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Plataforma Frequências Preciosas mapeia cantoras negras e indígenas do país

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Plataforma Frequências Preciosas mapeia cantoras negras e indígenas do país Viviane Pitaya. Foto: Gab Cerqueira

Em maio de 2020, a cantora e produtora cultural baiana Viviane Pitaya sentiu a urgência de se articular e estabelecer novas trocas para se manter ativa durante a pandemia. A partir de buscas na internet e contatos com diversas artistas de todo o país, a plataforma Frequências Preciosas ganhou vida, voltada à difusão do trabalho de cantoras negras e indígenas da cena musical independente.

“Resolvi procurar artistas como eu, negras e indígenas, para entender o que elas estavam fazendo e suas expectativas de futuro”, conta a idealizadora da iniciativa – leia a entrevista a seguir. O site do projeto reúne atualmente cerca de 50 perfis, a partir de um levantamento de mais de 500 artistas. Na aba Seja Uma Preciosa, cantoras brasileiras que se autodeclarem indígenas ou negras podem preencher seus dados e se inscrever. O perfil de Instagram e o canal de YouTube Frequências Preciosas também disponibilizam conteúdos desenvolvidos e catalogados a partir do mapeamento.

Em 2021, entre fevereiro e maio, foi realizado o 1º Congresso e Mostra Frequências Preciosas, viabilizado via Lei Aldir Blanc pelo Prêmio Anselmo Serrat de Linguagens Artísticas, da prefeitura de Salvador, com pocket shows, mesas-redondas e palestras de capacitação voltadas à gestão de projetos artísticos. A iniciativa conta ainda com uma atuação voltada à criação de identidades sonoras para marcas, que tem como objetivo aproximar cantoras e empresas.

“É importante criarmos uma rede verdadeira, com ações práticas que impulsionem nossa arte e fomentem uma cena dentro da diversidade, criando uma rede de apoio mútuo”, defende Pitaya.

Leia a entrevista a seguir.

Como surgiu a ideia do projeto?

Quando me vi diante da pandemia, fiquei sem chão. Resolvi procurar artistas como eu, negras e indígenas, para entender o que elas estavam fazendo e suas expectativas de futuro diante de toda a situação da covid-19 e de outros atravessamentos. Por meio de buscas na internet, conheci artistas incríveis do Brasil inteiro e percebi que estava fazendo um mapeamento. Comecei a publicar o material das artistas com quem entrei em contato no canal do Youtube e no perfil de Instagram que criei e chamei de Frequências Preciosas.

Nos conta um pouco sobre as trocas com as artistas nesse processo.

Quando explico sobre as Frequências e o que quero com tudo isso – difundir, visibilizar e protagonizar o trabalho das cantoras negras e indígenas da cena independente brasileira –, elas dizem que esse trabalho é de muita relevância e ficam felizes por acessar o site, fazer o cadastro e fazer parte de todo este movimento.

No Congresso do projeto, tivemos artistas do Brasil inteiro, e a troca foi muito rica. Existem muitas artistas com sede de promover redes, e esse é o nosso principal intuito. Realizamos uma mostra com a apresentação de pocket shows de seis artistas aqui de Salvador: Aiace, Iane Gonzaga, Emillie Lapa, Ivana Gaya e eu, com estilos musicais distintos, mas convergindo em estarem ali se apresentando, tendo seu momento e apreciando o trabalho das outras. Estamos construindo essa história juntas.

É importante criarmos uma rede verdadeira, com ações práticas que impulsionem nossa arte e fomentem uma cena dentro da diversidade, criando uma rede de apoio mútuo. Quando entendermos que apoiar a outra colega artista é importante, deixando de imaginar que somos concorrência uma das outras, estaremos, de fato, fazendo arte e defendendo nosso trabalho, de forma conjunta.

Há alguma iniciativa voltada para o Rio Grande do Sul, ou alguma ideia nesse sentido?

Tenho em mente realizar a Noite Preciosas, um evento itinerante que possa rodar o Brasil com apresentações de preciosas locais e de outros estados, além do nosso festival. Com certeza isso vai chegar aí no Sul, graças à jornalista e produtora Silvia Abreu, amiga que fiz virtualmente na quarentena. Ela apareceu e me mostrou várias artistas como Glau Barros, Pâmela Amaro, Jordana Henriques, Luana Fernandes, Dessa Ferreira, Monique Brito, entre outras.

A partir dessas trocas, como você vê o mercado da música para mulheres negras e indígenas na Bahia em comparação com outros estados?

Para responder essa pergunta, ainda preciso conversar com muito mais gente da cadeia musical. Comecei a desenvolver uma visão inicial através das lives que venho realizando com preciosas de diferentes estados. É uma situação muito delicada. Estamos falando de mulheres, negras, indígenas, independentes, brasileiras, cantoras, que em sua maioria não têm recurso financeiro para investir em sua própria carreira.  Vamos falar de racismo aqui? De preconceito? De que há muita artista pra pouca demanda? Esperamos o mercado nos patrocinar? Cantamos o que amamos cantar? Cantamos o que a gente acha que o mercado vai gostar? Vamos cantar em barzinho? Não vamos cantar em barzinho? Vamos pra São Paulo? É preciso ver com olhos realistas e não romantizar a situação.

Aqui na Bahia, existem muitas artistas incríveis como eu, por exemplo, mas que de repente não são interessantes para o mercado específico de quem tem dinheiro. Envolve interesses capitalistas, disponibilidade de investimento e muitas outras coisas. Daqui da Bahia saem vários artistas negres que criam tendência e que há muito tempo vinham lutando arduamente por visibilidade, mas não há tantos espaços para nos apresentarmos. 

Existem os editais que priorizam artistas negres e LGBTQIA+, e algumas marcas também estão apoiando propostas que defendem a diversidade. Esses editais, mesmo que poucos, existem, e se não existissem? Como fazer com que haja mais recursos para artistas? Onde está o suporte do governo em relação à cultura – que para mim é base pra o despertar e educação de um povo? Acredito que o Brasil todo passa por esse problema. E isso tudo pesa ainda mais quando falamos de Nordeste, Bahia…

Por fim, como o projeto se organiza para se manter ativo e ampliar seu alcance nacionalmente?

Comecei com o mapeamento, depois consegui, com ajuda da Raína Biriba, da Encruzilhada Produções elaborar, e executar o 1º Congresso Frequências Preciosas por meio do Edital Aldir Blanc – Prêmio Anselmo Serrat. Estamos desenvolvendo uma pesquisa sobre cantoras negras e a cena independente da música baiana, da nossa colaboradora Júlia Salgado, mestranda da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Em paralelo, seguimos escrevendo para mais editais. Retomamos nosso mapeamento e temos a intenção de realizar o 2º Congresso, festivais, feiras, residências, colocar nosso estande em eventos… Em breve teremos nossa lojinha virtual com venda dos nossos artigos, camisetas, adesivos entre outros, que são lindos.

Temos quatro frentes – difusão, formação, pesquisa e inovação –, além do nosso serviço de criação de identidade sonora para marcas. Vamos lançar nosso primeiro projeto-piloto, com lançamento de videoclipe, para a marca Pretinha do Bronze – laje de bronzeamento da afroempreendedora Bárbara Sacramento, de Salvador. Decidi desenvolver esse serviço justamente com o intuito de conectar marcas às nossas preciosas. Ano que vem, teremos mais lançamentos, e esse serviço promete.

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