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Somos Equador e Uruguai

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Somos Equador e Uruguai Por Marcela Donini* O Equador tem 883 mortes por Covid-19. O Paraguai, 9. Na Argentina, os óbitos somam 214, na Bolívia, 55, e no Uruguai, 15. Nenhum presidente desses países teve o desrespeito, a falta de humanidade de dizer qualquer coisa parecida com o cruel “E daí?” de Jair Bolsonaro, chefe de uma nação que já enterrou mais de 5,5 mil pessoas por causa do novo coronavírus.  Cito os cinco países sul-americanos porque foi com jornalistas desses lugares que, na segunda-feira, conversei sobre a cobertura jornalística da pandemia em uma videoconferência organizada pela Entrenate Comunicaciones.  Ouvindo os colegas me dei conta de que, no Brasil, cabem muitos dos nossos vizinhos hermanos. Cabe o Equador, com a maior taxa de mortalidade por 1 milhão de habitantes da América Latina. Cabe também o Uruguai, que apresenta um dos menores índices. Enquanto a realidade dos gaúchos se aproxima à dos uruguaios — nós temos uma taxa de 4,6 mortos por 1 milhão de habitantes, e eles, 4,3 —, nossos irmãos do Amazonas e do Ceará apresentam índices acima de 100 óbitos, mais do que o dobro da taxa dos equatorianos, que se aproxima da verificada no Rio de Janeiro. As primeiras cenas de horror do colapso nos sistemas de saúde e funerário chegaram à América do Sul pelo Equador. Mas hoje não só em Guayaquil os infectados morrem em casa e são enterrados em valas comuns, em Manaus e São Paulo também. O relato da colega María Belén Arroyo, desde Quito, foi o mais comovente do painel, contrastando com a fala dos colegas da Argentina e do Uruguai. Leticia Castro, jornalista do uruguaio La Diaria, informou que, por lá, a curva de transmissão está relativamente controlada, são 15 os mortos pela doença. Em Porto Alegre, nossa curva chegou a desacelerar, mas a sombra da subnotificação cresce no Estado.  No Brasil, cabe ainda a mesma solidariedade dos paraguaios, que, segundo nos contou Mabel Díaz, garante comida a quem estaria passando fome por causa da pandemia. Assim como compartilhamos nós, brasileiros, da preocupação dos bolivianos com o futuro dos trabalhadores informais, relatada por Rocío Loret. A jornalista da Bolívia também ressaltou o aumento da confiança do público na imprensa, ainda que os meios de comunicação não consigam capitalizar esse interesse a ponto de sustentar seus negócios. O painel foi também uma oportunidade para trocar experiências. Uma das lições da startup argentina Red/Acción é ouvir a audiência. Segundo o editor-chefe, Javier Drovetto, a prioridade do seu público é ter acesso a informação publicada de forma simples para embasar suas decisões cotidianas. Parte do seu conteúdo de serviço, como sobre higiene pessoal e sintomas da Covid-19, foi traduzida para línguas de povos originários da Argentina. De minha parte, destaquei nosso esforço de colaboração, exemplificado em projetos como o Comprova e o Fiquem Sabendo. Também sublinhei que um dos grandes desafios para os jornalistas brasileiros é fortalecer a cobertura local. No Brasil, os desertos de notícia, cidades sem um único veículo sediado, afetam 37 milhões de brasileiros. Mesmo as […]

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Por Marcela Donini* O Equador tem 883 mortes por Covid-19. O Paraguai, 9. Na Argentina, os óbitos somam 214, na Bolívia, 55, e no Uruguai, 15. Nenhum presidente desses países teve o desrespeito, a falta de humanidade de dizer qualquer coisa parecida com o cruel “E daí?” de Jair Bolsonaro, chefe de uma nação que já enterrou mais de 5,5 mil pessoas por causa do novo coronavírus.  Cito os cinco países sul-americanos porque foi com jornalistas desses lugares que, na segunda-feira, conversei sobre a cobertura jornalística da pandemia em uma videoconferência organizada pela Entrenate Comunicaciones.  Ouvindo os colegas me dei conta de que, no Brasil, cabem muitos dos nossos vizinhos hermanos. Cabe o Equador, com a maior taxa de mortalidade por 1 milhão de habitantes da América Latina. Cabe também o Uruguai, que apresenta um dos menores índices. Enquanto a realidade dos gaúchos se aproxima à dos uruguaios — nós temos uma taxa de 4,6 mortos por 1 milhão de habitantes, e eles, 4,3 —, nossos irmãos do Amazonas e do Ceará apresentam índices acima de 100 óbitos, mais do que o dobro da taxa dos equatorianos, que se aproxima da verificada no Rio de Janeiro. As primeiras cenas de horror do colapso nos sistemas de saúde e funerário chegaram à América do Sul pelo Equador. Mas hoje não só em Guayaquil os infectados morrem em casa e são enterrados em valas comuns, em Manaus e São Paulo também. O relato da colega María Belén Arroyo, desde Quito, foi o mais comovente do painel, contrastando com a fala dos colegas da Argentina e do Uruguai. Leticia Castro, jornalista do uruguaio La Diaria, informou que, por lá, a curva de transmissão está relativamente controlada, são 15 os mortos pela doença. Em Porto Alegre, nossa curva chegou a desacelerar, mas a sombra da subnotificação cresce no Estado.  No Brasil, cabe ainda a mesma solidariedade dos paraguaios, que, segundo nos contou Mabel Díaz, garante comida a quem estaria passando fome por causa da pandemia. Assim como compartilhamos nós, brasileiros, da preocupação dos bolivianos com o futuro dos trabalhadores informais, relatada por Rocío Loret. A jornalista da Bolívia também ressaltou o aumento da confiança do público na imprensa, ainda que os meios de comunicação não consigam capitalizar esse interesse a ponto de sustentar seus negócios. O painel foi também uma oportunidade para trocar experiências. Uma das lições da startup argentina Red/Acción é ouvir a audiência. Segundo o editor-chefe, Javier Drovetto, a prioridade do seu público é ter acesso a informação publicada de forma simples para embasar suas decisões cotidianas. Parte do seu conteúdo de serviço, como sobre higiene pessoal e sintomas da Covid-19, foi traduzida para línguas de povos originários da Argentina. De minha parte, destaquei nosso esforço de colaboração, exemplificado em projetos como o Comprova e o Fiquem Sabendo. Também sublinhei que um dos grandes desafios para os jornalistas brasileiros é fortalecer a cobertura local. No Brasil, os desertos de notícia, cidades sem um único veículo sediado, afetam 37 milhões de brasileiros. Mesmo as […]

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