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Matinal inicia projeto na Cruzeiro

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Matinal inicia projeto na Cruzeiro Lideradas por Adélia (de vermelho), mulheres transformaram escola abandonada em ONG | Fotos: Marcela Donini

A demanda era por ensino médio, turno integral e EJA na escola estadual ao lado do postão da Cruzeiro, zona sul de Porto Alegre. Mas o que a comunidade ganhou foi o fechamento da instituição pelo então governador José Ivo Sartori, em 2018.

Lideranças da região procuraram vereadoras e deputadas para tentar reabrir a escola Alberto Bins na época, sem sucesso. O local acabou invadido por pessoas em situação de rua, principalmente usuários de drogas.

“Decidimos ocupar e devolver para comunidade o que o governo tirou”, conta Adélia Azeredo Maciel, que, ao lado de outras moradoras da Cruzeiro negociou a saída dos “craqueiros”. Liderado pelas mulheres, um mutirão que durou dias conseguiu limpar e recuperar parcialmente o espaço, que, hoje, cinco anos depois do fechamento da escola estadual, virou referência na região. O endereço abriga a sede do coletivo Preta Velha, ONG criada em 2020.

É por meio dessas mulheres que a Matinal chega à Cruzeiro para implementar o projeto Pé no Chão: jornalismo investigativo local pautado com a comunidade, que já está em andamento no Morro da Cruz desde junho deste ano. O objetivo da iniciativa é fortalecer a relação e criar um canal de comunicação direto com a população, a fim de aumentar o impacto das reportagens. 

Além de visitas, o Pé no Chão usa o recurso do WhatsApp Comunidades para criar grupos específicos para cada região. Ali, os moradores podem enviar sugestões de pauta e relatos sobre os problemas. Assim, conseguimos também monitorar mais facilmente o andamento de algumas histórias já publicadas.

Onde o Uber não chega

Jornalistas da Matinal já fizeram duas visitas à Cruzeiro para ouvir as demandas das moradoras, e as primeiras produções já estão em andamento. No encontro desta semana, eu, a diretora de jornalismo e conteúdo, Silvia Lisboa, e a repórter e social media Júlia Barth fomos recebidas por Lucimara Azeredo Maciel, filha da Tia Adélia, presidente da ONG. 

Uma fala da Luci, nascida e criada na Cruzeiro, me marcou: “Coisas que eram naturais para mim, como a violência, eu só fui perceber que não eram ‘normais’ em outros lugares”, disse ela, que trabalha na Fundação de Proteção Especial (FPE), localizada no Centro Histórico.

Na primeira vez que estive na sede do Preta Velha, fui de Uber, mas o aplicativo levou o carro a um ponto distante algumas quadras do destino final. Avisei o motorista que não estávamos no lugar certo e ele me explicou que a empresa indicava a região como área de risco e, por questão de segurança, orientava os motoristas a não adentrá-la. Mas ele acabou me levando ao endereço correto, gentileza com a qual os moradores não podem contar.

Quando precisam de uma corrida de aplicativo, chamam um carro da 99, ou caminham um pouco para fora da tal área de risco, um transtorno que já foi naturalizado pela comunidade – e que significa muito pouco perto de tantos direitos negados a quem vive nessa e tantas outras periferias de Porto Alegre.

Deputada estadual Bruna Rodrigues (de blusa preta) visita a sede da ONG

Mas a Cruzeiro é muito mais do que a violência a que seus moradores são submetidos diariamente, seja pelo tráfico ou pelo poder público. Do bairro, saiu Bruna Rodrigues, a deputada negra mais votada do Rio Grande do Sul. No Preta Velha, tem atividade física, oficina de costura, roda de conversa para meninas adolescentes, e muitos planos para outros serviços, tudo sem custo.

A ONG quer ser um lugar de capacitação e conexão entre os moradores da região para que um novo futuro possa ser desenhado, especialmente para os seus jovens. Esperamos poder contribuir para essa nova realidade.

Ajude o coletivo Preta Velha

Você pode fazer uma doação de qualquer valor por Pix (chave CNPJ 47083953000124). Ou levar itens na sede, que fica na Rua Gabriel Camargo Fialho, 50.


Marcela Donini é editora-chefe da Matinal.
Contato: [email protected]

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