se com o filho para a casa da madrasta no campo.

Nesse novo lar, Mahito encontra uma garça cinzenta misteriosa que o conduz a uma torre antiga e isolada nas proximidades da propriedade. Quando a esposa do pai desaparece na floresta, o menino segue a ave até a construção abandonada, adentrando em um mundo fantástico partilhado por vivos e mortos – e onde viverá uma jornada de autodescoberta.

Sato Company/Divulgação

Entre os vários prêmios que já arrebatou, O Menino e a Garça foi escolhida a melhor animação no Globo de Ouro, no BAFTA e no New York Film Critics Circle Award. Apesar de se referir a um romance homônimo de 1937 do escritor Genzaburō Yoshino, o filme conta uma história original cheia referências à infância de Hayao Miyazaki: como no filme, o pai do realizador também trabalhava para uma empresa envolvida na fabricação de componentes para aviões de combate japoneses.

Ganhador do Oscar por A Viagem de Chihiro (2001), Miyazaki é uma lenda viva da animação mundial. Cofundador em 1985 do célebre Studio Ghibli, referência na indústria japonesa de desenhos, o cineasta escreveu e dirigiu títulos antológicos do cinema animado contemporâneo como Meu Amigo Totoro (1988), O Castelo Animado (2004), Ponyo – Uma Amizade que Veio do Mar (2008) e Vidas ao Vento (2013). A produção de O Menino e a Garça se iniciou em 2016 – na ocasião, Miyazaki havia anunciado sua aposentadoria, mas abandonou a ideia para desenvolver esse novo projeto, considerado o mais caro filme já produzido no Japão.

Como sempre nas histórias contadas pelo artista japonês, O Menino e a Garça desenrola-se seguindo uma lógica de sonhos, em que real, fantástico e imaginário misturam-se por vezes indistintamente na trajetória de jovens protagonistas enfrentando ritos de passagem não raro traumáticos e mesmo violentos. Outra característica nos títulos de Miyazaki são as referências culturais e religiosas nipônicas que podem parecer cifradas demais aos olhos ocidentais – mas que, curiosamente, jamais chegam a atrapalhar a compreensão das complexas tramas, mesmo entre os públicos infantis.

Sato Company/Divulgação

Nesse anunciado canto do cisne, Miyazaki conduz o espectador de novo por mundos maravilhosos em que o bem e as virtudes andam lado a lado – e às vezes no caráter do mesmo personagem – com aspectos sombrios e condenáveis da alma humana, em um equilíbrio existencial e metafísico. Provavelmente é essa capacidade de contar histórias sem diluí-las em maniqueísmos reconfortantes a responsável pelo misterioso encanto dessas narrativas desenhadas – que ultrapassam fronteiras, culturas e idades.

Ao acrescentar uma digital explicitamente autobiográfica em O Menino e a Garça que reporta à II Guerra, o veterano Miyazaki acena em sua despedida artística para as novas gerações, desafiadas a superar os erros dos antepassados a fim de forjar um futuro de maior compreensão e empatia.

Sato Company/Divulgação

O Menino e a Garça: * * * * *

COTAÇÕES

* * * * * ótimo     * * * * muito bom     * * * bom     * * regular     * ruim

Assista ao trailer de O Menino e a Garça:

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