Porto Alegre: uma biografia musical

Capítulo LXXXVII – Anos 60: A era dos Festivais em Porto Alegre II

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Capítulo LXXXVII – Anos 60: A era dos Festivais em Porto Alegre II

O sucesso já da primeira edição do Festival Sulbrasileiro da Canção Popular animou o pessoal. E aí a coisa pegou fogo com os “Festivais da Arquitetura”.

Que começaram… com o pessoal da Engenharia!

O jornalista Juarez Fonseca lembra:

Em meados de 1967, o estudante de Engenharia Carlos Alberto Basgal imaginou fazer um festival universitário em Porto Alegre. Levando em conta que o centro acadêmico de sua faculdade, o CEUE, era muito “careta e reacionário”, Basgal atravessa a Rua Sarmento Leite e leva a ideia a Paulo Bertussi, presidente do DAFA.

O DAFA era o Centro Acadêmico da Arquitetura, nosso velho conhecido, que já tinha no currículo o sucesso dos Arqui-samba seria uma consequência lógica, aproveitando a experiência do pessoal.

Segue Juarez:

Em pouco tempo a rapaziada da Arquitetura estava levando a ideia adiante, com Basgal liderando a comissão executiva. No coquetel de lançamento do I Festival Universitário da Música Popular Brasileira, um representante dos Diários Associados aproveitou para oferecer, em troca do apoio da Rádio Farroupilha, do Diário de Notícias e da TV Piratini, o pagamento dos músicos da OSPA para acompanhar as músicas concorrentes (coisa que ainda estava incerta por causa dos valores) e passagens aéreas para a divulgação nas principais cidades do país. Os prêmios em dinheiro, acertou-se em seguida, viriam dos governos estaduais de São Paulo (primeiro lugar), Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e da Prefeitura de Porto Alegre.

O nome oficial seria Festival Universitário da MPB do DAFA, mas ficou conhecido mesmo foi como O Festival da Arquitetura. Seriam duas edições: a primeira em julho de 1968 (um mês depois do 2º Festival Sul-Brasileiro da Canção Popular) e a segunda em julho de 1969. 

Para essa primeira edição chegaram 500 músicas vindas de universitários de todo o Brasil. Uma vez selecionadas as que iriam participar, o Salão de Atos da Reitoria da UFRGS lotou nas noites de 10 a 13 de julho de 1968, com tudo transmitido ao vivo pela Rádio da Universidade (da mesma UFRGS) e, graças ao videoteipe, apresentado dias depois pela TV Piratini. 

(Há um detalhe que, como tantos outros relativos a essa esquecida cena porto-alegrense dos festivais, ficou esquecido: muito se fala no pioneirismo com que, em meados da década de 1970, a Rádio Continental gravou os artistas locais em seus estúdios, usando essas gravações na sua programação. Só que, quase 10 anos antes, a Rádio da Universidade – que segue na ativa – fez quase o mesmo: deixava que os artistas da cidade usassem seus estúdios para gravações, gratuitamente. Mas, como a rádio sempre tocou só música de concerto, essas gravações não eram feitas para a programação, mas sim para que os compositores registrassem em suas fitinhas de rolo as canções que tentariam uma vaga nestes festivais.)

Os concorrentes, graças ao apoio dos Diários Associados, que pagaram o cachê, eram acompanhados pela OSPA, arranjada pelo maestro alemão Alfred Hülsberg – emprestado da Grande Orquestra da Rádio Farroupilha. A cada noite também havia shows curtos, como o de João Palmeiro e Ivaldo Roque tocando músicas de João. No jornal A Folha da Tarde a cobertura comentava que o show…

…mostrou que o “velho” Ivaldo continua sendo um dos melhores de todos, e que João precisa ser mostrado mais amiúde, pois seu talento é imenso.

Ivaldo tinha, então, 29 anos, o que dá bem a medida do recorte geracional de palco e plateia do festival universitário, diferente do mais eclético Festival Sulbrasileiro da Canção Popular.

Juarez também conta do…

frisson nos jovens músicos locais que, pela primeira vez, tiveram oportunidade de conviver e dividir o palco com colegas de outros estados, principalmente os cariocas, entre eles estreantes como Beth Carvalho, Danilo Caymmi, Paulinho Tapajós, Arthur Verocai, Eduardo Conde, o Grupo Manifesto. 

