Juremir Machado da Silva

Drummond ataca Jango

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Drummond ataca Jango Foto: Divulgação / Dossiê Jango / ABr

Carlos Drummond de Andrade, cronista do Correio da Manhã, aparece em livro de Thereza Alvim sobre o golpe de 1964 com quatro textos. Três deles absolutamente insossos, em cima de muro, medíocres. Na melhor das hipóteses, tentando fazer algumas críticas pelas bordas, mas de forma tão sinuosa que não atingiu objetivo algum.

No quarto texto, “Hora de provar”, mais do que atacar a ditadura em implantação, investe contra João Goulart com os mesmos argumentos dos novos donos do poder. Começa dizendo que é “preciso muita lucidez, muita polícia íntima, para que o presidente se ponha no seu lugar, aparentemente mais alto de todos (…) Evidentemente faltavam ao Sr. João Goulart qualidades primeiras para investidura tão delicada. A continuação é mais um aval ao regime militar do que um manifesto de resistência: “Mas ele [Jango] chegou à perfeição de fazer um não-governo, irresponsável e absurdo, de que o bom senso, a ordem intelectual e a ordem física se tornaram ausentes. Fez tudo que era possível para não obter as reformas que preconizava e que ele mesmo não sabia quais fossem até o momento em que seus assessores lhe ministraram os figurinos mal recortados”. O poeta apoiou o golpe.

Drummond esbalda-se em críticas a Jango: “Não haverá jeito para o Brasil? Mas no caso do Sr. Goulart a verdade é que ele pediu, reclamou, impôs sua própria deposição. Que fazer quando o servidor-presidente se torna inimigo maior da tranquilidade? Esperar que ele liquide a ordem legal…?

A tranquilidade de quem, cara pálida? Os golpistas ficam absolvidos pelo poeta. Afinal, Jango “impôs sua própria deposição”. Com um resistente assim não há ditadura que se preocupe. O poeta – nesse texto de 4 de junho de 1964, já com os efeitos devastadores da “Operação Limpeza” denunciados por seu colega de Correio da Manhã, o incontido Márcio Moreira Alves – atrapalha-se com as palavras. Diz que Jango “reivindicou posições democráticas através de atitudes antidemocráticas” e espera dos militares, que derrubaram a democracia com um golpe e impuseram uma ditadura, a prova de que “reformas democráticas substanciais podem ser feitas” Adverte: “Se o Congresso não entender assim, e abismar-se em perplexidades ou contemporizar, não terá perdão. E voltaríamos a isso que foi varrido nos últimos dias”.

A democracia é que fora varrida dois meses antes.

Paradoxalmente alguns dos textos mais claros na oposição ao golpe e ao regime são de Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde), era moda usar pseudônimos, depois seria necessidade, um liberal católico alojado no Jornal do Brasil. Ele colocou o dedo na ferida provocada pelos coturnos. Em 25 de junho de 1964, em “Revolução dos bem-pensantes”, escreveu: “Assim como nunca acreditei que estivéssemos ameaçados por um regime comunista e sempre vi no anticomunismo sistemático uma hábil manobra do direitismo político para alcançar o poder – também não creio na possibilidade agora de um regime fascista ou fascistizante” Acertou em cheio na primeira parte. Não errou na segunda. O regime não seria fascista, mas ditatorial, terrorista, autoritário e violento. Na época, fascismo era um conceito.

Do meu livro 1964, golpe midiático-civil-militar (Sulina).

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