Reportagem

Auditoria do TCE alertou para “desperdício de dinheiro público” em compras da Secretaria de Educação do governo Melo

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Auditoria do TCE alertou para “desperdício de dinheiro público” em compras da Secretaria de Educação do governo Melo Melo conduziu reunião do gabinete de crise da Smed na última semana | Foto: Mateus Raugust/PMPA

Auditores tentaram impedir aquisição com dispensa de licitação de R$ 14,4 milhões em kits didáticos, mas prefeitura já havia recebido parte dos materiais. MPC pede abertura de sindicância contra servidores, e MP também abriu investigação sobre compra suspeita

Um processo sobre irregularidades na compra sem licitação de R$ 14,4 milhões em kits didáticos pela Secretaria Municipal de Educação (Smed) de Porto Alegre tramita desde setembro de 2022 no Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS). O alerta veio de auditores que viram “potencial dano ao erário” na aquisição de materiais fornecidos pela MindLab, uma multinacional israelense que vende um método de aprendizagem baseado em jogos de raciocínio.

Em dezembro, o Matinal trouxe à tona a contratação suspeita pela Smed e mostrou que o material chegou de surpresa a 54 unidades escolares da Capital. Além disso, especialistas criticaram a escolha da empresa e questionaram a utilidade do uso dos kits na rede pública de ensino. Hoje, nove meses após a contratação, parte desses materiais está abandonada e sem uso em escolas municipais, segundo revelado pelo jornal Zero Hora na última terça-feira, dia 6 de junho.

Na época da abertura do processo, auditores do TCE pediram a suspensão da compra, mas o governo Melo disse já ter assinado o contrato e recebido “parte significativa do material”, conforme uma resposta da Procuradoria-Geral do Município (PGM) que pediu a extinção da ação. Como já havia sido realizada, a aquisição não pôde ser barrada. A apuração do tribunal, porém, seguiu. 

Segundo o alerta da auditoria, a contratação foi feita com base no argumento de que a MindLab seria a fornecedora exclusiva de um método de “altíssimo nível de especialização e particularidade”, o que dispensaria a concorrência. Os auditores, no entanto, relatam que a Smed foi genérica ao justificar a compra e incapaz de comprovar “a exclusividade e relevância pedagógica dos materiais”.

A própria PGM havia feito um alerta semelhante antes da pasta concretizar o negócio. “A equipe técnica deve atestar expressamente que não existem outros kits pedagógicos de outras marcas que possam ser utilizados em substituição dos itens pretendidos”, alertou o procurador municipal Roberto Mota à época.

O alerta inicial da auditoria do TCE alertou também para uma outra dispensa de licitação arriscada, de R$ 11,1 milhões para a compra de jogos, mobiliário e livros didáticos. Essa aquisição, no entanto, não foi levada adiante pela prefeitura e acabou descartada do processo. 

Descontrole de gastos na Smed

De acordo com a auditoria, além da compra suspeita, existe também um contexto financeiro na Smed que gera “um esforço para o gasto” com o risco de recursos serem desperdiçados. O cenário é causado por despesas educacionais represadas no período mais crítico da pandemia da covid-19 e que foram integradas ao orçamento dos anos seguintes. Uma regra federal do ano passado obrigou os governos a incorporarem o que não foi gasto no setor em 2020 e 2021 às despesas de 2022 e 2023. 

Como a pasta não tem atingido o piso obrigatório de investimentos em educação imposto pela Constituição nos últimos anos, há um “expressivo orçamento disponível” e um contexto propício “para o perigoso caminho do desperdício de dinheiro público ou no mínimo fora das necessidades mais prementes das demandas sociais nevrálgicas”, segundo os auditores. Em 2021, por exemplo, a Prefeitura investiu 12,6% da receita municipal na educação, diz a auditoria – o mínimo constitucional é o dobro disso, 25%.

Em entrevista à Rádio Gaúcha nesta quinta, dia 8, no entanto, o prefeito Sebastião Melo defendeu as compras sem licitação e culpou escolas, diretores e professores pelo não uso dos materiais adquiridos sem concorrência ou consulta à comunidade. Hoje, o processo no TCE já conta com um parecer do Ministério Público de Contas (MPC) assinado pelo procurador-geral Geraldo da Camino no fim de maio. 

No documento, o MPC pede a abertura de sindicância contra os servidores responsáveis pela compra sem concorrência e recomenda que o prefeito Melo crie modos mais eficazes de se monitorar projetos pedagógicos usados na rede municipal. Além disso, também solicita mais atenção do governo às normas de dispensa de licitação e que a prefeitura consulte o Conselho Municipal de Educação antes de compras do tipo. O caso aguarda decisão de seu relator no TCE, o conselheiro Edson Brum.

A Promotoria de Defesa do Patrimônio de Porto Alegre do Ministério Público (MP-RS) estadual também investiga a dispensa de licitação suspeita. O órgão abriu uma notícia de fato em janeiro para verificar o contrato e apura se houve improbidade administrativa.

O Matinal pediu à Smed um posicionamento sobre o processo que tramita no TCE e o parecer do MPC, mas a secretaria não respondeu até o fechamento desta reportagem.

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