A cor da minha noite
Um dia um tio fotógrafo me perguntou qual era a cor da minha noite. Foi o mesmo que me mandou sair por aí a fotografar frases, temas de casa, como – “Gargalha tuas mágoas….” – e lá me ia eu.
Porém, quando me perguntava qual era a cor da minha noite, ao contrário das frases de poesia o imaginário trazia sempre o mesmo tom, e parecia fácil, mas não tanto, descrever uma cena de abandono e melancolia, ou de paz e regozijo, que por si não expressavam qual era a cor da minha noite. Como naquela época tão distante transformar pensamento em imagem sem exigir melhor equipamento ou conhecimento técnico – que eu talvez nem atingisse?
Foram frustradas minhas primeiras noites evidenciadas, não mais que um breu intenso, ou, quando muito, imagens invadidas por um granulado azul como uma nuvem de areia a esconder qual era a verdadeira cor da minha noite.
Sou do tempo das películas, até voltei a elas, como em algumas imagens deste ensaio. Levei tempo a perceber que não seria só equipamento – minha câmera principal hoje é da década de oitenta; o digital até pode ajudar, mas não inventa.
Cheguei a achar que minha noite não existia, ou de fato falta cor na minha noite.
Hoje, o Fischer me chama e convida para novo ensaio, não como meu tio, que era de propor temas fechados, mas livre. Então revisito minhas imagens além dos azuis dos claros dias, além das ensolaradas ruas e seus transeuntes, e me encontro com cenas noturnas de praias sombrias, de procissões esperançosas, ou misteriosas esquinas mal iluminadas, surpreso, e com atraso, embora sendo como numa lembrança sem data, constato que estava ali minha cor da noite revelada.
[Continua...]