Juremir Machado da Silva

Dia do patriota golpista

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Dia do patriota golpista Ataque a Brasília em 8 de janero rendeu homenagem da Câmara de Porto Alegre | Foto: Joedson Alves / Agência Brasil

O Brasil riu muito de Porto Alegre na semana que passou. Riu da ideia, aprovada na Câmara de Vereadores da capital gaúcha, de escolher para “dia do patriota” o famigerado 8 de janeiro. Como todo mundo sabe, em 8 de janeiro de 2023 houve uma tentativa de golpe de Estado no Brasil, com a invasão dos prédios dos três poderes em Brasília por hordas bolsonaristas inconformadas com a derrota do capitão nas eleições presidenciais de 2022. O prefeito Sebastião Melo ficou em silêncio. Considerou que essa lei era equivalente a outra sobre um “dia de defesa da democracia” sobre a qual também silenciara.

No mundo do relativismo político, tudo se equivale. O chavão “tudo depende do ponto de vista de cada um” tornou-se verdade absoluta. Para uns a Terra é plana; para outros, não. Os fatos e as evidências que se danem. Publicado primeiro na Matinal, o mico do “dia do patriota”, iniciativa do então vereador Alexandre Bobadra, no dia de uma tentativa de golpe, como homenagem aos golpistas, foi matéria dos mais importantes noticiosos brasileiros, inclusive o Jornal Nacional, da Rede Globo. Ficamos com um riso amarelo. Todos os clichês nos saltaram da boca: era rir para não chorar. Melhor mesmo seria chorar de raiva ou tristeza. Como foi que chegamos a esse ponto? Onde foi que nós erramos?

A resposta está na ponta da língua. Agora é tentar limpar o leite derramado e seguir em frente. Iniciativas foram tomadas para a revogação da tal lei. Comentaristas nacionais não evitaram o bordão: a Câmara de Vereadores de Porto Alegre não tem mais nada para fazer? Está faltando serviço por lá? O serviço sujo, porém, é uma exigência das ideologias. É capaz de dar até medalha. Quando não dá voto. Basta pensar na eleição do general Pazuello, fracassado ministro da Saúde no auge da pandemia, eleito como recompensa pelos maus serviços prestados à nação. Nos Estados Unidos, Donald Trump está usando a fotografia de fichado em penitenciária como material de propaganda eleitoral. Pretende ser presidente até da prisão.

Porto Alegre já apareceu no noticiário nacional por razões bem mais interessantes. O mais triste ainda é que o escândalo do dia do patriota em 8 de janeiro estourou em 25 de agosto, data em que lembramos do episódio da Legalidade, quando Jânio Quadros renunciou à presidência da República, ministros militares tentaram impedir a posse legítima do vice, o gaúcho João Goulart, e o governador do Rio Grande do Sul de então, Leonel Brizola, comandou a resistência ao golpe em curso, armado de microfone de rádio e de metralhadora. Naqueles dias, golpista não se criava por aqui.

O mico foi tão grande que a Câmara de Vereadores correu para revogar a lei na segunda-feira. Ufa!


Tambor tribal (Professores eméritos da PUCRS)

Na última quinta-feira, 24 de agosto, a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul homenageou ex-docentes com o título de “professor emérito”. Antigos pró-reitores, direitos de unidades e professores de longos anos na universidade foram condecorados numa cerimônia calorosa e emocionante. A Escola de Artes, Design e Comunicação (Famecos) destacou quatro nomes fundamentais da sua história: Doris Haussen, criadora do nosso Programa de Pós-Graduação em Comunicação; João Brito, professor de rádio e coordenador do departamento de jornalismo por muitos anos; Elaine Machado, nossa querida Neka Machado, um dos pilares do curso de Relações Públicas por décadas; e, in memoriam, Roberto Porto Simões, um craque das Relações Públicas, parceiro no PPGCOM por bons anos de alegria e construção. Na foto de Gordano Toldo podemos ver esse time de professores inesquecíveis, gente com quem convivemos e trabalhamos e de quem guardamos boas lembranças:


