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Festival Internacional Sesc de Música é exemplo de resistência

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Festival Internacional Sesc de Música é exemplo de resistência

No Brasil, o simples fato de um projeto cultural manter-se vivo por uma década já é uma vitória. Seguir crescendo e enraizando-se cada vez mais na comunidade, então, é uma excepcionalidade admirável neste país tão ingrato com as iniciativas artísticas e culturais. Pois o Festival Internacional Sesc de Música chega aos 10 anos robusto e plenamente abraçado por Pelotas, cidade que sedia o evento desde seu surgimento. Realização do Sistema Fecomércio-RS/Sesc, um dos maiores festivais do gênero na América Latina sobreviveu às ameaças que rondavam sua continuidade desde o ano passado e chegou em 2020 promovendo a interação entre a música de concerto e a popular.

Até o dia 31 de janeiro, o 10º Festival Internacional Sesc de Música reúne 53 professores de 14 países e 400 estudantes de música, envolvidos em uma maratona de aulas e uma extensa programação cultural inteiramente gratuita. Iniciado na última segunda-feira (20/1), o encontro vai promover em 12 dias um total de 60 apresentações musicais. Além dos tradicionais concertos que acontecem à noite no Theatro Guarany, o projeto Festival na Comunidade leva a música de concerto para lugares como hospitais, asilos, praças, igrejas, a Praia do Laranjal e a Bibliotheca Pública Pelotense. Como já é tradição, a função popular começou na segunda às 18h em clima de festa com o animado Cortejo Musical formado por professores e alunos, que sai da frente do Mercado Central e desfila pelas ruas do centro da cidade tocando temas carnavalescos, seguido pelo público que dança e canta junto.

– É um festival para Pelotas, que já está consagrado no calendário local há 10 anos. Ao lado da Fenadoce, é o que traz mais visibilidade para a cidade. Promove cidadania, bem-estar e felicidade para as pessoas, além de trabalhar um objetivo técnico de contribuir para a formação musical, para o desenvolvimento de jovens talentos e para a economia local – afirma Sílvio Bento, gerente de Cultura do Sesc/RS, acrescentando com entusiasmo: – Os relatos que escuto dos participantes ao longo dos anos é que essa integração entre alunos e professores só acontece em Pelotas. Diferentemente de outros grandes festivais, aqui professores e alunos convivem fora da sala de aula, assistindo a espetáculos, fazendo refeições, em vários espaços da cidade. Os alunos ficam ansiosos para ver seus professores tocarem em recitais que proporcionam encontros inéditos de grandes músicos.

O corpo docente inclui músicos brasileiros e de países como Islândia, Uruguai, China, Itália, NovaZelândia, Alemanha, Argentina, Rússia, Noruega, Bielorrússia, França, Colômbia e Japão. O time de mestres conta com figuras de destaque como o alemão Christoph Hartmann, oboísta da Orquestra Filarmônica de Berlim, o trompetista francês Pierre Dutot, professor do Conservatoire National Supérieur de Musique em Lyon, e o violinista italiano Emmanuele Baldini, spalla da Osesp e participante do festival desde sua primeira edição. Já os alunos – que circulam alegremente pelas ruas, restaurantes e bares de Pelotas carregando seus instrumentos – são provenientes de 22 Estados brasileiros e de vários países da América Latina.

A presença ativa de jovens músicos, aliás, é uma das características mais admiráveis do Festival Sesc de Música. Nesta edição, estudantes vindos do Mato Grosso do Sul, Maranhão, Minas Gerais, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima e Sergipe, participantes de programa sociais – muitos deles em situação de vulnerabilidade social -, formarão a Orquestra Jovem Sesc, que vai se apresentar para a comunidade a partir desta quinta-feira (23/1). O concerto de abertura na segunda-feira à noite, no quase centenário Theatro Guarany, ficou a cargo da Orquestra Jovem Sesc Pará, formada por 72 integrantes, que executou em seu programa peças de Carlos Gomes, Tchaikovsky, Luiz Pardal, Hudson Nogueira, Leonard Bernstein e Arturo Márquez. Antes, à tarde, a Bibliotheca Pública Pelotense recebeu outra formação nortista: a Orquestra de Câmara do Sesc Roraima, cuja maioria dos integrantes ainda está na adolescência e que se profissionalizou em 2016.

– Isso aqui é uma troca de experiências. Mais do que aprender, é confraternizar. É uma troca tão grande, mesmo que os músicos não se falem. No hotel, a gente anda pelos corredores e escuta música o tempo inteiro. Os meninos ficam batendo de porta em porta: “Ei, posso escutar vocês?”. Os meninos todos fazendo amizades. Eu estou muito feliz! A gente tinha o sonho de vir para cá – emociona-se a maestrina Lilyane Lopes, há 14 anos à frente da orquestra de Roraima, grupo que enfrentou 18 horas de viagem para vir do extremo Norte até o extremo Sul do país.

Em 2020, o Festival Sesc de Música aproxima-se ainda mais de vertentes populares como o jazz, o rock e a MPB – além do choro, que desde o ano passado ganhou um curso específico na programação e que nesta edição será também representado com uma apresentação do Sexteto Gaúcho no dia 29. A agenda de encontros musicais teve o virtuoso bandolinista Hamilton de Holanda tocando ao lado da Orquestra de Câmara da Ulbra e a Banda Tum Tom Foin, liderada por Arthur de Faria, dividindo o palco com o grande compositor e pianista André Mehmari – que também está ministrando um curso de Composição. Nesta quinta, a Salvagni Big Band interpreta standards do jazz, enquanto no sábado, os pelotenses Kleiton & Kledir celebram 40 anos de carreira na Praia do Laranjal, acompanhados pela Orquestra de Câmara Theatro São Pedro.

– O festival tem que trabalhar todas essas linguagens. Eu sempre digo que música é música, independente de estilo e formato. Desde que seja feita com qualidade, não há problema. Nós procuramos todos os anos do festival diversificar a programação. Temos o Hamilton de Holanda, um gênio da música instrumental, o André Mehmari, que não para de crescer, não só no Brasil como fora, como compositor e pianista. Um dos fatores de sucesso do festival é que ele traz a música de concerto com outros formatos e faz essa junção. Você agrada a todos os públicos – justifica o maestro Evandro Matté, diretor artístico do 10º Festival Internacional Sesc de Música.

Em janeiro de 2019, o concerto de encerramento da nona edição foi precedido por discursos de autoridades e representantes do Sesc assegurando a permanência do festival, a despeito dos rumores de que o governo federal pretendia impor severos cortes nos repasses de verbas ao Sistema S. Um ano depois, a promessa de continuação efetivamente concretizou-se, e a expectativa é de que cerca de 30 mil pessoas participem ao total das atividades do festival. O futuro, porém, continua incerto: o Ministério da Economia ainda não desistiu de meter a faca no orçamento que afeta federações como o Sesc.

– Em junho, vamos lançar a 11ª edição. Vamos fazer o festival em 2021 com o recurso que se tiver, mesmo que haja alguma redução – garante Sílvio Bento.

 

Veja entrevista com a maestrina Lilyane Lopes, regente da Orquestra de Câmara do Sesc Roraima:

 

Veja a Orquestra de Câmara do Sesc Roraima interpretando a ária Che Gelida Manina, da ópera La Bohème, de Puccini, com o tenor Juan Alexis:

 

Veja entrevista com o maestro Evandro Matté, diretor artístico do 10º Festival Internacional Sesc de Música:

 

Veja a Orquestra Jovem Sesc Pará interpretando a Suíte Popular Paraense, de Luiz Pardal:

 

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