Juremir Machado da Silva

Paris dos escritores americanos

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Paris dos escritores americanos Foto: John Towner/Unsplash

Ivan Pinheiro Machado – o PM da dupla L&PM, o L é o do Paulo Lima – é um francófilo. Não perde o Salão do Livro de Paris, onde compra direitos de publicação de deliciosas obras. A L&PM, que fará 50 anos em 2024, é uma das grandes editoras do país. Foi ela quem lançou no Brasil Yuval Harari, com Sapiens, além de um catálogo impressionante que incluir dos maiores brasileiros aos gigantes do mundo. As editoras de Rio de Janeiro e São Paulo fazem como Palmeiras e Flamengo: à força de capital procuram levar o que nasce em cantos do Brasil como o Rio Grande do Sul. Foi assim com a Sulina, que introduziu Michel Houellebecq no Brasil e depois o perdeu para locomotivas nacionais. Santo de casa também vai embora: Jefferson Tenório lançou O beijo na parede pela Sulina e depois foi explodir com O avesso da pele pela Cia das Letras. É do jogo. Ivan vai atrás de novas descobertas. Vale muito ler um dos seus últimos achados, Paris dos escritores americanos 1919-1939, de Ralph Schor.

Quem já não ouviu falar dos “anos loucos” e da “geração perdida”, uma turma barulhenta e talentosa que vai de Ernst Hemingway a Scott Fitzgerald, passando por Henry Miller, Zelda Fitzgerald, Gertrude Stein, Djuna Barnes, Natalie Barnes, Sylvia Beach, René Crevel, Harry Crosby. Cummnings, John dos Passos, Eliot, Ford Madox Ford, John Glassco, Mary Jayne Gold, Peggy Guggenheim, James Joyce, Sinclair Lewis, Anais Nïn, Ezra Pound (o fascista da turma), Man Ray, Edith Wharton, William Carlos William, Thomas Wolfe e mais uma penca de loucos de cara que não citei para encurtar a lista e seguir em frente? Cada nome desse faz tremer. Era um pessoal que fazia.

Aí o leitor pergunta: todos esses aí eram da “geração perdida”? Não tem só americanos. Verdade. A “geração perdida” não era feita só de americanos. Tem gente mais velha e mais nova. Verdade também. O francês Ralph Schor, professor universitário aposentado, juntou numa mesma vibe apaixonados por arte, ricos e pobres, donos de salões literários como o de Gertrude Stein, na Rue de Fleurus, 27, poetas, prosadores, fotógrafos, enfim, todos unidos pela mesma paixão: Paris. A França. Daria também para citar os amigos dessa turma nada banal, gente como Picasso, Breton e cia. Três dos componentes dessa “geração perdida” ampliada ganharam o Nobel da literatura: Hemingway, Eliot e Sinclair Lewis. Mais o que mais merecia certamente era Scott Fitzgerald, um dos mais perdidos entre tantos perdidos e achados.

Muitos deles haviam participado de algum modo da Primeira Guerra Mundial. Os americanos queriam fugir da mediocridade consumista dos Estados Unidos. Viam em Paris charme, tradição, cultura e poesia. Frequentaram lugares, como em Montparnasse, que ainda estão em atividade: La Coupole, Rotonde, Select, Dôme, Closerie de Lilas, todo o velho e saboroso Montparnasse que pega o viajante pelo coração. Muitos eram homossexuais e encontravam na França tranquilidade para ser o que eram: “Henry Miller adorava perder-se pelas ruas, nas quais cada desvio reservava uma surpresa encantadora, uma perspectiva, um monumento, uma fachada original”, escreve Schor. E cita Miller: “As ruas cantam, as pedras falam. As casas transpiram história, glória, charme”. Que nenhum moderno nos ouça: Paris continua assim.

O termo “geração perdida” foi colhido por Gertrude Stein da boca do dono de uma oficina, que se queixava da incompetência de um mecânico para resolver um problema básico. Essa geração queria liberdade, festa, arte, álcool, drogas, viagens, sexo, reconhecimento e emoções de todos os preços. Alguns declaravam amor incondicional à França. Outros, como Fitzgerald, que nunca falou francês fluentemente, reclamavam bastante, mas ficavam. Era barato para americano viver em Paris nos anos 1920. O câmbio era muito favorável ao dólar. Comia-se bem e barato. Bebia melhor ainda. Era possível montar editoras e pulicar em inglês o que seria proibido em casa ou até mesmo em francês. Discutia-se e fazia arte em alto nível. Gertrude Stein deu um conselho a Ernst Hemingway que continua valendo para escritores: “Escreva a frase mais verdadeira que você conhece”. Do cacete.

Ivan Pinheiro Machado poderia dar o seu conselho: publique o livro mais apaixonante que você encontre. O resultado virá.

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