A “representação gaúcha” contava com Geraldo Flach, Raul Ellwanger, Wanderlei Falkenberg, Mauro Kwitko, Laís Marques, João Alberto Soares e outros que o tempo apagou por não terem ganho prêmio algum e não terem continuado na música – eram universitários participando de um festival porque tocar violão e fazer música estava na moda. Mas também havia profissionais com nomes escondidos por não ser universitários, como Paulinho do Pinho (Paulo Luiz Coutinho), um dos violonistas mais admirados pelos próprios músicos da cidade, co-autor da canção vencedora, Jogo de Viola, com João Alberto Soares. 

Jogo de viola foi defendida pela estrela local Érica Norimar, em duo com o crooner Sabino Loguércio e, em 1969, gravada por Marilia Medalha em seu LP daquele ano. Paulinho do Pinho, fugindo da ditadura, radicou-se em Santiago del Estero, no interior da Argentina, lançou dois LPs instrumentais na década de 1970 (Paulinho do Pinho e Outra Vez, ambos pela Tonodisc), tocou com artistas importantes como o cantor Piero, compôs algumas canções com Raul Ellwanger e segue por lá. 

Apesar de nove entre as doze finalistas serem de compositores gaúchos, quem levou o segundo lugar foi Canto pra Dizer Adeus, de Danilo Caymmi, Paulo Tapajós e Edmundo Souto – o mesmo trio que comporia Andança, a vencedora do V FIC – Festival Internacional da Canção, nesse mesmo ano.

Graças ao cartaz dos inscritos de fora de Porto Alegre, mais conhecidos nacionalmente, o I Festival Universitário da MPB teve direito a um disco lançado nacionalmente pela gravadora Philips. Estão ali as 12 finalistas, mas com novos intérpretes, de mais apelo no momento. O que fez com que alguns nomes importantes do chamado “centro do País” invertessem pela primeira vez a lógica estabelecida em que os intérpretes locais cantavam e tocavam quase que só compositores de fora do Estado. 

Assim, Jogo de Viola, parente próxima de Ponteio, foi gravada no disco exatamente pelo autor de Ponteio, Edu Lobo – que a canta em duo com a cantora Lucelena, a futura Lucina da dupla Luli & Lucina.

Entre as músicas de autores locais, duas canções de Cesar Dorfman – a marcha-rancho que vira marchinha Fantasia Urbana e o Samba do Cotidiano -, duas de Wanderlei Falkenberg – Canto do Encontro (interpretado pelo Momento4) e Canção do Entardecer. Uma de Raul Ellwanger – o samba-choro Sim ou Não. E nada menos que três de Laís Marques: o samba-canção Você por Telegrama, a marcha-rancho Quem Vem Lá e a bossa nada ortodoxa A Caminho de Casa, interpretadas no festival por um quarteto de mulheres – e no disco por, respectivamente, Joyce, Sônia Lemos e Magda. Laís, prima de Hermes Aquino, é uma esquecida figura, importantíssima nesse momento, a quem voltaremos não só nesse livro como no futuro volume dedicado ao rock em Porto Alegre.

Raul Ellwanger defendendo seu samba

Recortes de jornal guardados pelo jornalista Vanderlei Cunha

Agora pulemos um ano.

Estamos em 1969, e o II Festival Universitário da MPB (da Arquitetura) é uma explosão tropicalista. 

Lembrando: o tropicalismo fora lançado em 1967, no III Festival da MPB da Record. Agora, em 1969, Gil e Caetano estão no exílio, e quem segura a peteca tropicalista são Gal, Tom Zé e Os Mutantes. Justamente o trio que se apresentara no Arquisamba Tropicalista, acontecido em maio em Porto Alegre. A cidade fervera.

De novo Juarez, testemunha ocular (e auditiva) da história:

Depois de ouvirem as centenas de músicas inscritas e conhecerem as 36 selecionadas pela comissão de triagem, Basgal, sua equipe e o pessoal do DAFA (já presidido por José Antônio Pinheiro Machado) perceberam que seria um festival bem diferente do anterior. E com muita polêmica, pois os violões da MPB dividiriam o palco com guitarras da tropicália, melodias convencionais enfrentariam experimentações, letras engajadas duelariam com textos concretistas. Mesmo antes de se realizar, o festival sublinhava a divisão e a perplexidade tanto dos universitários como da própria música brasileira. A ditadura exercia seus efeitos para além das passeatas e manifestações da inconformidade estudantil. E ao ler o programa do festival, antes mesmo de ouvir a primeira música, o público que estava no Salão de Atos da UFRGS em 4 de julho de 1969 conheceu a posição do DAFA. O programa, com as 36 letras, tinha o seguinte texto de abertura, quase todo em minúsculas – marca dos estudantes de Arquitetura:

o processo: lugar comum de augusto de campos a noel rosa

de noel a joão gilberto e de joão a caetano&gil: gol!!

