Juremir Machado da Silva

Quero que tudo vá pro espaço

Change Size Text
Quero que tudo vá pro espaço Foto: Divulgação Inspiration4 Crew

Deve ser muito difícil ser rico. Muito rico. Imagino o desespero do rico tendo de encontrar algo para fazer que não seja ganhar mais dinheiro, nem comer ou beber demais, para não ficar doente. Pobre do muito rico, tem tudo na mão, todo desejo prontamente satisfeito, salvo, muitas vezes, o talento desejado, que até pode tentar comprar, mas nem sempre encontra no tamanho certo. Ser pobre é dureza. Ter o suficiente para viver pode ser muito interessante. O resto seria construção, o tal de correr atrás, que faz a vida ter gosto. O muito rico, coitado, pode comprar tudo, um nariz novo, músculos novos, tudo. Se não compra a felicidade, manda buscar ou culpa alguém pela falta.

Afinal, por que esse papo? Assim, de repente, implicar com os muito ricos com essa ironiazinha barata. Qual é? Eu penso nos perrengues dos muito ricos. Alguns se enfiam num BBB da vida por um pouco de emoção. A visibilidade tem preço. Há quem queria ter muitos seguidores em redes sociais. Na pressa, compra-se um bocado de “amigos” para incentivar a largada. Cheguei a conclusão de que vida de muito rico é chata depois de constatar que não é o pequeno o número dos aquinhoados pela grana querendo dar uma volta no espaço. Não perderei tempo dando os nomes, alguns dos quais eu nunca tinha ouvido falar, o que não tem a menor importância, pois ricos não fascinam.

O que me fascina é a ideia dos ricos sobre o espaço. O que eles buscam no espaço? A minha hipótese peca pela total falta de originalidade: eles buscam distinção. Fazer algo que está fora do alcance dos demais. Bota fora de alcance nisso. Por mais que se espiche o braço, ainda está longe. Deve dar um tesão danado pensar que pouquíssimos farão aquilo. Observo treinadores de futebol tomando chuva e penso: deve ser afrodisíaco ganhar, como Guardiola, mais de dez milhões de reais por mês e enfrentar a intempérie. Pelo quê? Pela sensação de ser único. Explico: o único que com tal salário se submete a tais condições de trabalho. O Guardiola não toma chuva? Se não toma, aí já é coisa de louco. O Felipão toma. E grana não lhe falta.

Não acho que o principal seja estar lá em cima. Fundamental é pensar que os outros estão aqui embaixo. Rasteiro demais? Provavelmente. A distinção é um modo de explicação raso com índice de acerto superior a noventa por cento. Eu quero que tudo vá pro espaço, isto é, que todo bilionário tenha seus quinze minutos fora do ar. Nós, pobres, não entendemos os muito ricos. Dizemos que, se ganhássemos na loteria, jogaríamos tudo para cima e deu. Pois é, eles se jogam para cima. Mas tudo o que sobe ainda há de cair. De volta, o que fazer? Arranjar outra bizarrice para matar o tempo e se separar do lote.

Li o nome do mais recente bilionário a comprar passagem para o espaço. Não me lembro a sua graça. Foi na hora em que eu consultava, no site da rodoviária, o preço da passagem para Palomas, via Dom Pedrito. Posso afirmar que essa coincidência não afetou a minha leitura sobre a melancolia dos muito ricos. Que vão todos pro espaço!

RELACIONADAS

Esqueceu sua senha?

ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.
ASSINE E GANHE UMA EDIÇÃO HISTÓRICA DA REVISTA PARÊNTESE.