Juremir Machado da Silva

Ano novo, vida nova?

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Ano novo, vida nova? Michel Houellebecq na Patagônia/Fotos de Ana Claudia Rodrigues

      E a virada aconteceu. Como previsto. Estamos em 2024. Vida que segue. Mas, se segue, é nova ou velha? Para quem ganhou na mega-sena, novíssima. Para quem, como eu, nem jogou, é continuidade. Já nos acostumamos a pensar em ano novo, vida nova. Só que pode ser, sem problema, ano novo, vida velha. Não perder o que se conquistou.

      Vivemos no mundo da novidade. Nada pode durar muito tempo. O próprio da pós-modernidade ou da hipermodernidade é a ideologia da novidade, querer ir mais rápido do que a própria sombra, acelerar. Quem fica parado, nessa concepção, é velho. Poste até pode ser novo.

      Nas televisões, shows de massa. A televisão é de massa, a sociedade é de massa, a cultura tem de ser de massa. E daí? Bem daí que nem todo mundo cabe na fórmula, entra no barco, conhece a coreografia, dança conforme a música, puxa na mesma direção.

      Ano novo, diversidade de sempre, velha uniformização. Por trás das aparências, o pluralismo resiste. Nem todo mundo marcha de passo certo. A esperança, porém, é quase a mesma. A maioria quer saúde, felicidade e plata. É muito? Somente o essencial. Os principais indicadores econômicos do país melhoraram em 2023. Que 2024 seja melhor. É fundamental que a melhoria desses indicadores seja sentida na prática. Ano novo, cerveja nova e talvez até a picanha prometida.

      A cada época um desejo. Há o tempo de pedir aventuras, o tempo de correr riscos, o tempo de ir embora, o tempo de correr mundo, o tempo de sentir saudades, o tempo de tentar ganhar e acumular. Há também o tempo de pedir saúde, de voltar para casa, de encontrar velhos amigos, de costurar novas alianças, de apostar na proximidade. Ano novo, velhos pedidos, votos de sempre, demandas reprimidas, desejos revelados, promessas feitas e refeitas, tudo e nada zerados.

      E assim vamos vivendo, fatiando o tempo e acreditando nas virtudes do recomeço. De minha parte, tentarei fazer o que gosto, aquilo que sempre faço, ler, escrever, dar aula, viajar, abraçar gente querida. É tempo de voltar ao Rio de Janeiro, de publicar um dicionário afetivo, “Paixão de A a Z, Minha França”, de passar uns dias em São Miguel dos Milagres, em Alagoas, nossa praia predileta, tempo de sempre sonhar com o que se fez de melhor, imaginar que um dia será possível fazer de novo, levando a vida com o máximo de leveza.

      Ano novo, leituras novas e velhas. Ler, reler, encantar-se de novo. Leituras que, em alguns casos, enveredam cada vez mais pelo retorno aos clássicos e pela busca de obras fora dos caminhos batidos, dos selos da moda e dos louros planejados. Ano novo, resistências de sempre, atalhos, veredas, trilhas solitárias, prazeres marginais, estilo pessoal, dicção singular, pequenas manias, grandes liberdades.

      Novo ano, velha contagem, um dia de cada vez, uma vez a cada dia, sorver a brisa, tomar banho de sol, caminhar sem pressa, nem tênis recomendado, a esmo, seguindo o GPS do coração, sentindo cheiro de jasmim, lírios, rosas, dálias, banho de sanga, pés descalços, planos de voo, voos não planejados, poemas feitos no celular.

      Ano novo, quase tudo continua possível. Avante, pois!

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