musica popular brasileira: a crise o fato

o feto: II FESTIVAL UNIVERSITÁRIO Faculdade de Arquitetura

documenta documento gaúcho

dos subdesenvolvidos não cultural nem musicultural

nossa medição qualitativa: jovem

ao contexto-público-povo: massa urbana que consome

consumurbano: nós todos

daqui II FESTIVAL UNIVERSITÁRIO vai sair uma saída:

a pesquisa: vidaberta abertura vital

para nossa cultura – nossa música

experimespetacular:

o espetáculo é total porisso experimental ATENÇÃO

noel joão caetano&gil estamos com vocês: queremos

uma saída por favor ou: fato foto feto fito a imagem:

daqui pra frente será 2070 BOAGEM boaviagem boa viagem.

O texto, Juarez não fala, mas é absolutamente inspirado no estilo de prosa poética dos concretistas, principalmente de Augusto de Campos.

Imaginem Lupicínio Rodrigues, Túlio Piva, Rubens Santos ou Alcides Gonçalves lendo isso. Efetivamente o II Festival Universitário veio pra botar pra quebrar.

A tensão estava no ar:

Muitos participantes da primeira edição do festival concorreriam de novo, como Geraldo Flach (em parceria como João Alberto Soares), Danilo Caymmi, Laís Marques, Paulinho Tapajós, Arthur Verocai, Joyce, Wanderlei Falkenberg, Beth Carvalho. Entre os estreantes, Carlinhos Hartlieb, os cariocas José Rodrigues Trindade (Zé Rodrix) e Ronaldo Bastos, este dentro em pouco grande letrista de Milton Nascimento. As polêmicas se confirmariam no palco e nos bastidores, com os participantes se autodividindo a certa altura em “contra a esculhambação” e “a favor da liberdade de expressão artística”. 

O grupo gaúcho Succo veio disposto a “romper as estruturas”: na noite eliminatória, seu baixista Flávio Coiro Dias (o Chaminé), circulava vestindo ceroulas e um penico na cabeça. Os demais, Carlos Eduardo Weyrauch (o Mutuca, primo de Carlinhos Hartlieb), Cláudio Vera Cruz, Eliana Donatelli e Português, exibiam um ar zombeteiro. Maria de Lourdes, mulher de Geraldo e cantora de seu grupo, criticou a postura do Succo e Chaminé replicou com um palavrão, ao que Geraldo partiu para cima dele com um “bife”, sendo contido por outros músicos. Nesse momento, Português acertou a cravelha de seu contrabaixo elétrico na cabeça de Geraldo. O sangue corre, ele é levado para o Hospital de Pronto Socorro. 

(Décadas mais tarde, uma testa sangrando por causa de uma pancada de uma cravelha de baixo seria fundamental para a consagração da banda Cachorro Grande num show em terras paulistas. Mas ali todo mundo era amigo e isso é assunto para outro volume.)

De volta a Juarez:

Uns 20 minutos depois da confusão, o Succo entra no palco para defender a música Nem Só de Graves Vive o Homem (era uma composição de Chaminé e Vera Cruz, mas como não eram universitários, a cantora Eliana Donatelli, estudante de Direito na PUC, a inscreveu como autora “laranja”). Uma das surpresas da “performance” seria jogar talco no grupo, e então Mutuca colocou no meio do palco o pacote de talco industrial previsto para o momento. Daí que empolgado pela música e ainda alterado pela briga, sem mais nem menos Português chutou o pacote na direção da orquestra postada no fosso em frente – o que, além de sujar os ternos pretos dos músicos, acabou com o som dos violinos. Mesmo assim o Succo foi classificado para a final. E Português, que gostara da repercussão do talco na orquestra, resolveu aprontar outra na última noite: trouxe escondida uma galinha viva e a arremessou para o público. Recém-chegado da Inglaterra, ele estava cheio de ideias malucas – na verdade nem tão malucas, pois em Roda Viva os atores jogavam pedaços de fígado cru na plateia e Chacrinha atirava bacalhau no auditório da TV.

