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O amor é canibal em “Até os Ossos”

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O amor é canibal em “Até os Ossos” Warner/Divulgação

Até os Ossos (2022) talvez seja o filme mais estranho desta temporada – e estamos falando do mesmo ano em que David Cronenberg lançou seu desconcertante Crimes do Futuro. O novo longa do cineasta Luca Guadagnino mistura canibalismo explícito, romantismo exacerbado, fábula de amadurecimento e filme de estrada – surpreendentemente, o resultado dessa mixórdia deu muito certo.

Vencedor do Leão de Prata de melhor diretor no Festival de Veneza de 2022, Até os Ossos ainda rendeu à protagonista Taylor Russell o Prêmio Marcello Mastroianni de Melhor Jovem Atriz na competição italiana. Na história baseada no romance de Camille DeAngelis, a jovem Maren (Russell) vive com o pai em uma cidadezinha do interior dos Estados Unidos no começo dos anos 1980.

Depois de um terrível episódio em que morde o dedo de uma colega, a garota tem que fugir do lugar, sendo posteriormente abandonada pelo pai. Escutando uma gravação em fita cassete deixada por ele, Maren descobre a sina que a acompanha desde o nascimento: ela precisa se alimentar de carne humana para sobreviver.

Sozinha, ela parte em busca da mãe, descobrindo no caminho que existem outras pessoas com o mesmo apetite peculiar que o dela, como o misterioso e sinistro Sully (Mark Rylance) e o rebelde e intenso Lee (Timothée Chalamet) – jovem ao lado do qual Maren passa a viajar pelas estradas de Estados do meio oeste norte-americano. Ambos começam a viver então uma forte paixão, em que dividem as traumáticas lembranças do passado, os sonhos de uma vida normal a dois e os corpos das vítimas de sua fome canibal.

Warner/Divulgação

“Há algo em relação aos menos privilegiados, há algo em relação às pessoas que vivem à margem da sociedade que me atrai e me comove. Todos os meus filmes são sobre proscritos, e os personagens de Até os Ossos ressoaram em mim. Também foi interessante para mim abordar o centro-oeste dos anos 1980. A ideia do viajante, aquele que vagueia, o andarilho nesse tipo de ambiente moderno pareceu-me muito americano e um bom lugar para começar a fazer filmes nos Estados Unidos”, explica o italiano Guadagnino, completando: “Até os Ossos é um filme sobre a impossibilidade do amor e a busca por um lar. É um reflexo cinematográfico de todas as possibilidades que nos constroem como pessoas”.

Já a canadense Taylor Russell destaca a conexão de sua personagem com o igualmente outsider Lee: “Eles definitivamente se tornam uma família. Acho que essa é uma das partes mais belas disso. Conhecer alguém completamente, ver todos os seus defeitos, e ainda assim amar essa pessoa, acho que é bem raro”.

Luca Guadagnino já abordara as angústias, dúvidas e desejos da juventude em histórias de formação como no longa Me Chame pelo Seu Nome (2017), igualmente estrelado por Chalamet, e na série televisiva We Are Who We Are (2020); por outro lado, o realizador também exercitara-se no gênero terror revisitando o mestre italiano Dario Argento em Suspíria: A Dança do Medo (2018). Ao conciliar essas duas vertentes ficcionais aparentemente tão distantes – acrescentando ainda uma generosa dose de ultrarromantismo gótico –, o diretor faz com que Até os Ossos seja ao mesmo tempo perturbador por conta de seu horror gore cheio de sangue e vísceras e encantador graças ao conto de amor incondicional de dois jovens à margem da sociedade, embalado pelo pop rock de bandas oitentistas como Joy Division, New Order e Duran Duran.

Warner/Divulgação

Até os Ossos: * * * * *

COTAÇÕES

* * * * * ótimo     * * * * muito bom     * * * bom     * * regular     * ruim

Assista ao trailer de Até os Ossos:

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