Juremir Machado da Silva

Jornalismo e internet

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Jornalismo e internet Foto: Freepik

Não se trata apenas de jornalismo na internet, mas da relação entre jornalismo e internet. Muitas teses são possíveis. Uma delas, negativa: internet e jornalismo são incompatíveis. Outra, positiva: internet amplia infinitamente o campo das possibilidades jornalísticas. Como suporte, a internet suplanta os limites do papel e das frequências de rádio e televisão, implodindo monopólios e superando o poder do dinheiro. Todo mundo pode arriscar. É de jornalismo, porém, que se fala? No vasto mundo da internet, onde se abrigam as redes e as mídias sociais, que têm comportamento de onda, sendo um pouco rede, um pouco mídia, brilham as marcas fortes. Podem ser as marcas já constituídas no mundo pré-internet: Globo, Folha de São Paulo, Estadão, ou marcas pessoais ou institucionais surgidas com a rede mundial de computadores. O que faz uma marca ser forte?

Duas hipóteses: um diferencial aleatório; ou um diferencial de radicalização. Mais fácil apresentar exemplos: o sucesso do Luva de Pedreiro veio de uma diferencial aleatório. Com poucos meios, criatividade, talento com a bola e vídeos muito colados na simplicidade da sua vida cotidiana, ele viralizou. Só depois foi apropriado por agentes para organizar sua carreira, parasitar um tanto e talvez domesticá-lo até esgotar seu potencial de espontaneidade. O diferencial por radicalização é o que acontece, por exemplo, no campo da política, com blogs, canais de youtube, contas no instagram, no tiktok, no twitter, enfim, em que alguém radicaliza seu ponto de vista para colar no imaginário de algum grupo. Foi o que ocorreu no Brasil ao longo da ascensão do bolsonarismo. O “terça livre” de Allan dos Santos representa bem esse diferencial por identificação na radicalidade. Nas redes sociais, só cresce o que tem pegada forte.

O jornalismo como ponderação, reflexão, moderação, pluralismo, espaço ao contraditório, tudo o que caracteriza a atividade, sofre para se impor nesse meio adverso ao caminho do meio. Ingênuos acham que o problema está na qualidade do que é produzido. A imagem do vídeo não está bem, a luz é deficiente, o som não ficou totalmente audível. Surgem as empresas que pretendem agenciar jornalistas para que seus produtos fiquem tecnicamente mais apresentáveis. Chama a atenção que, em geral, quer-se pagamento pelo serviço, não uma sociedade nos ganhos. Muita gente aposta e, mesmo tendo algum avanço, não decola. O diferencial não acontece por esse meio. Qualquer pessoa com paciência e boa vontade aprende a usar qualquer ferramenta desse jogo. Sempre haverá quem aumente o tamanho da dificuldade para vender facilidade.

Não quero dizer com isso que o conhecimento técnico não seja importante nem que não existam profissionais capazes de tornar melhor tecnicamente qualquer material a ser difundido. Longe disso. Sugiro somente que o diferencial, aquilo que pega alguém, não se dá por aí. O desafio do jornalismo e dos jornalistas que não querem fazer entretenimento nem produzir diferencial pela radicalização é enorme. Precisam domar um público num cenário bravio, agreste, selvagem. Ainda mais quando não pretendem oferecer serviços específicos como “aprenda a investir” e outros do gênero com muitos seguidores. O jornalismo de opinião, análise e interpretação enfrenta o desinteresse por algo considerado num espaço de alta voltagem emocional como sem vitalidade.

No jornalismo clássico a informação deve ser dada imediatamente. Exemplo: Título: “Messi deve fechar com Corinthians”. Linha do apoio: “Estrela argentina do PSG surpreende e aceita contrato com clube brasileiro”. Na técnica jornalística da internet fica assim: Título: “Estrela do futebol mundial vai jogar em grande clube brasileiro”. Linha de apoio: “Jogador que atua em potência do futebol europeu está acertado com time brasileiro de grande torcida”. O esclarecimento virá no lead, no primeiro parágrafo? Não. Para manter o leitor mais tempo conectado, a informação será retardada o maior tempo possível. Por que a informação não vai no título? Para forçar a curiosidade do leitor e obrigá-lo a clicar no link oferecido. Não é esse, contudo, o grande problema. O essencial está em como cativar um público sem sair das quatro linhas da racionalidade analítica, interpretativa e opinativa.

Em poucas palavras, sem apelar. Eis a questão.

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