A ironia das ironias. O caso foi parar na polícia. Era noite. Quem era o delegado de plantão? Matias Flach. Irmão de Geraldo. Que, agora em 2022, lembra divertido da história:

Passou pelo Plantão da Polícia Civil, mas ficou tudo bem. Chegou aquele burburinho. Ouvi os envolvidos e liberei todos. Anos depois Geraldo contou-me alegre que Português teve a iniciativa de entrar em contato e se desculpar pelo incidente.

Mas naquele momento, o figurino e a performance já eram desaforo suficiente para uma parte dos músicos participantes – os mais ligados à estética da MPB dos festivais: smoking e vestidos mais ou menos de gala. Só que, além disso, repetindo o feito de Gil, Caetano, Mutantes e os Beat Boys no festival da Record de 1967, eles conspurcavam o sacrossanto reduto mpbístico com blasfemas guitarras e baixos elétricos, instrumentos até então restritos aos bailes e clubes.


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O Succo em ação, no palco do festival.

Uma matéria recente (em 2022) do jornal gaúcho Zero Hora, feita pelos jornalistas Alexandre Lucchese e Fábio Prikladnicki, reconstitui a noite da final lindamente: 

Em uma noite de julho de 1969, o brigadiano Roberto Nascimento escoltou até o palco do Salão de Atos da UFRGS uma menina que usava um cinto de castidade e um homem vestido de imperador romano. Fã de cantores populares como Agnaldo Timóteo e Altemar Dutra, Nascimento foi repentinamente destacado para atuar em um dos mais provocativos e inovadores festivais de Porto Alegre. Com figurinos exóticos e musicalidade fora do tradicional, o 2º Festival Universitário da Música Popular Brasileira (FUMPB) ficou marcado como o apogeu do tropicalismo na Capital – e também como um dos mais contestadores eventos da cidade.

Os soldados do 6º Batalhão da Brigada Militar que garantiam a segurança da terceira eliminatória do FUMPB, em 11 de julho de 1969, foram convocados após a fatídica segunda noite da competição. Três dias antes, a tensão entre os músicos extrapolou o campo artístico. O compositor Geraldo Flach (1945-2011) foi parar no Hospital de Pronto Socorro, depois de levar um golpe de contrabaixo na cabeça. Logo depois da agressão, teve início uma sequência de vaias e aplausos que marcou o mais polarizado dos festivais da capital gaúcha.

(…)

A terceira eliminatória (…) e a grande final seguiram com ânimos exaltados na plateia. De um lado, estavam os defensores das toadas e canções influenciadas por ícones como Sidney Miller e Chico Buarque; de outro, os entusiastas do tropicalismo, a turma de Caetano e Gilberto Gil. (…) Além do Succo, bandas como Liverpool e o grupo que interpretava a canção Fortran IV (composta por Valdo Felinto e José Mario Bastos) – aquele com a menina de cinto de castidade e o imperador romano. Do outro lado, estavam nomes como Geraldo Flach, Nana Caymmi e Cynara, do Quarteto em Cy.

Voltemos a Juarez:

Depois de três eliminatórias, a vencedora surgiu na noite fria de 18 de julho, sem unanimidade do público: Por Favor, Sucesso, música de Carlinhos Hartlieb com inspiração tropicalista, interpretada por ele e o grupo de rock Liverpool. Em segundo lugar ficou Laís com Pela Rua da Praia, defendida pelo grupo paulista O Bando, com arranjo de Hermes Aquino. Dias antes, na Última Hora carioca, em nota reproduzida pela Folha da Tarde, o jornalista e compositor Nelson Motta apostava que Laís, “compositora que está numa linha bem próxima de Caetano Veloso”, seria um dos destaques do festival. 

Laís colocara duas canções no festival, e a segunda, Distância, era uma parceria com ninguém menos que Tom Zé e João Araújo.

Segue Juarez:

Não foi lançado disco com as 12 finalistas, em prova de desinteresse das gravadoras pelo que acontecera no Sul. Mas, no tocante aos gaúchos, Hartlieb teve sua música automaticamente classificada para o IV FIC, Flach se afirmou como compositor e Falkenberg, ao se apresentar com o recém-criado grupo A Primeira Manifestação da Peste, mesclando teatro e música com certas tonalidades regionais, prenunciou novidades para os palcos porto-alegrenses.

