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Prefeitura enviará Plano Diretor só após as eleições de 2024

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Prefeitura enviará Plano Diretor só após as eleições de 2024 Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana | Foto: Filipe Karam / PMPA

Após adiar a realização da audiência pública que analisaria propostas para o Plano Diretor ainda neste ano, a prefeitura de Porto Alegre confirmou que o projeto só será enviado à Câmara de Vereadores após as eleições municipais, em outubro do ano que vem. Desta forma, a votação do texto deverá ficar para 2025, como o prefeito Sebastião Melo (MDB) já havia sugerido

Por meio de nota, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) atribuiu o atraso à decisão judicial que determinou eleições no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (CMDUA), processo que se desenrolará até fevereiro. “A determinação judicial impede a imediata finalização do processo de revisão do Plano Diretor e sua entrega à Câmara de Vereadores”, afirmou a pasta – a íntegra do comunicado está no final desta matéria.

Em razão da eleição, as atividades só deverão ser retomadas após a posse dos futuros conselheiros. “Com o novo conselho constituído, os processos participativos, como audiência pública, poderão ter sequência. Considerando o período eleitoral em 2024 e a ampla dinâmica de debate que terá sequência no Legislativo, a gestão definiu por finalizar todo o processo de revisão no âmbito do Executivo e deixar o projeto de lei apto para envio à Câmara Municipal após as eleições municipais”, informou o posicionamento. 

O atual Plano Diretor de Porto Alegre é de 2010. Conforme o Estatuto das Cidades, o plano, que é obrigatório a cidades com mais de 20 mil habitantes e é definido pela legislação como “o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana”, deveria ser atualizado a cada dez anos. Com o atual atraso, é possível que chegue a 15 anos o intervalo entre um Plano Diretor e outro em Porto Alegre. 

Atualização por “leis avulsas”

Conselheiro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do RS, Pedro Xavier de Araújo, que também coordena a comissão de política urbana e ambiental do CAU/RS, criticou o novo atraso na entrega do projeto e lembrou que as primeiras reuniões visando a construção do que será esta proposta ocorreram ainda em 2016, sob a gestão Fortunati, que tinha Melo como vice-prefeito. 

Para ele, nos dois mandatos seguintes, de Nelson Marchezan (PSDB) e de Sebastião Melo, a revisão foi deixada à parte, enquanto legislações urbanísticas foram aprovadas. “Os dois últimos governos tiveram uma série de decretos que acabaram contemplando interesses de seus apoiadores e driblando os processos participativos e legais que precisam haver numa revisão de Plano Diretor”, afirmou. Araújo citou mudanças na lei do solo criado, sob Marchezan, e dos regimes urbanísticos específicos para o Centro Histórico e o 4º Distrito, no período de Melo, como exemplos. “Mas tudo isso é ilegal. Essa condição de picotar o Plano Diretor em diferentes leis, alterá-las sem obedecer os trâmites”, avaliou. 

O artigo 42 do Estatuto das Cidades versa que um dos requisitos mínimos que um Plano Diretor deve conter é “a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infraestrutura e de demanda para utilização”. Há poucos dias, a Câmara aprovou projeto do executivo que ampliou a área de isenções fiscais a imóveis integrantes do Programa +4D, o que afeta tanto o desenvolvimento quanto a expansão urbana na região.

As alterações realizadas no período de Marchezan e Melo, no entender do conselheiro do CAU/RS, praticamente atualizaram o plano, “a partir de uma série de leis avulsas e independentes, que atenderam interesses de alguns grupos, em especial aqueles ligados ao mercado da construção civil”. Nesta situação, ele não percebe pressa em atualizar o Plano Diretor. “Não há mais nenhuma urgência em tocar esse prazo adiante.”

Líder da oposição na Câmara, o vereador Roberto Robaina (PSOL) manifestou posição semelhante à do conselheiro do CAU/RS: “O governo vai mudando a cidade aos poucos, sem discutir com a sociedade qualquer mudança. Vai favorecendo a especulação imobiliária em detrimento dos moradores dos bairros”, disse à reportagem da Matinal. “O Plano Diretor, na prática, já vem sendo alterado.”

“Perde a cidade”

Araújo entende que a prefeitura teria condição de atualizar o Plano Diretor ainda em 2024 e faz uma opção política ao entregar o texto somente após as eleições. “O executivo colocaria no colo dos vereadores uma responsabilidade muito grande às vésperas das eleições”, analisou. “É um projeto que exige tomada de decisão num ano em que talvez eles não queiram fazer decisões muito polêmicas.”

Ao fim, no seu entender, quem perde é a cidade com o atraso. “O que se vê hoje é a construção civil ocupando os vazios da cidade, impulsionadas pela grande desregulamentação.”

De acordo com o último Censo, entre 2010 e 2022, Porto Alegre aumentou em 106,43% o número de seus imóveis desocupados, saltando de 48.934 para 101.013 unidades. O crescimento deste índice foi muito superior ao verificado nos dois censos anteriores. Em 2000, eram 42.736 imóveis desocupados na capital. 

“Para que construir tanto numa cidade que não demanda, e a população não tem capacidade de investir?”, questionou Araújo. “Tem projetos que vão ser instalados e podem nunca ser ocupados. Seria uma desgraça para a cidade.”

  • Posicionamento da prefeitura

NOTA SOBRE O PLANO DIRETOR

A revisão do Plano Diretor é prioridade para a gestão – que acredita e trabalha pelo desenvolvimento com sustentabilidade e com a perspectiva de criar uma nova legislação que permita uma Porto Alegre do futuro com inovação no urbanismo para avanço na qualidade de vida dos cidadãos.

Desde 2019, a prefeitura trabalha no processo de revisão, que foi impactado pela pandemia. Apenas em 2021 foram retomadas as atividades presenciais. Foram realizadas duas grandes conferências, seminários, oficinas temáticas, exposições nas regiões de planejamento, contando com mais de cinco mil participantes. Na primeira etapa, foi feito o diagnóstico da cidade com seus problemas e potenciais. No segundo semestre de 2023, as propostas para o Plano Diretor estavam em fase de debate com a sociedade.

O adiamento do envio do projeto de lei do Plano Diretor à Câmara Municipal ocorre devido a uma decisão judicial que exigiu a realização de eleições para o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental – cuja prorrogação do mandato dos conselheiros foi acordada com os próprios integrantes para não comprometer o andamento dos trabalhos. A determinação judicial impede a imediata finalização do processo de revisão do Plano Diretor e sua entrega à Câmara de Vereadores. A gestão, por óbvio, cumprirá a decisão judicial, e o processo para eleger os representantes das oito regiões de Gestão de Planejamento da Capital e das entidades ocorrerá nos meses de janeiro e fevereiro de 2024. 

Com o novo conselho constituído, os processos participativos, como audiência pública, poderão ter sequência. Considerando o período eleitoral em 2024 e a ampla dinâmica de debate que terá sequência no Legislativo, a gestão definiu por finalizar todo o processo de revisão no âmbito do Executivo e deixar o projeto de lei apto para envio à Câmara Municipal após as eleições municipais.

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