Juremir Machado da Silva

Compra secreta de livros

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Compra secreta de livros Foto: Vanessa Silva/PMPA

A equipe do Matinal deu um belo “furo” jornalístico na última sexta-feira: a Secretaria da Educação de Porto Alegre comprou mais de R$ 9 milhões em livros de um fornecedor único paranaense, sem licitação e sem consultar escolas e especialistas da área. Comprar livros é ótimo. Por que, contudo, adquirir um pacote pronto sem dar oportunidades a editores de oferecer o que têm em seus catálogos? Autores gaúchos foram ignorados. Pagou-se o melhor preço? O preço justo? Os títulos comprados são os melhores para o público em questão? O negócio, conforme a reportagem de Demétrio Jorge, tem muitos pontos obscuros. Entre os títulos adquiridos há muitos em domínio público.

A empresa Inca Tecnologia, que vendeu os livros, segundo a matéria, está sendo investigada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) pela venda de R$ 912 milhões, com um tipo de licitação simplificada, de aventais para o Ministério da Saúde. É só rolo: noutro negócio, a mesma empresa aparece “envolvida com a venda, com suspeitas de superfaturamento, de R$ 66,8 milhões de livros para o governo do Amazonas em agosto deste ano”. No jargão do setor, a prefeitura de Porto Alegre “pegou carona” num pregão de Sergipe. Qual a pressa em comprar sem licitação de Sherlock Holmes a Calvin e Haroldo? Sim, há também Machado de Assis e José de Alencar. A compra chamou a atenção da Comissão de Educação da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, que pediu esclarecimentos.

A resposta foi assinada pelo próprio prefeito Sebastião Melo e tem como detalhe curioso usar trechos copiados e colados do site da empresa vendedora. A reportagem do Matinal foi meticulosa: ouviu as partes envolvidas, pediu parecer de especialista em licitações, investigou cada detalhe. Toda vez que dinheiro público é usado com pressa e queimando etapas é preciso levantar o véu que pode encobrir tais processos. Por que comprar livros de um atravessador se normalmente é possível adquiri-los das editoras, ainda mais quando em grandes quantias, por preços mais em conta? Pagar R$ 41 reais por exemplar é condizente com a ideia de menor preço? O vereador Jonas Reis (PT) encaminhou denúncia ao Ministério Público de Contas. O caminho corriqueiro seria fazer licitação e ouvir escolas.

Demétrio Jorge mostra em sua reportagem que o Tribunal de Contas deu uma freada numa compra similar em Pernambuco. Diante de tudo isso, eu me transformo numa usina de perguntas: Por que comprar sem licitação quando se pode fazer com? Por que pegar pacote pronto quando se pode escolher? Por que não ouvir a comunidade envolvida quando ela tem muito a dizer? Por que excluir a cultura de um Estado quando se pode contemplá-la? Por que ter pressa quando é possível fazer com calma? Por que privilegiar um fornecedor quando daria para negociar com muitos? Por que fazer em silêncio quando se poderia e deveria dar ampla publicidade? Por que favorecer um fornecedor quando tantos estão disponíveis e nem ficaram sabendo de que haveria compra de livros por um organismo público? Há muito para explicar e esclarecer.

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