Dia Um, com A Primeira Manifestação da Peste, ficou no quinto lugar geral e era apenas uma das quatro (!!!) parcerias de Wanderlei Falkenberg com Luis Santana no festival, ao lado de Somos Convidados, Quarentena e 23 Horas Apartamento Seis (cujo título remete a Sílvia 20 Horas Domingo, do então tropicalista Ronnie Von).

Fortran IV, que usava o nome da mais recente atualização da linguagem usada pelos computadores, surgida em 1961, ficou em terceiro lugar, ajudada pelo arranjo escrito especialmente pelo grande maestro do tropicalismo, Rogério Duprat.

Em 25 de setembro de 1969, a primeira eliminatória do IV FIC tem Por Favor, Sucesso, com Carlinhos e o Liverpool, mais Flash, de Hermes Aquino, e Sala de Espera, de Laís Marques, interpretadas por ele, Laís e Os Cleans, mais a orquestra arranjada por Júlio Medaglia. Nenhuma se classifica para a final, mas marcam presença. Tanto que o Liverpool é contratado pela pequena gravadora Equipe e Hermes pela poderosa RGE. 

A manchete do jornal Zero Hora referente à final do festival, anunciava:

“Tropicália” venceu no Festival Universitário. 

E terminava assim:

O gênero deverá ainda alcançar grande repercussão nas mais diversas áreas da música popular brasileira.


Em 29 de agosto de 1969 se encerra a era dos festivais de MPB da cidade, com o 3º (e último) Festival da Canção Popular, agora já sem o “Sul-brasileiro”, mas fiel a seu perfil mais conservador.

Juarez:

Nas 12 classificadas não há sequer vestígios das polêmicas que dividiram o público no festival dos universitários. Lá estão nossos conhecidos Túlio Piva, César Dorfman, Sérgio Napp (com duas músicas, uma em parceria com Paulo Dorfman) e Luiz Mauro. Um dos finalistas, Valter Sobreiro Junior, concorre com a gauchesca China Rosa, China Rosa, também antecipando um tipo de música que se popularizaria a partir de 1971 com a Califórnia da Canção Nativa. O vencedor foi o sempre presente Luiz Mauro, com Chica Maria, canção praieira meio caymminiana, também classificada para o IV FIC, que seria o festival nacional com a maior “densidade” de gaúchos: quatro, todos reunidos na primeira eliminatória, realizada no Maracanãzinho em 25 de setembro. Quem são os outros dois? Justamente Hermes e Laís.

Faltou citar, entre outros, a dupla João Palmeiro/Paulinho do Pinho, com Em Porto Alegre, e Raul Ellwanger, em dupla com Telmo Kothlar, com a tropicalista Ontem, Hoje e Sempre, não interpretada por Raul porque ele já estava tão visado pelo DOPS e outros órgãos da ditadura que foi “aconselhado” a não ficar tão visível como estaria num palco de festival.

Raul escreveu um belo texto sobre esse momento, chamado A Milonga dos Vencidos:

Nervosismo no palco da Reitoria da URGS em Porto Alegre. Estamos em 1969, é o momento da apresentação da música tropicalista Ontem, Hoje, Sempre, de Raul Ellwanger. Ali estão Telminho, Nana, Paulinho, Maria Teresa, está Homerinho, estão quase todos do grupo Os Redondos, mas falta alguém. Falta o próprio compositor. O que terá acontecido?

(…)

Naquela canção que eu “não cantei” em 1969, aparece algumas vezes como co-autor Telminho Kotlhar, como garantia para o caso de eu “sumir”.

Ainda falaremos mais de Wanderlei Falkenberg. Acompanhado ou não pelo A Primeira Manifestação da Peste, que contava com o carioca Zé Rodrix, Wanderlei foi um dos primeiros tropicalistas da Porto Alegre em que Gal Costa, Mutantes e Tom Zé eram figurinhas carimbadas – sem falar que os Mutantes arrasaram em Esteio. No finalzinho da década de 70, uma parte de Porto Alegre era inequivocamente tropicalista.

Já falaremos nisso.


Fique aqui com músicas do festival de 1968:


Arthur de Faria nasceu no ano que não terminou, é compositor de profissão (20 álbuns e EPs) e doutor em Lupicínio pelas Letras da Ufrgs. Publicou Elis, uma biografia musical (arquipélago, 2015) e tá no prelo Porto Alegre, uma biografia musical, Volume 1, reunindo as primeiras colunas publicadas aqui.

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