Ensaios Fotográficos

Estar entre

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Estar entre

Saí para caminhar a fim de repetir uma coisa que gostava de fazer em Porto Alegre: aproveitar o domingo sem excesso de gente, de carros, de barulho. Só que agora eu não moro mais em Porto Alegre, eu moro numa cidade tão pequena que não precisaria de um domingo para encontrar um bocado de tranquilidade. 

Porto Alegre, que para alguns leitores é aí, e Argentan, que para mim é aqui. Eis meu primeiro momento entre um lá e um cá nesse ensaio de fotos que apresento na revista Parêntese.

Parêntese, tá aí um outro sinal que pode ser usado para criar relação com as imagens que fiz. Estar entre parênteses é um pouco como me senti ao ficar posicionado no meio dos caminhos. Caminhos que dividi em dois, quando mirei a câmera para frente e depois para trás.

Por outro lado, enxerguei esse estar entre também como uma ligação, como uma ponte. Atravessei algumas delas, por sinal, enquanto caminhava e fazia o ensaio. E então eu posso olhar para esse conjunto de retratos pela perspectiva da conexão, da ligação de dois pontos: o atravessado, no passado; e o a atravessar, no futuro.

Hoje me encontro também entre dois idiomas: o português e o francês. Parece que algumas palavras do português insistem em demorar mais, é um esforço até para que eu as encontre. Esses dias eu não lembrava do verbo afinar, por exemplo. Queria afinar uma frase específica com ele e não conseguia. No entanto, o francês está longe de ser dominado. Eu preciso de muito raciocínio para conjugar os verbos irregulares que aparecem diariamente nas conversas, nos pequenos textos que escrevo, nos email que troco com colegas no trabalho. E ainda por cima meu filho mais novo sempre poderá corrigir meu sotaque, meu acento brasileiro – que nem quero perder, é claro.

Esse estar entre é um pouco assim como descrevi, por isso as fotos têm essa proposta. Me vejo, hoje, no meio de algo. Talvez eu esteja no meio de um percurso, não sei. Onde é esse meio, essa metade? Desconheço. A divisão que faço da vida é apenas uma hipótese. É apenas uma vontade de que seja mesmo isso, uma perspectiva que mostra que tenho vontade de seguir vivendo.

Argentan, 12 de fevereiro de 2023.












Ângelo Chemello Pereira – É editor da Parêntese, fez mestrado em literatura brasileira na UFRGS e dá aulas para refugiados na França.

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