Vitor Ramil, intérprete do pampa
Ninguém interpreta o Rio Grande do Sul do pampa com mais poesia, sofisticação e profundidade do que Ramil. Eu me arrepio cada vez mais à medida que penso mais na querência. Não deixa de ser incrível que um artista tão modernamente arrojado, cantando, como no caso, a vida rural, o imaginário de um Rio Grande do Sul agropastoril, consiga encantar um público urbano. A explicação deve estar em palavras como talento, sutileza, autenticidade, arte, poesia. Ramil falou durante o espetáculo sobre a sua admiração pelo poeta gaúcho João da Cunha Vargas (1900-1980), de quem musicou todos os poemas, lamentando que ele não tenha escrito mais. João da Cunha Vargas foi um homem simples, de pouca instrução formal, nascido no interior de Alegrete. Glênio Fagundes publicou, em 1981, “Deixando o pago: poesias xucras”, doze poemas desse criador que carregava sua arte na memória e pronto.
No tempo do virtual, Ramil se diz um dos “últimos a ainda criar objetos físicos”. Talvez essa sua metáfora para suspender uma arte que traduz a mais profunda imaterialidade do imaginário, essa força do impalpável como realidade concreta que se afirma sobre o etéreo.
Ao final, o show de Vitor Ramil, que teve disponibilidade para autografar um caderno de notas, acompanhado de um CD, para fãs felizes da vida, teve um necessário momento político, um “Lula lá” estrondoso. Barberena me convidou para abraçar Ramil no camarim. Não fui. Sou tímido. Mas não escondo que fiquei feliz com a mensagem de Ramil me convidando para o show. A primeira vez que ouvi Vitor Ramil ao vivo foi no Teatro da OSPA, na avenida Independência. Um dos porteiros, assim se falava, do teatro era nosso amigo, especialmente dos meus amigos alegretenses, e nos deixou entrar. Éramos estudantes duros e com muita sede. Esse porteiro para nós era Clebinho. Hoje, ele é Cleber Xavier, braço direito do professor Tite na seleção brasileira.
[Continua...]