Nossos Mortos

O lugar (nada) comum de João Donato

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O lugar (nada) comum de João Donato João Donato no auditório Ibirapuera, em São Paulo, em 2007 | Foto: Gerardo Lazzari/Olhos da Terra Fotografia

Trata-se de um lugar comum classificar artistas que ajudaram a modernizar a música popular brasileira em função da Bossa Nova. Fulano é “precursor”, é “pré”, é “pós”, etc. São rótulos de grande poder de comunicação usados para localizar artistas, mas que limitam muito o entendimento de trajetórias e obras. É algo semelhante ao que ocorre na relação entre os artistas brasileiros modernos e a famosa Semana – tema do professor Luís Augusto Fischer em tantas páginas – ou então com “roqueiros” como Rita Lee, chamada de rainha. 

João Donato foi um desses grandes a quem o Brasil tem muito a agradecer em vida e na hora do seu falecimento. Filho de família musical, o acreano foi ainda bem jovem para o Rio de Janeiro, uma das capitais da América em que se produzia música popular de altíssima categoria e aceitação. Assim como Johnny Alf, outro grande pianista e compositor que iniciou carreira nos anos 1950, também trabalhou em São Paulo, terra de outro enorme “precursor”, Garoto. 

Na capital convive com os que são considerados os pais da Bossa Nova. Parceiro de João Gilberto em composições (como “Minha Saudade”), apresentações e viagens. Compartilha da emoção do amigo com sua primeira gravação, considerada como a fundadora da moderna música popular brasileira. A convite, vai para os Estados Unidos, onde passaria a viver e trabalhar por mais de uma década. Neste meio tempo grava dois álbuns no Brasil da Bossa Nova. No final do período norte-americano grava um álbum de sucesso inspirado no suingue de James Brown, “A Bad Donato”. Neste disco está um de seus grandes sucessos, The Frog, transformado em “A rã” por Caetano Veloso. 

De volta ao Brasil, sua trajetória além de instrumentista, produtor e arranjador é de compositor com muitos sucessos e líder de pequenos e ótimos grupos, como o trio com Robertinho Silva e Luiz Alves. Entre suas parceiras na composição destacam-se as com Gilberto Gil, como “A Paz” e “Lugar Comum”. Esta canção nos faz pensar que uma beira de mar seria mesmo um lugar comum, em que caminharíamos ouvindo a água bater e o vento soprar, “pra dentro de um fundo azul”. Quem dera!

Obrigado, João Donato, muito além de qualquer rótulo.


Álvaro Magalhães é sociólogo e músico. Dirigiu a Coordenação de Música da Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre nos anos 1990.

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