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Prefeitura aumenta repasse para escolas credenciadas, mas não soluciona déficit no ensino infantil da capital

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Prefeitura aumenta repasse para escolas credenciadas, mas não soluciona déficit no ensino infantil da capital Anúncio foi feito na segunda-feira em auditório da Santa Casa | Foto: Pedro Piegas/PMPA

Segundo dados oficiais, faltam cerca de 4,5 mil vagas de educação infantil em Porto Alegre – o número, entretanto, pode ser muito maior

O prefeito Sebastião Melo (MDB) anunciou ontem um reajuste de mais de R$ 41 milhões no repasse às escolas de educação infantil conveniadas com a prefeitura. O objetivo é ampliar e qualificar o serviço, diminuindo o déficit de vagas na capital. As medidas, no entanto, não solucionam o problema: cerca de 4,5 mil crianças ainda estão fora da escola na capital.

O executivo municipal também prometeu a equiparação salarial entre os funcionários das chamadas organizações da sociedade civil (OSCs) com os da rede pública municipal. 

O anúncio foi feito em uma reunião extraordinária do Fórum Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, com o conselho que trata do mesmo tema, com a presença do prefeito e do secretário de Educação, José Paulo da Rosa.

Atualmente, mais de 21 mil crianças de zero a 5 anos são atendidas por 219 OSCs conveniadas com a prefeitura – um número de escolas três vezes maior do que as que compõem a rede própria do município. Com a medida, o prefeito quer ampliar a oferta.

“Para fazer isto, tenho dois pedidos que precisam ser atendidos por vocês, senão eu tenho que rediscutir o assunto”, prometeu o chefe do executivo à plateia, composta sobretudo por gestores das organizações da sociedade civil conveniadas com o município. “Para atender o que vocês estão pedindo, vocês vão me garantir que vão ampliar vagas. Essa é a primeira contrapartida. A segunda é a qualificação. Melhorar mais ainda o que fazem bem”, disse Melo.

Outro anúncio tratou da equiparação salarial entre profissionais da rede conveniada e professores do município. Atualmente, as OSCs contratam docentes como “técnicos de desenvolvimento infantil”, cargo que tem piso de remuneração em R$ 1.946,70. Esses quadros passarão a ser contratados como professores de fato, com remuneração mínima de R$ 3.040,80. O reajuste será parcelado entre 2024 e 2029 e ao final representará um aumento de 25,8%. 

Ao anunciar a mudança, Melo foi aplaudido por gestores que lotavam o auditório da Santa Casa de Misericórdia, onde ocorreu a reunião. O prefeito foi ovacionado também ao mencionar que uma das origens da falta de vagas é a matrícula por parte das famílias de renda mais alta. “Muitas dessas pessoas tinham condições de pagar, mas estão tirando a vaga de alguém lá da vila”, afirmou. “A lei diz: acesso universal independente de renda. Eu não concordo com isso”, completou o prefeito.

José Paulo da Rosa, secretário à frente da Smed desde julho de 2023, disse que seu objetivo é “resolver o problema do déficit de vagas da educação infantil”. Ele afirma que a prefeitura trabalha com o número de cerca de 7,5 mil crianças fora da escola na cidade, mas que 3 mil foram recentemente atendidas com interferência judicial – restando, portanto, 4,5 mil crianças desassistidas.

“Pelo menos 1.500 eu gostaria de ampliar com novas OSC ou atuais. Já abrimos um edital, em dezembro, e devemos abrir novas possibilidades, e gostaria de contar com vocês para abrir mais vagas, para diminuir esse déficit”, disse o secretário aos gestores. Ele atribui o déficit à diminuição da renda das famílias com a pandemia, ao fim do oferecimento de educação infantil por parte do governo estadual e à mudança de legislação referente às idades escolares, que tornou obrigatória a matrícula das crianças a partir dos 4 anos de idade. “Isso é histórico, não deste ano. Desde 2017 ou 2018, o número chega sempre perto das 7 mil vagas de déficit”, diz o secretário.

Recurso insuficiente 

Para a presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), Carolina Aguirre, o reajuste dos repasses às OSCs foi uma “etapa concluída” em um processo mais longo de negociação, e que, a despeito de necessidades ainda existentes, foi possível “avançar bastante”. “O recurso é insuficiente dado o tamanho da demanda, mas cada percentual que se agrega melhora a qualidade do serviço”, afirma.

Em relação ao déficit de vagas, Carolina explica que é um dado volátil. Em fevereiro, a prefeitura havia informado que haviam 7.540 vagas em espera, com 1.860 judicializadas, 168 com acordo com a Defensoria Pública e 289 contratualizadas com a rede privada, restando 4.877 crianças sem atendimento. Foram prometidas mais 1.500 vagas na rede credenciada em edital de dezembro, mencionado pelo secretário de Educação.

“Esse número da prefeitura se refere às famílias que buscaram o atendimento, acredito que há ainda muita necessidade de vagas, de pessoas que nem chegaram a buscá-las. Isso é algo bem significativo. Essa demanda é ainda muito grande em Porto Alegre. Precisamos ampliar as parcerias, ampliar a educação infantil”, diz Carolina.

Regiões periféricas como o Partenon, a Restinga e a Lomba do Pinheiro, observa Carolina, são as mais afetadas pela falta de vagas. “São lugares que crescem em população, mas cujos serviços públicos precisam ser ampliados”, avalia.

Em novembro do ano passado, a prefeitura trabalhava com uma demanda de 6,3 mil vagas. Um levantamento da Matinal, entretanto, revelou que o déficit chegava, naquele momento, a 12,3 mil vagas. O cálculo cruzou dados do Censo Escolar de 2022 e informações do IBGE com o total de matrículas em todas as escolas da cidade, públicas e privadas, e considerou ainda o compromisso com o Plano Nacional de Educação (PNE), que prevê, para este ano, a universalização da educação infantil para as crianças de 4 a 5 anos e creche para pelo menos metade das crianças até 3.

Para a vereadora Mari Pimentel (sem partido), uma das vozes da Câmara Municipal mais críticas à condução da prefeitura na educação, o aumento do repasse é uma notícia importante, mas há ressalvas. “Esse anúncio foi feito tardiamente. Temos três anos de governo, três anos de falta de vagas, três anos em que sobra dinheiro na educação. Só agora vem esse edital para cadastrar somente 1.500 vagas. Vemos, entretanto, com bons olhos, que realmente esse reajuste seja implementado o mais rápido possível”, completa.


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