Parêntese da semana

“Parêntese #189: Ver a cidade”. Luísa Kiefer: “Quem anda pela cidade, e nem precisa ser a pé, desde que seja prestando atenção ao redor, certamente já reparou na quantidade enorme de obras da iniciativa privada. Casas de esquina que invariavelmente viram farmácias, academias ou petshops. Todas feitas de concreto pré-moldado, rápidas de serem erguidas, econômicas nos materiais, pasteurizadas em sua aparência. Esse assunto é tão extenso, e instigante, que fica difícil de resumir. Mas, Tiago Medina conseguiu! Para aqueles que, como eu, andam vendo o que se passa com a cidade, sua crônica vai fazer sentido. Para os que ainda não pensaram muito sobre isso, talvez cumpra o papel de abrir os olhos”. É hora de pensar a cidade que queremos.


Frase do Noites

O iluminista reage aos golpistas de Porto Alegre citando ironicamente um verso do grande Cesar Vallejo: “Hay golpes en la vida, tan fuertes… ¡Yo no sé!”. E diz mais: “Perdeu, mano, aceita que dói e envergonha menos”.


Imagens e imaginários

No Pensando Bem, que vai ao ar todo sábado na FM Cultura, 107,7, numa parceria da Cubo Play com Matinal e revista Parêntese, com apoio da Adufrgs, Nando Gross, Luís Augusto Fischer e eu conversamos com Tabajara Ruas, patrono da Feira do Livro de Porto Alegre de 2023. Escritor, jornalista e cineasta, Tabajara é um dos grandes do Rio Grande do Sul. Na entrevista, fala dos seus tempos de exílio na Dinamarca, dos seus livros e filmes e do seu amor pela cultura e do seu interesse por personagens da nossa história.


Escuta essa

Que tal ouvir um hino, caros leitores? O hino da Legalidade, recomendado para quem aprova lei de patriotismo em homenagem aos golpistas de 8 de janeiro. Tomem tento, pessoal, aprendam alguma coisa:


Do leitor

Olá Juremir,

Li sua coluna na Matinal (e também o post do Juarez Fonseca) sobre o evento em que o governador apresentou sua prestação de contas. Infelizmente não pude estar presente – o que seria um dever para conselheiros de cultura do Estado, como eu – pois o evento coincidiu com nossa reunião ordinária semanal. Não posso afirmar que foi de propósito, mas a secretária sabe que nos reunimos todas as sextas de manhã. Faço dois reparos, com base em dados.

Primeiro, envio um singelo gráfico que montei com os dados disponíveis no portal de transparência do próprio governo. A única edição que fiz foi descontar, do gasto em cultura de 2020, os 74 milhões da Lei Aldir Blanc, por se tratar de dinheiro do orçamento federal, que o Estado apenas recebeu e passou adiante.

Não é difícil de ver que no último quadriênio se gastou MENOS com cultura, proporcionalmente ao total da despesa do Estado, que no governo Sartori. Além disso, pelos dados de 2013 e 2014, pode-se suspeitar que no governo Tarso se gastou mais do que nos dois que se seguiram. Mas faltam os dados de 2011 e 2012 no portal, infelizmente. Observe, ainda, o grande aumento ocorrido no ano eleitoral de 2022.

Sobre os recursos incentivados (a “LIC”), o limite anual disponível anunciado de R$ 70 milhões realmente seria o maior valor absoluto da história, porém é menor do que os valores de 2001 a 2005 corrigidos pela inflação (esses dados, infelizmente não publicados pelo governo, me foram passados pelo diretor de fomento da Sedac, por email, há anos). Além disso, o valor efetivamente captado em 2022 (quando TAMBÉM foi amplamente divulgado o teto de R$ 70 milhões), foi na verdade de aproximadamente R$ 58 milhões, conforme ofício ao Conselho, assinado pela própria secretária, em anexo. Finalmente, segundo foi informado por parlamentares em audiência pública na Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia, no dia 4 de julho ainda não tinha sido enviada ao Legislativo a proposta do Executivo para oficializar o valor anunciado (talvez tenha sido enviado depois).

Grande abraço,
Alvaro Santi

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