Juremir Machado da Silva

Crônica de um verão em Paris

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Crônica de um verão em Paris Verão no Jardim de Luxemburgo, em Paris

Esse título aí em cima é excessivo: são apenas quatro dias neste verão de Paris. Durante 30 anos, quando não estava morando em Paris, vinha à capital francesa todo ano, às vezes, mais de uma vez. A pandemia interrompeu esse fluxo. Eu estava cansado também dos aviões. O voo da Azul estava bom, com embarque em Viracopos e desembarque em Orly. Agora, vida que segue, retomei as viagens por motivo de trabalho. Reunião do conselho editorial da revista científica Hermès, dirigida por Dominique Wolton e publicada pelo Conselho Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS). Não conheço muitas revistas de ciências humanas que reúnam seu conselho, formado por especialistas de vários países, duas vezes por ano.

Lula chegou antes. Fez barulho. Segundo uma jornalista, Lula é “rock-star da política”, estrema máxima no firmamento da esquerda internacional. Não por acaso, o presidente brasileiro visitou a estrela maior da esquerda francesa atual, Jean-Luc Mélenchon, considerado por muitos acadêmicos daqui como um esquerdista capaz de uma mistura quase impossível: velha guarda e nova linguagem. O pessoal socialdemocrata da França, esse time que agrupa gente de esquerda não revolucionária e até não marxista, espera de Lula uma posição firme contra Vladimir Putin. Talvez tenham de esperar sentados à sombra. O calor anda exagerado por aqui. Os franceses chamam isso de canícula. Fica mais quente ainda com esse nome. De 2014 para cá, morreram 34 mil pessoas por causa do calor.

Paris é sempre a mesma. E sempre outra. Há coisas que se recusam a mudar. Outras, parecem as mesmas, mas com o coração diferente. Por exemplo, os ônibus movidos totalmente por energia elétrica. As exposições de arte mudam de nome e trazem novidades conforme o padrão de sempre. No Senado, uma exposição do acervo de Léon Monet, irmão de Claude Monet, um empresário atilado e colecionador de arte de visão, a começar por quatros do mano Claude. Em poucas salas, uma mostra impressionante – escapou o trocadilho – do impressionismo. Para quem achar pouco, o jornal Le Monde indica outras 19 exposições “coup de coeur”, pela França toda.

Comecei a escrever um “dicionário afetivo: minha França”. Ao chegar aqui, depois de quatro anos intermináveis, minhas pernas me levam automaticamente para os lugares que fazem meu coração bater mais forte. Nada como bater um papo com Michel Houellebecq, que anda pelo interior procurando uma casa para morar, jantar com Michel Maffesoli e Hélène, passear por Montparnasse, Saint-Germain e pelo Quartier Latin, comer crepe em mesa ao ar livre e ver “les filles à bicyclettes”, como na linda canção de Charles Trenet.

O termo bike não pegou por aqui. O mito diz que francês não fala inglês. Cidade turística, Paris não é boba. Fala-se inglês para vender. Mas o parisiense tem sua personalidade forte. Tente sentar em dupla em mesinhas apartadas de restaurante. O garçom não economiza o sermão:

– Aqui não é como em casa. A gente é que instala vocês.

Doce, França!

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