Os novos projetos de lei que prometem frear os calotes contra trabalhadores terceirizados no RS
Dois PLs passaram pela Comissão de Constituição e Justiça e estão mais perto de serem aprovados. Na Câmara de Porto Alegre, o projeto de lei também quer garantir regras anticalote
Os problemas envolvendo serviços terceirizados vêm aumentando nos últimos anos. Em 2022, ações trabalhistas envolvendo empresas terceirizadas e poder público cresceram 75% em relação ao ano anterior, conforme dados do Tribunal Regional do Trabalho da 4º Região.
A situação fez avançar projetos na Assembleia Legislativa e na Câmara de Porto Alegre que estipulam regras para evitar o desvio de verbas trabalhistas pelas empresas contratadas. A principal é a criação de uma conta-vinculada, onde seriam depositados os valores trabalhistas como décimo-terceiro e férias. Hoje esse dinheiro é provisionado às empresas terceirizadas, que acabam usando como lucro.
Os dois projetos anticalote que tramitam na Assembleia gaúcha – um de autoria da deputada Luciana Genro (PSOL), em parceria com os deputados Matheus Gomes (PSOL) e Sofia Cavedon (PT); e outro, mais antigo, do deputado Luiz Mainardi (PT) – foram aprovados pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em setembro.
“Os calotes nos contratos estão muito disseminados em todos os órgãos públicos do Estado, no Tribunal de Justiça etc. O ponto alto foi quando a empresa que presta serviços para a própria Assembleia parou de pagar as servidoras daqui”, explica a deputada estadual Luciana Genro (PSOL). Os atrasos nos pagamentos de funcionários terceirizados de limpeza sensibilizou os parlamentares, o que ajudou a pauta a avançar. “Ali os deputados começaram a se dar conta que estava insustentável”.
Com a aprovação na CCJ, o PL pode virar lei mais rapidamente. “Agora, vamos ter de pensar estrategicamente se vamos solicitar que o projeto vá ao plenário, ou se passa por uma comissão de mérito, como a de serviços públicos. Mas já podemos pedir acordo de líderes para dar mais agilidade (à votação)”, explica.
Segundo Luciana, o projeto recebeu aval do governo, que expressou também o desejo de fazer mudanças no texto ainda não indicadas.
Na Câmara, a iniciativa é da vereadora Biga Pereira (PCdoB), cujo projeto propõe uma série de requisitos para a contratação de terceirizadas e a criação da conta-vinculada para garantir que os trabalhadores sejam pagos. “Visitei vários estabelecimentos como escolas, creches, postos de saúde com muitos trabalhadores terceirizados na alimentação, limpeza, capina, segurança. Em um dia, as professoras estavam fazendo a comida porque os trabalhadores da cozinha não tinham VT”, descreve Biga. “Quem perde é a sociedade, porque o município paga duas vezes, os trabalhadores são lesados e todos nós ficamos sem os serviços.”
Neste ano, por exemplo, a prefeitura de Porto Alegre já gastou R$ 2,5 milhões em indenizações trabalhistas, com previsão desses custos subirem para quase R$ 4 milhões, segundo o Portal da Transparência municipal. Só a ação movida pelo Sindicato dos Trabalhadores Terceirizados do Estado do RS (Seeac) contra o calote milionário de uma única empresa, a Multiclean, em ex-terceirizados da Smed gerou um depósito em juízo por parte do município de R$ 3 milhões, conforme uma decisão de julho da Justiça do Trabalho.
Em setembro, uma reportagem da Matinal mostrou como ocorrem as fraudes nos contratos envolvendo um grupo de empresários. Segundo investigações do Ministério Público (MPRS), às quais a Matinal teve acesso, os empresários criam as empresas em nome de laranjas, ganham as licitações e depois somem, deixando milhares de trabalhadores sem salário, vale-transporte e FGTS. No final, a conta recai sobre o poder municipal, que perde qualidade nos serviços e assume parte da dívida dos grupos.
A vereadora Biga Pereira também propôs a criação de uma frente parlamentar em defesa das trabalhadoras e trabalhadores terceirizados na Câmara Municipal de Porto Alegre para dar atenção aos problemas que se tornaram comuns e afetam a população que mais precisa. “Diz muito respeito à questão das mulheres: são 70 mil trabalhadores do setor. Deste total, 80% são mulheres e, no geral, mulheres com filhos”, diz.