Artigos | Marcelo Carneiro da Cunha | Série

“Sex Education” – The End

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“Sex Education” – The End Netflix/Divulgação

Tinha, mas acabou. E não tão bem como eu teria gostado, pra ser sincero, como sempre.

Sex Education, série disponível na Netflix, causou um enorme impacto pelo argumento, honestidade e ousadia da ideia e da realização. Em uma pequena cidade da Inglaterra menos glamorosa do que a Londres que vemos na maior parte do tempo, alunos de uma escola secundária começam a sentir, viver, sofrer e não entender tudo que o sexo traz para nossas vidas.

Para ajudar o pessoal a navegar por esses mares revoltos, surge o sensacional personagem do Otis, filho de uma sexóloga muito, mas muito aberta e direta na relação com o filho e o sexo. Otis, como todo filho de pais descolados, morre de vergonha da mãe, de si mesmo e de sexo. Ele é, afinal, inglês.

Mas ele descobre que, de um jeito ou de outro, aprendeu muito com a mãe. Ele, ao contrário dos colegas, sabe alguma coisa sobre o assunto sexo, ao menos na teoria. E, por sugestão da bela Maeve, garota que precisa se virar sozinha porque é pobre e filha de uma drogada, Otis se torna um conselheiro para assuntos sexuais da meninada da escola, cobrando pelo serviço em libras, que ele divide com Maeve, a agente.

Sex Education então desliza delicadamente, ao longo de três temporadas, pelos muitos casos de disfuncionalidade existencial, emocional e sexual que a vasta maioria das pessoas precisa dar conta para sobreviver e evoluir até a vida adulta. Alguns personagens são preciosos, como Adam, o bully que atormenta um garoto gay, Eric, apenas para descobrir que ele, Adam, tortura Eric por ele ser, de forma aberta e alegre, o que Adam é, e não pode admitir.

Ao longo de três temporadas Sex Education avançou por entre mentes, corações e corpos de garotos e garotas atormentados por si mesmos, e por algo que nos transforma em adultos, mas não sem nos enlouquecer antes. Eu sinceramente não entendo como a gente dá conta da adolescência e, realmente, suspeito que a gente não dá conta da adolescência, apenas finge, e arruma um emprego para virar adulto.

Mas porém, contudo e entretanto, na sua quarta e última temporada, Sex Education se transformou em tudo que a gente não quer de uma série de ficção: ela se tornou uma série de contos morais e pedagógicos, e a ficção funciona quando não é nada disso, ou é, mas sem parecer.

Os alunos de Moordale se mudaram para uma nova escola onde vão fazer os seus A levels, uma preparação para a universidade. Na nova escola, Cavendish College, um lugar insuportavelmente progressista – e eu sou totalmente a favor de tudo que é progressista neste mundo –, a norma é que toda e qualquer minoria vai ser representada e suas questões trazidas para o centro dos debates.

O que isso tem de errado? Nada. O problema é que Sex Education é pra ser uma série sobre a adolescência, e não um manual de como consertar o mundo em oito episódios. As intenções são as melhores, as causas também, mas, pra quem assiste, fica excessivo, pedagógico e não funciona como sex, mesmo que uma parte talvez funcione como education.

Com tantos temas e personagens que representam algum grupo, não sobra tempo nem espaço para os ótimos personagens se comportarem como ótimos personagens, e eles se transformam em tipo de uma novela da Globo, atuando por demanda do roteiro, dando falas que não convencem porque não houve construção delas, apenas falas. Quando uma personagem poderosa como Maeve diz para Otis “I love you” era para a casa cair. E, no entanto, nem ela parece acreditar no que está falando.

Mesmo com tudo isso, Sex Education se faz ver e vale a pena e o tempo que você dedicar a isso. Mas, e isso é um mas de bom tamanho, se perdeu a chance de fazer um belo encerramento para essa bela história, em vez de uma colagem de muitos temas, e quase nenhuma ficção de qualidade.

Eu acho que vale ver e eu vi. Mas é uma pena que eles não tenham tido mais coragem pra manter a série onde ela era imbatível, aceitando a linda maluquice do sexo como isso, uma maluquice da qual todos nós humanos dependemos para sermos o que somos, humanos.

Pena. Mas vejam, porque sim.

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